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Ministro Paulo Guedes: governo pode ter de prorrogar auxílio emergencial pela segunda vez.
Ministro da Economia, Paulo Guedes| Foto: Alessandro Dantas/PT do Senado

O governo decidiu entrar tardiamente no debate da reforma tributária e, por isso, preferiu dividir em partes sua proposta. Os pedaços serão enviados ao Congresso para serem, caso aceitos pelos parlamentares, adicionados aos dois projetos já em discussão em uma comissão especial mista. Na prática, o fatiamento da proposta do governo virou uma pequena fábrica de balões de ensaio que estão ameaçando a própria viabilidade de uma reforma.

Os dois projetos em discussão no Congresso têm um foco muito claro: redução no número de impostos sobre o consumo, com a implementação de um único tributo por valor agregado. Os projetos, um apresentado pelo Senado e outro pela Câmara, têm diferenças a respeito da abrangência da simplificação tributária, mas têm um conceito comum forte o suficiente para viabilizar um texto de consenso entre as duas Casas.

O primeiro pedaço da proposta do governo, apresentado em julho, dizia respeito à unificação do PIS e da Cofins em um único imposto de valor agregado. Esse tema já é tratado nos projetos em debate no Congresso que, além de PIS e Cofins, uniriam IPI, ICMS e ISS no mesmo tributo (no mínimo, já que a proposta do Senado traz outros quatro impostos na unificação). O texto marca a posição do governo em um debate que já estava avançado, principalmente em relação à expectativa de receita com a unificação dos tributos e as exceções que a equipe econômica gostaria de incluir na redação final.

As outras três partes da proposta do governo, no momento, estão criando mais incertezas do que auxiliando em uma discussão que já estava encaminhada no Congresso. O tema mais polêmico trazido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, é a criação de um novo imposto nos moldes da extinta CPMF. Aqui, é nítida a forma como os balões de ensaio têm sido colocados para teste sem os detalhes necessários. Em um primeiro momento, veio a público a ideia de que uma alíquota de 0,2% sobre transações financeiras seria suficiente para desonerar as faixas salariais mais baixas de 1 ou 1,5 salário mínimo. Na sequência, a informação mudou para uma redução na alíquota patronal de contribuição ao INSS, acompanhada de mais recursos para atualizar a tabela do Imposto de Renda, entre outros gastos.

Em uma das últimas informações repassadas pelo governo, o novo imposto poderia até ser usado para uma desoneração do IPI. Lembrando que a reforma que está no Congresso já unifica o IPI ao imposto único de valor agregado, sendo complementado por um tributo sobre produtos com externalidades negativas, como tabaco e bebidas alcoólicas.

O ruído produzido pela comunicação pouco clara a respeito do que o governo quer com a reforma tributária abriu uma oportunidade para que o setor de serviços fizesse sua própria sugestão de nova CPMF, com uma alíquota proibitiva de 0,8% para desonerar totalmente a folha de pagamentos. Esse é um sinal de que a discussão sobre a reforma tributária pode se afastar bastante dos trilhos.

A equipe econômica está cometendo três erros. O primeiro é o de falar em ideias que tiram o foco do trabalho do Congresso. É difícil compreender por que membros da equipe econômica preferem trazer a público hipóteses que nem foram calculadas em detalhes, enquanto uma comissão especial volta a se reunir para discutir projetos que já têm um elevado grau de maturidade. O economista da consultoria LCA Bráulio Borges calculou que a proposta de unificação de impostos tramitando na Câmara aumentaria o PIB potencial do país em 20% nos 15 anos após sua aprovação. Atrasar esse tipo de transformação econômica por causa de outras tantas possibilidades de reforma pode ser contraproducente.

O segundo problema na forma como o governo está conduzindo seus projetos é tratar o custo da folha de salários unicamente pelo viés da contribuição patronal. A formalização da mão de obra no Brasil é cara não só por causa dos custos do INSS, mas também por causa de outros itens, como salário-educação, contribuição ao Sistema S, férias proporcionais, depósitos do FGTS. Isso sem contar o peso oculto da legislação trabalhista ultrapassada. É tema que talvez demande um trabalho específico do Congresso para se avaliar com cuidado as alternativas – tanto de desoneração quanto de novas fontes de receita.

Para completar, o governo colocou “iscas” em suas comunicações incompletas para angariar apoio à nova CPMF. Uma delas é a atualização da tabela do Imposto de Renda, que é uma das promessas de campanha do presidente Jair Bolsonaro. Esse não é um expediente correto. Primeiramente porque a falta de atualização da tabela do IR foi um aumento velado da carga tributária e sua atualização deveria ser feita com a redução de despesas. Além disso, não é por viabilizar uma medida popular ou algum outro programa de governo (como o Renda Brasil) que uma nova CPMF seria bem-vinda. O novo imposto precisa ser avaliado por seu próprio custo-benefício e não pelos apoios que ele consegue angariar para ser aprovado no Congresso.

O governo precisa avaliar se realmente tem mais alguma contribuição a fazer para que a reforma tributária caminhe nos próximos meses. O Brasil precisa que as travas ao desenvolvimento sejam removidas uma a uma, com uma dose de realismo político e grande efetividade. Temos uma chance verdadeira de avanço na área tributária que pode ser seguida por outras pautas importantes, como a desoneração da folha e a revisão do Imposto de Renda.

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