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Sediar os Jogos Olímpicos é a oportunidade de um país mostrar ao mundo sua cultura. No Rio de Janeiro, os atletas deveriam sentir um gostinho da cultura brasileira não apenas na cerimônia de abertura, mas também na Vila Olímpica – as opções gastronômicas incluem pratos típicos de várias regiões do país, e cada uma das mais de 200 delegações é recebida em uma cerimônia que conta com apresentações artísticas. Mas os primeiros competidores a chegar ao complexo residencial destinado a eles conheceram outro tipo de cultura brasileira: a do improviso, a do desleixo e a do deboche.

Nenhuma vila olímpica está imune a problemas. Em Londres, por exemplo, alguns competidores tiveram sorte de não haver um Procusto por perto: havia camas pequenas demais para atletas mais altos. Outros participantes dos Jogos de 2012 reclamaram do tamanho dos quartos. Mas nada a ponto de levar uma delegação a abandonar o local para se hospedar em hotéis da região, como fizeram suecos, argentinos e australianos – estes últimos, os mais enfáticos nas reclamações, a ponto de descreverem a Vila carioca como “inabitável e insegura”. Não sem razão: eles encontraram sérios problemas elétricos e hidráulicos em seus apartamentos, com direito a fiação exposta e a água escorrendo pelas paredes em um “teste de estresse” no qual várias torneiras e vasos sanitários foram acionados ao mesmo tempo, simulando uma situação em que todos os atletas já estivessem ocupando o prédio.

Os atletas descobriram um país no qual se faz pouco dos padrões de excelência

Como se não bastasse o vexame na construção, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, respondeu aos australianos da forma mais tosca possível. Em vez de simplesmente constatar a situação, se desculpar e prometer resolver o problema, Paes optou pelo deboche estereotipado: “É natural que tenha algum ajuste a ser feito, mas vamos fazer os australianos se sentirem em casa aqui. Estou quase botando um canguru para pular na frente deles”, disse, provocando a resposta certeira dos australianos, que disseram não precisar de cangurus, mas de encanadores. Paes nada mais fez que encarnar o “estilo Lula”, já escancarado no grampo em que o prefeito zombava do fato de o ex-presidente ter um sítio em Atibaia, comparando de forma depreciativa o município do interior paulista com Maricá, no litoral fluminense.

O que esses atletas descobriram, da pior forma, foi um país no qual se faz pouco dos padrões de excelência – excelência, aliás, que é o objetivo da vida e do trabalho de um competidor olímpico, alguém que não se contenta com a mediocridade. Um país onde é aceitável fazer as coisas de qualquer jeito, ou em cima da hora, repetindo, quase como se fosse um mantra, que “no fim tudo se resolve”. Um país no qual situações graves são encaradas com ligeireza e piada inclusive (ou especialmente) pelos que deveriam estar encarregados de evitá-las ou resolvê-las.

Como as vítimas desse descaso são pessoas famosas em seus países, o dano para a imagem brasileira está causado, tendo sido devidamente repercutido pela imprensa internacional. Se os brasileiros fazem esse papelão até mesmo quando os olhos do mundo estão voltados para o país, o que não farão longe dos holofotes?, pode questionar qualquer um que considere visitar ou fazer negócios no Brasil. É até possível que, depois do puxão de orelhas, a Vila Olímpica seja reformada – alguns australianos já ocuparam seus apartamentos nesta terça-feira – e fique impecável, e que os atletas, à medida que os Jogos se desenrolam, acabem formando uma imagem mais simpática do Brasil e dos brasileiros. Mas precisamos urgentemente aproveitar o episódio para refletir sobre aonde essa paixão pela lei do menor esforço, pela gambiarra e pela mediocridade está levando o país.

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