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Mesmo antes da eleição de Lula para a Presidência, em 2002, o discurso petista dividia o país entre “nós” e “eles” – respectivamente, os adeptos/aliados do PT e todos os que discordavam das plataformas do partido em temas sociais, econômicos ou comportamentais. Assim, entre “eles” havia personalidades de visões às vezes diametralmente opostas: Fernando Henrique Cardoso, Ulysses Guimarães, Paulo Maluf, José Sarney, Fernando Collor de Mello, José Serra, Itamar Franco... todos esses já foram “eles” em algum momento; uns ainda o são, outros passaram a ser “nós” mais recentemente. Honestos e ladrões, direitistas e social-democratas, conservadores e liberais; para estar no grupo “deles” bastava apenas não ser petista.

Vamos supor, por um momento, que esta dicotomia faça sentido ou esteja correta. Mesmo neste caso, existe uma pauta que, em momentos especiais da história do Brasil, torna-se uma unanimidade: o combate à corrupção. De muitas comparações feitas entre 1992 e 2016, justamente essa convergência tem sido negligenciada. Quando ficou evidente que Fernando Collor estava envolvido em corrupção, o Brasil inteiro foi às ruas. “Nós” e “eles” se uniram no “fora Collor”, e isso incluiu também os que, pertencendo ao grupo “deles”, até concordavam com medidas que o então presidente havia tomado, como a abertura do mercado nacional a diversos produtos estrangeiros, ou o início do programa de privatizações. Mas mesmo quem apoiou as medidas liberais de Collor o quis fora do poder porque não tolerava a rede de corrupção implantada no Planalto e na Casa da Dinda. O leitor consegue se lembrar, hoje, de alguém que em 1992 tenha ficado ao lado de Collor por convicção sincera, sem que, pessoalmente, tivesse algo a perder com sua queda?

Não consideramos correto defender corruptos só porque concordam conosco

Com essa unidade nacional do “fora Collor” em mente, voltemos a 2016. O Fiat Elba de 24 anos atrás se transformou em dezenas de bilhões de reais em “pedaladas”, e em outros tantos bilhões em desvios e propinas da Petrobras, outras empresas estatais e ministérios, de acordo com as descobertas da Operação Lava Jato. Para recordar a expressão do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, “o seu, o meu, o nosso” dinheiro estava sendo embolsado por partidos políticos para a construção de seu projeto de poder. Não deveria ser um motivo ainda maior para que, novamente, “nós” e “eles” estivessem juntos na rua pedindo pelo fim do governo que não apenas permitiu, mas organizou tal esquema?

Infelizmente, não é o que vem acontecendo. É verdade que, ao lado de todos aqueles identificados como “eles”, há alguns tradicionalmente considerados como “nós” e que estão do lado do impeachment, como Fernando Gabeira, com longo histórico de posições de esquerda. Casos como o de Gabeira, no entanto, são uma minoria.

Em 1992, qualquer um que permanecesse do lado de Collor, com tudo o que as investigações do seu esquema haviam descoberto, seria considerado um defensor do indefensável justamente porque não havia tolerância com a ladroagem. É essa intolerância com a corrupção que seria natural esperar neste momento, inclusive daqueles que estão de acordo com o PT em temas como o papel do Estado na economia, programas sociais ou plataformas de cunho moral. Mas muitas dessas pessoas escolheram ficar ao lado do PT e de seus líderes (alguns deles atrás das grades), apesar de tudo o que já foi comprovado.

Como pessoas de boa índole, que inclusive se pautam pela ética no comportamento pessoal, passam a defender o indefensável quando se trata do atual governo? A pura afinidade ideológica não pode ser explicação suficiente: não consideramos correto defender corruptos só porque concordam conosco. É essa reflexão que gostaríamos de deixar para aqueles que desejam construir um país livre de corrupção, independentemente da coloração política de cada um.

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