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 | Alexandra Martins
| Foto: Alexandra Martins

Com a reforma política correndo no Congresso Nacional, voltou a ganhar força uma ideia que pode dissociar de vez a representação desejada pelos eleitores e a que efetivamente toma posse nos Legislativos Brasil afora, especialmente em Brasília: a introdução da lista fechada, pela qual o eleitor vota apenas no partido, que determina quais nomes farão parte da lista e em que ordem, preenchendo por esse critério as cadeiras parlamentares que o voto popular lhes atribuir. O modelo tem sido defendido por vários políticos e partidos – a novidade é a adesão de ministros dos tribunais superiores. Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal e atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e Dias Toffoli, também do STF e ex-presidente do TSE, foram a público manifestar apoio à ideia e criticar o atual sistema proporcional.

Há dois pontos positivos na lista fechada. O primeiro é o fortalecimento dos partidos, que em tese se veriam obrigados a ressaltar mais suas ideias e plataformas (claro, para as legendas que se preocupam com isso, já que para a maioria delas a ideologia não existe nem como acessório) e menos as pessoas que deles fazem parte. A segunda virtude depende de a lista fechada funcionar como parte do sistema distrital misto e ser usada para preencher apenas parte das cadeiras legislativas. A lista serviria para alavancar candidatos ligados a certas causas ou minorias cujo eleitorado é fragmentado e insuficiente para eleger alguém nas disputas nos distritos.

A lista fechada apenas fortaleceria os caciques partidários e serviria de tábua de salvação para políticos envolvidos em escândalos

Mas não há notícia de que os parlamentares estejam pensando em voto distrital misto, citado por Mendes e Toffoli. O que tem sido colocado na mesa é a lista fechada pura e simples, o que seria apenas um meio de colocar nos Legislativos pessoas que não necessariamente teriam a aprovação do eleitorado. Mendes ironizou o sistema atual afirmando que “vota-se em Tiririca e elege-se Valdemar da Costa Neto e Protógenes” – mas pode-se dizer que pelo menos eles tiveram a preferência do eleitor sobre outros candidatos do mesmo partido ou coligação. Não é, claro, a situação ideal, mas é preciso lembrar que duas medidas buscam resolver esse tipo de distorção: a exigência de que os eleitos tenham pelo menos 10% do quociente eleitoral, que já valeu para os candidatos a vereador no ano passado; e está na Câmara, após aprovação do Senado, a proibição de coligações nas eleições proporcionais, pela qual o eleitor não mais correrá o risco de votar em alguém e eleger um candidato de um partido cujas plataformas são radicalmente diferentes. Já com a lista fechada o eleitor não teria nem mesmo a possibilidade de demonstrar sua preferência por este ou aquele político dentro do partido ao qual daria seu voto. No fim, a lista fechada apenas fortaleceria os caciques partidários e serviria de tábua de salvação para políticos envolvidos em escândalos, que não mais teriam de submeter o rosto e o nome à aprovação do eleitor.

Mas engana-se quem pensa tratar-se apenas de um debate sobre representação política. Acessos de sinceridade de alguns parlamentares mostram o que realmente está em jogo: “Não consigo entender como vamos fazer financiamento de campanha público se não tiver lista fechada”, disse o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), citado em delações da Lava Jato. A classe política nunca escondeu sua vontade de avançar ainda mais sobre os cofres públicos com a adoção do financiamento exclusivamente público de campanha. Após a proibição de doações feitas por pessoas jurídicas, os partidos sofreram para conseguir doações de pessoas físicas, e em 2016 foi impossível repetir as campanhas milionárias de outrora. Com a lista fechada, seria preciso promover apenas os partidos, e não milhares de candidatos para os quais não há dinheiro que chegue, pelas regras atuais.

E, nessas circunstâncias, até mesmo as desventuras dos políticos encrencados com a Lava Jato servem para desviar a atenção de acordos que pretendem transferir cada vez mais dinheiro do cidadão para os partidos (concorde ou não com eles) e danificar a representação política.

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