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Porta da esperança para milhões de brasileiros que dificilmente teriam chance de ingressar numa universidade pública e gratuita, dado o rigor dos vestibulares e a exiguidade de vagas, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) parecia reunir todos os atributos para figurar na história como uma das melhores iniciativas em favor da democracia social já vistas no país. Mas na pátria educadora o dinheiro acabou e o governo anuncia que já não tem condições de assegurar a tantos quantos procuram o Fies a oportunidade de frequentar faculdades privadas, conforme reconheceu o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, após a decepção de milhares de estudantes que, por meses, tentaram inutilmente acessar o site do MEC para inscrever-se no programa.

A inteligência contida no Fies está no fato de os estudantes poderem atingir grau universitário em escolas privadas mediante financiamento a juros baixos, que passam a quitar apenas a partir da obtenção do diploma. Basicamente, aos interessados basta comprovar terem obtido nota mínima no Enem para se matricularem nas instituições e cursos que lhes aprouverem. As escolas credenciadas – algumas, infelizmente, comprometidas tão-somente com resultados empresariais – recebem as anuidades correspondentes diretamente do governo.

O fiasco do Fies de 2015 precisa ser entendido como lição para o próprio governo

Graças a isso, 1,9 milhão de jovens já cursaram (ou ainda cursam) universidades mediante contratos de financiamento. O governo federal investiu no programa até agora cerca de R$ 15 bilhões. Em razão das facilidades oferecidas – ou até mesmo por causa das flácidas regras vigentes – perto de meio milhão de estudantes pretendia alcançar o benefício neste ano, mas apenas metade deles conseguiu ultrapassar duas barreiras: uma, a dificuldade de acessar o módulo de inscrição disponibilizado pelo MEC via internet; outra, as frequentes mensagens de erro emitidas pelo site e que impediam a conclusão do processo.

Só agora, no entanto, quando o prazo de inscrição se esgotou, é que se soube a causa real de tantas tentativas malsucedidas: o ministro da Educação confessou que o orçamento para este ano fora limitado em R$ 2,5 bilhões, o necessário tão-somente para atender o contingente que venceu as barreiras. Com isso, a outra metade terá de esperar a liberação de mais recursos, algo que o ministro diz não poder garantir, ainda que sobre o governo já pese uma decisão judicial que o obrigaria a reabrir as inscrições. Contra ela, no entanto, a Advocacia-Geral da União (AGU) já está pronta para recorrer.

Em que pese tantas agruras e ainda que não sejam desqualificados os inegáveis méritos do Fies, há de se observar que a triste situação a que o programa chegou certamente se deve ao caráter populista que ele tomou – típico do comportamento assistencialista e eleitoreiro de outras iniciativas de promoção social dos governos petistas. Caso, por exemplo, também do Bolsa Família que, embora assegure sustento para milhões de carentes, não lhes abre suficientes oportunidades de escapar da dependência do Estado.

O Fies seguiu praticamente a mesma trilha. A universalização das oportunidades para se obter o financiamento facilitou o “esquecimento” de critérios meritocráticos. Qualquer estudante que tivesse obtido no Enem a nota mínima de 4,5 pontos teria direito à inscrição, mesmo que tivesse zerado na prova de redação. Da mesma forma, instituições de ensino de baixa qualidade também poderiam ser credenciadas a oferecer vagas e, por conseguinte, auferir recursos públicos para sustentar-se.

Resumo da tragédia: apesar da inegável importância e necessidade de expandir a educação superior – melhor ferramenta para o progresso social e individual para quem consegue completar este nível, e também para assegurar bases sustentáveis para o desenvolvimento do país – a política governamental manteve-se longe da preocupação com a qualidade. Importava-lhe mais a quantidade – e esta demonstrou estar limitada à escassez de recursos públicos nesta etapa de penúria ditada pelo ajuste fiscal.

Em boa hora, contudo, o ministro Janine Ribeiro parece ter feito o governo acordar para a urgência de mudanças que, embora soem como excludentes, são absolutamente indispensáveis para produzir efeitos qualitativos regressivos: a elevação das exigências aferidas por meio do Enem forçará a melhoria do ensino médio e a escolha mais criteriosa de instituições habilitadas a prestar melhor ensino superior.

Lamenta-se que tantos jovens estejam tendo seus sonhos barrados, mas o fiasco do Fies de 2015 precisa ser entendido como lição para o próprio governo.

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