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O que Bolsonaro e Paulo Guedes farão na economia em 2020
Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, devem debater no valor para o salário mínmo| Foto: Isac Nobrega/PR

O constituinte de 1988 tinha sido muito claro quando colocou, no artigo 173 da Carta Magna, que “a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo”. Em outras palavras, a existência de empresas estatais deveria ser algo extraordinário, e não uma prática recorrente. Mas, àquela altura, décadas de estatismo já tinham criado um enorme leque de estatais, agindo nos mais diversos setores. Além disso, mesmo depois de 1988, a participação direta do governo em áreas nas quais a iniciativa privada tinha todas as condições de atuar aumentou, graças a uma interpretação bastante alargada do “relevante interesse coletivo”.

Como resultado, aplicar o princípio estabelecido na Constituição é tarefa hercúlea para qualquer governo que esteja interessado em enxugar o Estado (porque já tivemos aqueles dispostos a inchar mais ainda a estrutura do governo). “Para privatizar hoje demora uns dois anos e meio. Você termina o governo e não conseguiu vender [a estatal]”, reclamou o ministro Paulo Guedes em novembro do ano passado. E ele não se referia à mentalidade estatizante que tomou conta do imaginário nacional, que enxerga estatais como “patrimônio do povo” e a privatização como “entreguismo”. A questão, aqui, é meramente burocrática: desfazer-se de uma estatal deveria ser simples, mas tornou-se um processo excessivamente longo, especialmente graças a intervenções do Congresso – com parlamentares interessados na profusão de cargos de estatais, usados como moeda de troca no jogo político – e do Judiciário, com interpretações equivocadas da Constituição, como a que exigiu aval legislativo para toda e qualquer privatização simplesmente porque existe essa necessidade para criar uma estatal. Não surpreende que o programa de privatizações do governo Bolsonaro tenha ficado aquém da expectativa criada após a vitória eleitoral de 2018.

Aplicar o princípio estabelecido na Constituição é tarefa hercúlea para qualquer governo que esteja interessado em enxugar o Estado

Por isso, já no fim do ano passado o governo considerou a possibilidade de enviar ao Congresso um projeto de lei que crie um “fast track” para acelerar privatizações de estatais grandes – as empresas menores, que têm receita bruta inferior a R$ 300 milhões anuais, já foram alvo de uma resolução que reduz o tempo necessário para a venda. O texto do projeto ainda não veio a público, mas ele incluiria, por exemplo, uma autorização “em bloco” do Legislativo para a privatização de uma série de empresas, além de acelerar ou eliminar etapas da burocracia da venda, que hoje depende da inclusão da estatal no Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) e no Plano Nacional de Desestatização (PND), com o BNDES elaborando a modelagem da venda.

Há aspectos que têm de ser preservados e valem tanto para privatizações quanto para concessões, como um processo de avaliação adequada do valor da empresa a ser vendida, para evitar “pechinchas”; ou regras que privilegiem a competição ao mesmo tempo em que desestimulam a participação de aventureiros dispostos a dar lances grandes, mas que acabam se revelando incapazes de administrar bem a empresa ou concessão. Mas também existe uma série de exigências desproporcionais ou desnecessárias, e eliminá-las é passo importante para fazer valer o que a Constituição afirma no artigo 173.

Independentemente do “fast track”, o governo já tem uma lista de estatais que deseja ver vendidas em 2020, incluindo a Casa da Moeda, e a relação pode ganhar um reforço significativo se o Congresso finalmente aprovar o projeto de lei que permitirá ao governo vender a Eletrobrás. Mas o esforço de desestatização ganhará muito se forem removidos os empecilhos criados ao longo de anos, motivados por uma visão torta dos papéis do Estado e da iniciativa privada.

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