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Alguém tem alguma dúvida de que Inglaterra e Alemanha são países que se destacam pela boa governança? Não há essa dúvida. É reconhecida a eficiência com que, neles, o Estado provê todos os serviços essenciais à população – da saúde à segurança, da educação aos transportes. Seriam tais serviços prestados por numerosos servidores públicos nomeados ao sabor das conveniências políticas dos seus governantes, ou por uma classe estável e profissionalizada de funcionários admitidos porque comprovaram que são os mais capazes para gerir as competências da administração pública?

Acertou quem fez a opção pela segunda parte da indagação. De fato, na Inglaterra, por exemplo, não chegam a 300 os funcionários nomeados por livre escolha do gabinete ministerial; na Alemanha, a situação não difere muito. Tais exemplos são citados apenas para dar a dimensão do abuso que se comete no Brasil em relação às nomeações dos tais comissionados, "servidores de confiança" dos mandatários de ocasião. Na esfera federal, contam em mais de 50 mil os cargos ocupados por essa categoria de escolhidos.

No Paraná, além dos quase 4 mil postos de livre nomeação no nível do Executivo, há alguns outros milhares alocados nas prefeituras e câmaras municipais, conforme levantamento que acaba de ser concluído pelo Ministério Público Estadual, que já oficiou a todas as câmaras nas quais se detectaram excessos para que providenciassem a exoneração dos excedentes. Pela legislação atinente, o número máximo de servidores comissionados não pode suplantar o de servidores concursados.

A Câmara Municipal de Curitiba é um caso emblemático dessa irregularidade: são 541 comissionados contra um quadro de apenas 228 efetivos – uma desproporção que, além de exorbitante, denota outra gravíssima e dispendiosa situação. Diante dela, pergunta-se: por que a Câmara Municipal de Curitiba, com 38 membros, precisa de um total de 769 funcionários? Qual é a relação custo/benefício que esse quadro oferece aos contribuintes que o sustentam? Qual a produtividade e a qualidade legislativa que a Câmara apresenta a ponto de justificar tamanho exagero?

Não se trata apenas de uma simples e insolúvel distorção administrativa. Há aspectos morais e éticos que a circundam, na medida em que – como todos sabemos – cargos comissionados costumam estar na gênese da corrupção, do desperdício e da incompetência com que caracteriza a atuação do estamento público brasileiro. Trata-se, portanto, de um mal a ser extirpado mediante um esforço, visando a profissionalizar os quadros funcionais do Estado.

Data de 1938, no auge do Estado Novo comandado pelo ditador Getúlio Vargas, uma das últimas e bem-sucedidas tentativas de profissionalização do funcionalismo. É dessa época, portanto lá se vai quase um século, a criação do DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público), instituição que, entre outras funções relevantes, foi a responsável pela estruturação da administração pública, pela capacitação dos servidores e pela criação das regras de ingresso e carreira, mediante concursos e critérios de mérito.

Embora marcado pelo viés do regime autoritário de então, possuía virtudes que foram gradativamente abandonadas ao longo das décadas que se seguiram até hoje, o que deu lugar ao absurdo, politiqueiro e ineficiente modelo das nomeações sem-fim de "funcionários de confiança". Correto está o Ministério Público ao tomar a iniciativa de conter a visível excrescência que acomete o serviço público – infelizmente, porém, insuficiente para nos livrar completamente das práticas condenáveis. É preciso muito mais.

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