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O presidente Jair Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro| Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República

O brasileiro não engoliu – e com toda a razão – o trecho da Lei de Diretrizes Orçamentárias que prevê a quase triplicação do bilionário fundo eleitoral, aquele criado pelo Congresso em 2017 para que candidatos gastem dinheiro do contribuinte nas campanhas em que buscarão convencer o eleitor de que são as melhores pessoas para administrar esse mesmo dinheiro do contribuinte. Diante da repercussão negativa, o presidente Jair Bolsonaro chegou a prometer o veto, mas depois recuou e passou a falar em vetar apenas um “excesso” de R$ 2 bilhões, o que ainda deixaria o fundo com cerca de R$ 3,7 bilhões para 2022. “Vou deixar claro uma coisa. Vai ser vetado o excesso do que a lei garante. A lei, quase R$ 4 bilhões, o fundo. O extra de R$ 2 bilhões vai ser vetado”, afirmou a apoiadores diante do Palácio do Planalto, na segunda-feira.

O recuo, no entanto, tem dois problemas. O primeiro deles é de ordem formal. A LDO não traz o valor exato do fundo, mas os critérios pelos quais a quantia será definida: parte das emendas de bancadas estaduais e 25% dos recursos que a Justiça Eleitoral teve em 2021 e terá em 2022. É com base nisso que se chegou ao valor de R$ 5,7 bilhões. E esta descrição consta do inciso XXVII do artigo 12 da LDO. Ocorre que o presidente da República só pode vetar artigos, incisos, parágrafos ou alíneas de forma integral, mas não pode retirar ou alterar apenas algumas palavras ou frases do texto. Bolsonaro, portanto, só tem duas opções: vetar todo o inciso XXVII, e com ele derrubar todo o fundo eleitoral; ou mantê-lo, deixando intactos os R$ 5,7 bilhões. Da forma como o texto foi construído, não há como retirar parte do valor e deixar outra parte.

Enquanto não é possível eliminar os fundos eleitoral e partidário, faça-se o que for necessário para que o mínimo possível de recursos do contribuinte seja destinado a partidos e campanhas, que precisam ser bancados apenas por membros e simpatizantes

O segundo problema é conceitual. Quando Bolsonaro classifica apenas R$ 2 bilhões como “excesso”, na prática ele valida, ao menos moralmente, a entrega dos outros R$ 3,7 bilhões aos partidos para campanha eleitoral. O presidente chegou a alegar que está na lei a obrigatoriedade de reajuste do fundo pela inflação, mas o valor que Bolsonaro passou a considerar aceitável ainda é muito maior que os R$ 2 bilhões do fundo eleitoral de 2020 corrigidos pela inflação dos últimos dois anos. E a própria existência do fundo eleitoral – assim como a de seu irmão mais velho, o Fundo Partidário – é uma imoralidade. Partidos e campanhas precisam ser bancados por seus membros e simpatizantes, e não com recursos tomados do contribuinte, que lhe fazem falta e que, mesmo nas mãos do Estado, poderiam e deveriam ser usados em outras finalidades, não na satisfação das necessidades particulares de entes políticos.

Bolsonaro ainda alegou que, caso vetasse integralmente o fundo eleitoral, poderia incorrer em crime de responsabilidade, sob o argumento de que esta é uma rubrica do Orçamento prevista em lei e que, por isso, tem de existir. No entanto, mesmo neste caso há uma opção: o veto integral ao inciso XXVII do artigo da LDO neste momento, seguido pela inserção de novos critérios ou um novo valor no projeto da Lei Orçamentária Anual, que o governo tem de enviar ao Congresso até 31 de agosto. Isso daria aos parlamentares aliados do presidente uma segunda chance para fazer o que não quiseram, não puderam ou não conseguiram fazer durante a tramitação da LDO: costurar um valor menor durante a tramitação, antes que o texto-base vá a votação nos plenários da Câmara e do Senado.

O fundo eleitoral, por si só, já é uma imoralidade – e um fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões ou mesmo de R$ 4 bilhões é um escárnio completo. A sociedade brasileira veria com satisfação o seu fim, assim como o do Fundo Partidário. Uma chance para tal está na PEC apresentada dias atrás pelo deputado Paulo Martins (PSC-PR), que acaba com esse financiamento público de partidos e campanhas. Mas, enquanto este momento não chega, faça-se o que for necessário para que o mínimo possível de recursos do contribuinte seja destinado a esse fim, e que os partidos encontrem meios ou de baratear suas campanhas, ou de estimular seus membros e simpatizantes a contribuir voluntariamente.

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