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 | Pedro França/Agência Senado
| Foto: Pedro França/Agência Senado

Quem realmente acreditou nas promessas de Eunício Oliveira, presidente do Senado, e Romero Jucá, líder do governo, quando ambos defenderam o uso de dinheiro das emendas parlamentares para abastecer o acintoso e bilionário fundo eleitoral aprovado na reforma política do ano passado? Emendas para saúde e educação são intocáveis, disseram à época. Mas quem pode dizer que não sabia o que aconteceria quando chegasse a hora de destinar o dinheiro aos partidos? Levantamento do jornal O Estado de S.Paulo apurou que R$ 472,3 milhões em emendas parlamentares para saúde e educação não chegarão a seu destino original, sendo direcionados para as campanhas de 2018.

Ambulâncias no Espírito Santo e transporte escolar em áreas rurais de Goiás estão entre os projetos prejudicados pela ganância dos partidos e candidatos. Mas não apenas a saúde e a educação saíram prejudicadas: segurança pública, agricultura, infraestrutura, universidades federais e projetos contra a seca também perderam dinheiro – uma obra que levaria águas da transposição do Rio São Francisco para municípios na Paraíba ficou sem R$ 10 milhões.

Cidadãos se verão privados de serviços básicos que deveriam ser a destinação prioritária dos recursos públicos

É a implantação, na prática, do financiamento público de campanha à custa do bem-estar da população, especialmente a mais pobre, que depende do Estado para ter acesso a serviços básicos. Após a aprovação do texto, o próprio relator da reforma política na Câmara, o petista Vicente Candido, admitiu sem pestanejar que “é muito para quem vai pagar, que é o povo brasileiro, e é pouco para quem vai receber, para o sistema atual” – ou seja: se pudessem, os políticos avançariam ainda mais sobre os recursos que deveriam servir à população, e não a campanhas eleitorais.

Após a proibição, pelo Supremo Tribunal Federal, das doações eleitorais de empresas, os partidos e os candidatos rejeitaram completamente a hipótese de fazer campanhas mais enxutas e baratas, preferindo o caminho mais fácil, de se apropriar do dinheiro do contribuinte brasileiro – seja pessoa física ou jurídica. E, como o orçamento é limitado, para se destinar mais dinheiro às campanhas seria preciso retirá-lo de algum lugar. Foi assim que as emendas parlamentares se tornaram o alvo preferencial dos partidos, e a essa altura pouco importava quais eram as áreas às quais esse dinheiro estava destinado em primeiro lugar. O povo brasileiro é que pagaria, como disse Vicente Candido, independentemente do jogo de cena de Eunício e Jucá.

Leia também: Acertos e disparates da reforma política (editorial de 8 de outubro de 2017)

Leia também: A Câmara insiste no financiamento público de campanha (editorial de 27 de agosto de 2017)

Tanto partidos como candidatos precisam ser financiados pelos que compartilham de suas plataformas e ideais. A democracia perde quando o eleitor é obrigado a financiar, com seu dinheiro que lhe é retirado por meio dos impostos, pessoas e ideologias com as quais não concorda, e que pode até mesmo rejeitar veementemente. Pior ainda quando a destinação desse dinheiro a partidos e candidatos significa que cidadãos se verão privados de serviços básicos que deveriam ser a destinação prioritária dos recursos públicos.

A ministra do STF Rosa Weber é relatora de uma ação direta de inconstitucionalidade que questiona a criação do fundo eleitoral. O PSL, autor da ação, argumentava que o fundo deveria ser criado por meio de emenda à Constituição, em vez de lei ordinária. Em vez de decidir sozinha, em caráter liminar, ela preferiu enviar o tema ao plenário do Supremo, mas até agora não há data para o julgamento. A confirmação daquilo que todos temiam – o uso de dinheiro destinado à saúde e educação para bancar campanhas políticas – pode ser o impulso que faltava para o Judiciário analisar a questão e, se considerar o fundo ilegal, colocar um fim neste acinte.

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