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A barbárie em Altamira e a força das facções criminosas
| Foto: Josué Teixeira/Arquivo Gazeta do Povo

A Região Norte do Brasil voltou a protagonizar cenas de barbárie em presídios nesta segunda-feira. Dois meses depois do massacre de 55 presos em Manaus (AM), devido a divisões internas da facção criminosa Família do Norte (FDN), uma luta entre o Comando Vermelho (CV) e o grupo local Comando Classe A (CCA) deixou pelo menos 57 mortos no Centro de Recuperação de Altamira (PA) – detentos do CCA invadiram e incendiaram uma área do presídio ocupada por presos vinculados ao CV. Nesta terça-feira, o ministro da Justiça, Sergio Moro, autorizou o envio da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária ao Pará, a pedido do governador Helder Barbalho.

Apesar de o massacre envolver um grupo local, autoridades e analistas ouvidos pela Gazeta do Povo acreditam que o caso de Altamira é uma batalha dentro de uma guerra mais ampla, em que o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital (PCC) lutam pelo controle das prisões brasileiras e pelas rotas de tráfico. Segundo investigações policiais no Pará e em São Paulo, o CCA teria firmado um acordo com o PCC, embora ainda não haja evidência de que a facção paulista tenha dado a ordem para o ataque. Os dois grandes grupos, aliados até 2016, passaram a disputar território no país inteiro, tentando trazer para suas respectivas órbitas organizações locais como o CCA. A Região Norte é estratégica por ser uma rota de entrada de drogas vindas da Colômbia e do Peru, embora o principal caminho da cocaína continue sendo a fronteira brasileira com o Paraguai.

Massacres como os de Manaus e Altamira ocorrem por uma combinação explosiva de superlotação carcerária e inteligência precária

Massacres como os de Manaus e Altamira ocorrem por uma combinação explosiva de superlotação carcerária e inteligência precária. É preciso evitar o discurso fácil de que a superlotação é consequência de um sistema que “prende demais” – uma falácia gritante em um país onde a maioria dos crimes não é nem sequer esclarecida. É evidente que este é um problema que só pode ser resolvido com investimento maciço em novas unidades prisionais, sem esquecer do Judiciário, que, sobrecarregado, não consegue julgar de forma célere todos os processos criminais que chegam aos tribunais. A falta de estrutura deixa juntos detentos presos provisoriamente e bandidos condenados, ou criminosos perigosos com aqueles condenados por delitos de menor potencial ofensivo, criando as famosas “universidades do crime”.

Quanto à inteligência, é fácil ver que ela falhou quando o CCA já anunciava pelo Facebook, no fim de maio e no começo de junho, sua intenção de atacar o Comando Vermelho. Apesar das postagens na mídia social, a Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará afirmou que “temos protocolos para a maioria dos casos, mas neste específico, não tínhamos informações sobre um ataque dessa magnitude”. O reforço da inteligência foi justamente um dos pontos escolhidos pelo ministro Moro como peça-chave para tentar desarticular as facções dentro das penitenciárias – e, a julgar pelo caso de Altamira, ainda há um caminho longuíssimo a percorrer.

Em alguns casos, este esforço de inteligência conjunta, envolvendo União e estados, conseguiu resultados importantes no campo preventivo, como no episódio em que 22 membros do PCC foram transferidos de presídios paulistas para unidades federais, evitando uma fuga espetacular que vinha sendo tramada pela facção. Mas os grupos criminosos dentro das cadeias ainda parecem estar um passo à frente, forçando os governos a apenas reagir depois que os massacres ocorrem – no caso paraense, 56 detentos de Altamira estão sendo transferidos, dez deles para presídios federais. O pacote anticrime de Moro tem dispositivos que contribuem no combate às facções, mas sua aprovação ainda parece distante. E, mesmo que o texto se transforme em lei, ainda será preciso fazer muito mais para enfraquecer os criminosos dentro e fora dos presídios.

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