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texto-base da reforma da Previdência: deputados comemoram aprovação
Deputados governistas comemoram aprovação do texto-base da reforma da Previdência no plenário da Câmara. Foto: Luis Macedo/Agência Câmara| Foto: Luis Macedo/Agência Câmara

Quem imaginaria, três anos atrás, que hoje teríamos forças políticas brigando pelo crédito da aprovação de uma reforma então vista como impensável, que “tiraria direitos” dos brasileiros, “acabaria com a aposentadoria” e faria o cidadão “trabalhar até morrer”, para citar apenas alguns dos slogans usados pela oposição de esquerda em sua campanha de desinformação? Pois é o que tem acontecido com a reforma da Previdência, que está em seus estágios finais de aprovação na Câmara dos Deputados, após meses de tramitação, idas e vindas, e deve passar por processo semelhante no Senado antes de virar realidade. De repente, a reforma da Previdência não é mais o “filho feio” que, diz o provérbio, “não tem pai”: todos querem ser aprovados no teste de paternidade, com certa dose de razão, já que não haveria reforma sem a confluência de um conjunto abrangente de atores políticos.

A começar, logicamente, pelo presidente Jair Bolsonaro e a equipe que ele escolheu, como o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o secretário da Previdência, Rogério Marinho. É verdade que vários outros candidatos ao pleito de 2018 também prometeram reformar a Previdência – até o adversário de Bolsonaro no segundo turno, o petista Fernando Haddad, que não incluiu o tema em seu plano de governo, mencionou a necessidade de reforma durante a campanha, ainda que em termos bastante tímidos. De qualquer modo, foi Bolsonaro quem venceu a disputa e efetivamente cumpriu o prometido, enviando ao Congresso uma boa proposta de reforma, com potencial de impedir o caos fiscal que se aproxima no médio e longo prazo.

Vários parlamentares e partidos que desejam ver seu nome no resultado do teste de DNA da reforma da Previdência precisam admitir também que eles transmitiram à cria mutações que a deixarão enfraquecida

Sim, houve momentos em que presidente e equipe econômica mais atrapalharam que ajudaram. Bolsonaro, logo no início da tramitação, enfraqueceu a posição do governo ao citar várias concessões que poderia fazer; e, mais recentemente, defendeu o afrouxamento das regras para policiais. Guedes embarcou em uma guerra verbal com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), quando da divulgação do relatório de Samuel Moreira (PSDB-SP). Mesmo assim, dizer que a reforma passa apesar de Bolsonaro é um enorme exagero que não reconhece o importante papel do presidente e da equipe econômica.

Um papel, aliás, que lhe havia sido dado pelas urnas e foi endossado pelas ruas. Se a Previdência entrou na campanha em 2018, foi graças ao ex-presidente Michel Temer e seu ministro Henrique Meirelles, que fizeram a primeira proposta de reforma, posteriormente engavetada. Eles chamaram a atenção, acertadamente, para a necessidade de mudanças. Mas, além das complicações que Temer enfrentou, tendo de gastar capital político para salvar seu mandato em vez de aprovar a reforma, o presidente não tinha o endosso popular que Bolsonaro recebeu, com quase 58 milhões de votos. E, sentindo que a reforma corria risco, os brasileiros foram às ruas em 26 de maio para reafirmar seu apoio, algo inédito para o país, considerando a natureza do que era pedido, e que também não pode ser descartado.

E a Câmara dos Deputados? Maia, como presidente da casa, tinha o poder de acelerar ou atrasar a tramitação da reforma. Não há dúvidas de que trabalhou por ela, mas houve momentos, meses atrás, em que, alvo de críticas – que podem até ter sido infundadas, mas que um político com sua experiência devia ser capaz de suportar com mais resiliência –, ele ameaçou deixar a articulação pela reforma, o que teria sido fatal. Especialmente após a divulgação do relatório de Moreira na Comissão Especial, Maia tentou, mas não conseguiu impedir o Centrão de se impor e colocar condições para dar os votos necessários à aprovação.

Leia também: A primeira grande vitória da reforma da Previdência (editorial de 11 de julho de 2019)

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Centrão, aliás, que várias vezes reivindicou o protagonismo na tramitação da reforma. “A reforma da Previdência que pode ser aprovada não será a do governo. Será uma outra, que estamos construindo”, chegou a dizer o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), líder do bloco. “Construção”, no caso, é mera força de expressão, porque todas as condições impostas pelo bloco para apoiar a reforma foram no sentido de enfraquecê-la. Mas seria injusto jogar toda a desidratação da reforma nas costas do Centrão, pois a votação dos destaques em plenário, iniciada nesta quinta-feira, mostrou que até o PSL, partido do presidente, ajudou a aliviar as regras de aposentadoria para setores que lhe são caros.

Haveria reforma sem os votos do Centrão? Provavelmente não. Mas, se esses parlamentares e partidos querem ver seu nome no resultado do teste de DNA da reforma da Previdência, precisam admitir também que eles – e muitos outros que não pertencem ao bloco – transmitiram à cria mutações que a deixarão enfraquecida, como as concessões exageradas a certas categorias, a exclusão de estados e municípios, ou o fim do gatilho automático que reajuste as idades mínimas à medida que aumentar a longevidade do brasileiro.

A aprovação da reforma da Previdência é, sem dúvida, uma construção coletiva. Houve os que a propuseram, os que a apoiaram desde a primeira hora, os que a apoiaram em sua integridade, os que a pediram nas ruas, os que deram seu voto quando importava. Alguns destes atores, ressaltamos, nem sempre colocaram muito empenho no tema, e por vezes até colocaram obstáculos. Evidente que, aprovada a reforma, saber quem é o pai da criança é o de menos, mas Brasília vive, em boa parte, da aquisição e manutenção de capital político-eleitoral; e o fato de o apoio a uma reforma como a da Previdência ter se tornado algo positivo em vez de uma “sentença de morte eleitoral” não deixa de ser notável.

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