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| Foto: Federico Parra/AFP

Mesmo quando a crise econômica, social e institucional provocada pelo socialismo bolivariano de Hugo Chávez e Nicolás Maduro chegou ao auge, a comunidade internacional se mostrava refratária a uma intervenção internacional que fosse além da ajuda humanitária. Os venezuelanos precisavam tomar a iniciativa de colocar um fim na ditadura de Maduro. Neste 23 de janeiro, centenas de milhares de cidadãos tomaram as ruas das principais cidades da Venezuela. Mas a oposição não se limitou a repetir a grande mobilização que já havia ocorrido em outras ocasiões. O presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, foi à Praça João Paulo II e fez um juramento solene, proclamando-se presidente interino do país, um movimento que ainda não havia sido tentado pelos oponentes de Maduro e que já recebeu respaldo internacional.

Guaidó tem muitas e boas razões para fazer o que fez. Hoje, a Assembleia Nacional, cuja maioria de oposição a Maduro foi livremente escolhida pela população em 2015, é o único poder realmente legítimo na Venezuela depois que o ditador assumiu um novo mandato, resultado de uma vitória questionável em eleições sem liberdade e recheadas de acusações de fraude. A data do pleito havia sido alterada unilateralmente por uma Assembleia Constituinte convocada em desrespeito à Constituição venezuelana, e vários líderes oposicionistas haviam sido proibidos de se candidatar. O Judiciário do país é subserviente a Maduro, e juízes independentes foram sendo removidos do Tribunal Supremo de Justiça, que evidentemente vem declarando ilegais todas as ações da Assembleia Nacional – inclusive a escolha de Guaidó para presidir o Legislativo nacional.

Hoje, a Assembleia Nacional, de maioria oposicionista, é o único poder realmente legítimo na Venezuela 

Parte da comunidade internacional já reagiu aos acontecimentos na Venezuela, colocando-se ao lado do autoproclamado presidente interino. Brasil, Estados Unidos e Canadá estão entre os países que já reconheceram oficialmente Juan Guaidó como novo presidente. O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, tuitou felicitando Guaidó e chamando Maduro de “usurpador”. A posse do ditador já não tinha sido reconhecida pela OEA, pelos Estados Unidos, pela União Europeia e pelo Grupo de Lima, formado por 14 nações do continente americano.

Maduro já havia demonstrado sentir o golpe do isolamento internacional quando pediu diálogo ao presidente americano, Donald Trump, poucos dias depois da posse. Mas o venezuelano poderá se manter no poder e resistir à mobilização popular se souber que continua apoiado pelas forças de segurança. A Guarda Nacional Bolivariana já iniciou a repressão, inclusive com mortes, mas as Forças Armadas estão divididas entre defensores e opositores de Maduro. Os militares que têm o comando de estatais e cargos importantes no governo só tenderão a abandonar o ditador socialista se perceberem que a derrota do bolivarianismo é inevitável. Para convencer os relutantes, Guaidó prometeu anistia a civis e militares que ajudem a “restaurar a ordem constitucional”, algo que havia provocado controvérsia dentro da oposição democrática, já que alguns partidos e líderes não veem com bons olhos a participação de chavistas descontentes com Maduro em um eventual novo governo.

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O “socialismo do século 21” de Hugo Chávez e Nicolás Maduro destruiu a Venezuela em vários aspectos. Não apenas acabou com a democracia e a liberdade no país, mas também arrasou a economia, com profundas consequências sociais: a miséria e a violência urbana dispararam, e a fome levou crianças à morte por desnutrição e adultos a disputarem restos de comida no lixo. Quem tinha condições deixou o país, em uma massa de refugiados comparável àquela resultante de guerras civis como a da Síria. É formidável que um povo tão agredido e desarmado ainda tenha disposição de tomar as ruas, como fez nesta quarta-feira, para voltar a ter em suas mãos o destino do país. Que desta vez, com o apoio da comunidade internacional comprometida com a democracia, seja possível devolver a democracia e a esperança aos venezuelanos.

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