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Um novo mundo complexo
| Foto: Divulgação/Audi

Tão logo termine o ano de 2020, daqui a 18 meses, o mundo terá vivido as duas primeiras décadas do século 21 com acontecimentos que significarão mudanças profundas na vida econômica, social e política, e deixarão marcas radicais na conformação do meio ambiente, do sistema produtivo e do trabalho em todas as regiões. O mundo adentrará a terceira década do século com um elenco de problemas graves e complexos, e com uma lista de desafios que, conforme as soluções e as condutas sociais, moldarão a vida humana para o progresso e felicidade ou para o atraso e sofrimento. Os problemas complexos são muitos, mas entre eles existem dois que estão entre os principais: a crise do emprego e a falência financeira do setor estatal na maior parte dos países.

O mundo caminha para chegar ao ano de 2030 com uma população de quase 9 bilhões, o que exigirá soluções ainda desconhecidas, principalmente tendo-se em conta que em 1930 o total de habitantes da Terra era de apenas 2 bilhões. De um lado, há o desafio de alimentar e prover os bens e serviços necessários à sobrevivência dos 9 bilhões de habitantes e, de outro lado, o difícil desafio de gerar emprego e renda para todas as pessoas em condições de trabalhar, em torno de 4,5 bilhões. Um raciocínio simples pode induzir à crença de que é justamente o sistema de produção dos bens e serviços necessários para uma população tão grande que se encarregará de usar todas – ou quase todas – as pessoas em condições de trabalhar.

O fantasma do desemprego é talvez o maior desafio que a humanidade terá de enfrentar

O raciocínio de que as pessoas serão empregadas na produção do que elas mesmas comprarão para seu consumo era válido quando o ser humano somente se alimentava, se vestia e se abrigava com os produtos feitos por suas próprias mãos. Entretanto, o progresso da ciência, os novos inventos e a explosão da quarta revolução tecnológica moderna – com os avanços na biotecnologia, na inteligência artificial e nos robôs cognitivos – estão levando o mundo a expandir a produção por máquinas e meios automatizados, portanto, com menos trabalhadores. As inovações estão se acelerando, de forma a substituir o trabalho humano em atividades produtivas as mais diversas.

Como exemplo, vale citar o que vem ocorrendo na agricultura nos últimos 60 anos. Os Estados Unidos têm hoje apenas 3% da população vivendo na zona rural e, nos próximos dez anos, essa taxa deverá ser de apenas 1%, ou seja, a agricultura norte-americana abastecerá o país e seguirá exportando alimento para o mundo com apenas 1% da população trabalhando no campo. Quanto ao Brasil, em 1970 o país tinha 46% da população vivendo na zona rural; hoje tem apenas 12,5%, e a estimativa é de que em dez anos apenas 5% dos brasileiros estarão vivendo no campo. Essa realidade cria enormes dificuldades para o sucesso do programa de reforma agrária e distribuição de terras. A ideia romântica de uma legião de famílias da cidade retornando à zona rural é apenas uma ideia romântica, mas inviável.

As máquinas e os robôs criados nas revoluções tecnológicas até 2010 competiam com o ser humano em habilidades físicas. Até então, as tarefas que exigiam habilidades cognitivas, aquelas de natureza intelectual e emocional, continuavam sendo feitas pelo trabalho humano. Agora, após o mundo entrar na quarta revolução tecnológica moderna, os robôs passarão a competir com o ser humano em habilidades cognitivas, de forma que a expansão da produção não levará ao aumento equivalente no número de empregos. O fantasma do desemprego é talvez o maior desafio que a humanidade terá de enfrentar. Um estudo interessante sobre como esse desafio será enfrentado foi produzido por uma das maiores empresas de consultoria do mundo, a McKinsey, sob o título "Jobs Lost, Jobs Gained: Workforce transitions in a time of automation".

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O segundo problema complexo que o mundo deverá enfrentar refere-se à gigantesca dívida do setor estatal na maior parte dos países e à deterioração das finanças dos governos com seus déficits crônicos, cujo controle e contenção parecem mais difíceis do que inicialmente se podia imaginar. Após a grande depressão dos anos 1930, as ideias do economista John Maynard Keynes moldaram as atividades do setor público e justificaram a acelerada expansão da intervenção estatal nas atividades produtivas e o crescimento das máquinas governamentais. Com isso, os governos incharam, a carga tributária foi aumentada no mundo inteiro, os déficits fiscais se tornaram regra geral, os sistemas previdenciários se tornaram insolventes e a dívida pública explodiu.

O desafio de desmontar essa bomba vem se mostrando mais difícil do que o mais otimista poderia sugerir, inclusive o próprio Keynes, que justificava suas propostas dizendo que, uma vez vencida a recessão e retomado o crescimento, os governos voltariam ao equilíbrio orçamentário. O erro de Keynes foi não entender como funciona a política, os políticos e a burocracia estatal: uma vez expandida, a máquina pública não para de gastar, tributar e se endividar. Os desafios estão aí, e o novo mundo complexo exigirá novas soluções.

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