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O ministro Paulo Guedes e o presidente Jair Bolsonaro
O ministro Paulo Guedes e o presidente Jair Bolsonaro em entrevista coletiva sobre o coronavírus, em 18 de março.| Foto: Carolina Antunes/Presidência da República

O pacote de medidas econômicas para atenuar o impacto da pandemia de coronavírus sobre negócios e empregos anunciado na segunda-feira pelo Ministério da Economia não previa novos gastos governamentais, com exceção do aumento na despesa do Bolsa Família. No entanto, o governo concluiu que, para poder fazer frente aos desafios que virão na área da saúde pública, o atual orçamento engessado talvez não baste. Por isso, na tarde de quarta-feira, uma edição extraordinária do Diário Oficial da União trouxe uma mensagem presidencial solicitando ao Congresso que reconheça a existência de um estado de calamidade pública em todo o país. A Câmara já aprovou o pedido, que segue para o Senado.

O pedido está previsto no artigo 65 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Se os parlamentares atenderem ao pedido do presidente Jair Bolsonaro, o governo não terá mais a obrigação de cumprir a meta fiscal estabelecida para este ano – um déficit primário de R$ 124 bilhões – e poderá ampliar seus gastos com saúde por meio de créditos extraordinários abertos via medida provisória, como está previsto na emenda constitucional do teto de gastos.

O país não está em condições de assistir a uma nova explosão de gastos para conter uma crise

De fato, sem que o governo tenha essa possibilidade, a meta fiscal estaria mais que comprometida, pois o Orçamento de 2020 foi elaborado tendo como pontos de partida uma arrecadação que fatalmente não se cumprirá, dada a iminente paralisação da atividade econômica, e um barril de petróleo cotado a US$ 52, quando o preço atual está bem menor após uma disputa entre Rússia e Arábia Saudita. No entanto, a carta branca que o estado de calamidade pública dá ao governante precisará ser usada com muita parcimônia.

Paulo Guedes garante que todos os créditos extraordinários que o governo solicitar serão destinados a “saúde, saúde e saúde”. Faria todo o sentido que a possibilidade aberta pelo estado de calamidade pública fosse canalizada especificamente para as ações de combate ao surto e que, em muitos casos, necessitam do aporte do Estado. O risco – e, dependendo de como os acontecimentos se desenrolarem, a tentação – está na possibilidade de abrir as torneiras de forma mais indiscriminada. A mensagem presidencial afirma que vários países estão adotando “pacotes robustos de estímulo fiscal e monetário, bem como diversas medidas de reforço à rede de proteção social”, e “a avaliação de grande parte dos analistas é que as medidas anunciadas têm apontado, em geral, na direção correta”. E a possibilidade de que a saúde não seja a única área a exigir gastos adicionais do governo não é desprezível.

Por isso, há especialistas que, embora defendam o aumento na despesa com a saúde para conter a emergência do coronavírus, são céticos quanto à possibilidade de ampliar o escopo dos gastos para outras áreas. Todo o esforço árduo feito para conseguir um mínimo de ajuste fiscal e juros baixos seria colocado em xeque à medida que o governo precisasse se endividar mais e mais para dar conta dos novos compromissos assumidos, afetando as expectativas quanto à saúde fiscal do Brasil; a desconfiança quanto à capacidade de o país honrar seus pagamentos levaria a juros maiores.

“O pior que pode acontecer para o Brasil agora é perder a credibilidade da política fiscal”, afirmou à Gazeta do Povo Roberto Ellery, professor de Economia na Universidade de Brasília. O país não está em condições de assistir a uma nova explosão de gastos para conter uma crise; seria a repetição da Nova Matriz Econômica que levou à recessão de 2015 e 2016. Se conseguir que o Congresso aprove o estado de calamidade pública, a equipe econômica terá de dosar o remédio com muita cautela para que ele não se torne veneno. Desta vez, os responsáveis pela condução da economia são adeptos da austeridade, e não da gastança, e isso pode fazer a diferença, desde que eles tenham como resistir às pressões que inevitavelmente virão para fazer a torneira jorrar copiosamente.

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