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Ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente Jair Bolsonaro: queda no PIB poderia ter sido mais feia, mas não foi.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente Jair Bolsonaro.| Foto: Sérgio Lima/AFP

Até segunda-feira, tirar do papel o Renda Brasil, desenhado para ser o substituto do Bolsa Família e se tornar a “marca social” do governo de Jair Bolsonaro, era prioridade. Na manhã de terça-feira, não mais que de repente, “até 2022, no meu governo, está proibido falar a palavra ‘Renda Brasil’”, disse o presidente em um vídeo transmitido pelas mídias sociais. No centro da controvérsia estava a ideia de buscar recursos para o novo programa social por meio do congelamento de benefícios previdenciários, hoje corrigidos automaticamente pela inflação, e que ganhou as manchetes após entrevista do secretário especial da Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues Júnior, ao jornal Valor Econômico.

O ministro da Economia e chefe de Rodrigues, Paulo Guedes, atribuiu a irritação do presidente ao que chamou de “distorção” das ideias da equipe econômica, que pretendia desindexar todas as despesas do Orçamento, não apenas de aposentadorias, pensões e do Benefício de Prestação Continuada (BPC). De fato, é sabido desde o envio das PECs dos Fundos, Emergencial e do Pacto Federativo que a equipe econômica trabalha com o que chama de “três Ds”, em referência a desindexar, desvincular e desobrigar receitas e despesas, medidas importantes para que o orçamento não continue sofrendo do extremo engessamento que mantém o investimento público em patamares mínimos. No entanto, não há como negar que o secretário da Fazenda efetivamente falou em buscar os recursos necessários para o Renda Brasil por meio do congelamento das aposentadorias e pensões.

Em vez de a equipe econômica discutir a portas fechadas com Bolsonaro os meios de tornar possível o novo programa social, as propostas são primeiro tornadas públicas e depois abatidas em pleno voo pelo presidente

Todo o ruído causado pela entrevista do secretário e pela reação de Bolsonaro é reflexo de um modus operandi que o governo e a equipe econômica já empregaram nas discussões sobre a reforma tributária: o recurso quase que exclusivo a balões de ensaio. No caso da reforma tributária, as ideias mais diversas são lançadas ao público com o objetivo de testar a sua aceitação; com o Renda Brasil, parece ser ainda pior: em vez de a equipe econômica discutir a portas fechadas com Bolsonaro os meios de tornar possível o novo programa social, as propostas são primeiro tornadas públicas e depois abatidas em pleno voo pelo presidente, causando um enorme desgaste a Guedes e sua equipe. Foi assim com a tentativa de acabar com o abono salarial, ocasião em que Guedes descreveu a reprimenda de Bolsonaro como “carrinho fora da área”, e não haveria como ser diferente agora, com uma reação ainda mais exaltada da parte do presidente.

Faltou, no entanto, uma explicação mais consistente para o fim de qualquer possibilidade de criar o Renda Brasil. Guedes tentou fazer do limão uma limonada ao afirmar que a decisão privilegia a responsabilidade fiscal e sinaliza respeito ao teto de gastos, o que é verdade. A matemática é fácil: para tornar possível o novo programa, seria preciso cortar cerca de R$ 20 bilhões em despesas para cobrir a diferença entre o custo atual do Bolsa Família e o impacto do Renda Brasil como desejado por Bolsonaro. Difícil está sendo tomar a decisão política sobre o que deve ser cortado para viabilizar o novo programa. Acaba sendo mais cômodo encerrar todas as discussões e colocar a culpa em uma ideia considerada aloprada ou insensível, em vez de reconhecer a incapacidade de encontrar uma forma de colocar em pé o Renda Brasil sem burlar as regras orçamentárias.

Em um país pobre e desigual como o nosso, o Renda Brasil, que tem a mesma inspiração liberal que está na raiz do Bolsa Família, merecia uma boa discussão, tendo em mente o drama dos brasileiros mais vulneráveis, mas sempre dentro do que pede a responsabilidade fiscal. Se as propostas colocadas na mesa até agora não eram satisfatórias, o ideal seria seguir buscando meios de viabilizar o programa – de preferência internamente, sem os ruídos causados sempre que se recorre aos balões de ensaio. O que não era aconselhável foi justamente o que aconteceu: o encerramento abrupto dos esforços, ainda mais da forma destemperada e impulsiva empregada por Bolsonaro em seu vídeo. A não ser que, efetivamente, já se tenha tentado de tudo para encontrar os tais R$ 20 bilhões, sem sucesso; neste caso, falta apenas saber se o presidente está sendo inflexível demais ou se as disfuncionalidades do nosso orçamento chegaram a um nível insustentável.

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