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 | Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Se há algo que se pode dizer nestes 30 anos de vida da atual Constituição Federal, é que o Brasil precisa mudar urgentemente o jeito de governar – sobretudo nos estados e na União, mas em termos conceituais a observação vale também para a quase totalidade dos 5.570 municípios. O governo é um aparato constituído para resolver problemas e atender, de forma subsidiária, necessidades cuja solução não consegue ser provida pelas esferas inferiores. Alguns exemplos são a defesa nacional, a administração da justiça, o enfrentamento de catástrofes naturais e o combate a epidemias. Para ilustrar, se alguma catástrofe atinge uma comunidade de forma que a erradicação do mal e de suas consequências somente é obtida se todos os membros da comunidade forem submetidos ao mesmo tratamento e às mesmas ações – como é o caso de uma epidemia de gripe suína ou o surto de uma doença infecciosa –, a ação geral tem de ser de caráter coletivo e em todo o território nacional. Esse é um caso em que é necessária a ação de uma entidade coletiva, o governo.

Esse mesmo raciocínio pode ser levado para a necessidade de construção de bens coletivos – uma avenida, uma praça pública, a iluminação pública, a segurança interna; portanto, em maior ou menor grau, o governo é, sim, necessário. Para cumprir suas funções, o governo requer uma estrutura de bens de capital (prédios, máquinas, móveis, equipamentos etc), uma estrutura de pessoal (os governantes eleitos e os funcionários públicos de carreira), um sistema administrativo e insumos típicos da atividade produtiva de bens e serviços. Considerando que os investimentos estatais (estradas, hospitais, escolas, prédios administrativos) e os serviços públicos são, no mais das vezes, fornecidos gratuitamente à população, essa mesma população tem de pagar os custos do governo de forma coletiva, por meio de tributos gerais. 

O aumento do STF é o exemplo mais simbólico do descolamento do governo em relação ao resto da sociedade 

O Brasil chega ao fim da segunda década do século 21 tendo montado um aparelho estatal nas três esferas da Federação que está contaminado pelo que há de pior em qualquer sistema produtivo: ineficiência, desperdício, mau gerenciamento, elevado grau de corrupção, baixa qualidade de seus produtos, alto endividamento e falência financeira. Esses males todos não são obra do acaso. São o resultado de longas décadas de erros e mais erros que, se não forem extirpados, jogarão o país no caos e na pobreza eterna, sem possibilidade de crescer, se desenvolver e melhorar o padrão de vida de toda a sua população. A máquina pública se tornou uma engenhoca atrasada, burocrática, com casta de servidores remunerados muito acima da média de seus equivalentes no setor privado, aposentadorias integrais, estabilidade no emprego e sem avaliação de competência e produtividade. 

Nossas convicções: A finalidade do Estado e do governo

Leia também: A crise dos estados (editorial de 25 de novembro de 2018)

O descolamento do setor estatal em relação à realidade é tão grande que, numa época em que a inteligência artificial está inventando robôs cognitivos que vão substituir os trabalhadores mesmo em tarefas intelectivas, o setor público mantém gastos imensos com aposentadorias de ascensoristas de elevador e servidores de cafezinho com salários superiores a R$ 10 mil, isso para ficar apenas em dois exemplos. Vêm aí o novo presidente da República e 27 governadores de estados e do Distrito Federal, quase todos quebrados, com déficits correntes, dívidas elevadas e sem recursos para fazer os investimentos em infraestrutura de que tanto o país precisa. E mais: já foi divulgado que pelo menos 16 estados em breve não conseguirão pagar salários, aposentadorias e pensões de seus servidores ativos e inativos. O aumento salarial de 16% autoconcedido pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, com aprovação do Congresso e sanção presidencial, em um ano que fechará com inflação de 4,5%, tem o efeito de elevar o teto de remuneração no setor público de R$ 33,7 mil para mais de R$ 39 mil, logo, com reflexos nos salários de outras categorias de servidores na União e nos estados, e significa o exemplo mais simbólico do descolamento do governo em relação ao resto da sociedade – sempre lembrando que, no governo, ninguém amarga desemprego por causa da recessão e das instabilidades que, no mais das vezes, são provocados pelo próprio governo.

O Brasil está diante de uma encruzilhada: ou o país muda o jeito de governar, a forma de encarar a coisa pública e a lógica do setor estatal, ou o sonho de se tornar um lugar de prosperidade material, crescimento econômico, redução do desemprego e sem pobreza será uma utopia perdida e inviável. Não há soluções fáceis nem rápidas. Os próximos governantes podem adotar um novo jeito de governar e, embora os efeitos substanciais possam demorar para surgir, é preciso começar.

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