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| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Um dos efeitos mais nocivos da greve de caminhoneiros que parou o país em maio, o tabelamento do frete, vai custar caro ao agronegócio, afirmou na terça-feira o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Ronaldo de Castro Souza Junior. Mesmo com a indefinição jurídica sobre a possibilidade de o governo estabelecer preços mínimos para o transporte rodoviário no país, o órgão já dá como praticamente certo que haverá um impacto nos preços dos alimentos.

Em julho, pouco antes de entrar em recesso, o Congresso Nacional aprovou a medida provisória que dava à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) o poder de estabelecer uma tabela com valores mínimos para o frete. Antes mesmo da votação, diversas entidades do setor produtivo já haviam buscado a Justiça, alegando a flagrante inconstitucionalidade da MP. No meio de junho, o ministro do STF Luiz Fux determinou que todas as ações fossem suspensas para que o Supremo resolvesse a questão e evitasse decisões contraditórias em tribunais diferentes. Mas, depois disso, só houve algumas audiências, sem decisão nenhuma, nem mesmo em caráter liminar. Como a próxima reunião sobre o assunto está marcada apenas para o dia 27, o país já terá vivido pelo menos dois meses de indefinição sobre a validade da última tabela publicada pela ANTT, já que o governo considera que ela está em vigor, enquanto o setor produtivo discorda. Enquanto isso, a agência reguladora está trabalhando em uma nova tabela.

A intervenção do governo viola frontalmente os textos constitucionais que defendem a livre iniciativa e a concorrência

As entidades que buscaram a Justiça têm razão quanto à inconstitucionalidade do tabelamento do frete, mesmo em sua versão mais branda, aquela que apenas determina preços mínimos para o serviço. A intervenção do governo viola frontalmente todos os dispositivos constitucionais que defendem a livre iniciativa e a concorrência, além de dar à agência reguladora um poder que ela não tem. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), responsável por defender a livre concorrência no país, já alertou para o perigo de o tabelamento levar à formação de cartéis.

Para contornar os problemas criados pelo tabelamento, empresas e produtores agropecuários estão montando frotas próprias – a venda de caminhões em julho, segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), subiu 16,3% na comparação com junho e 47,3% na comparação com julho de 2017. Só a JBS adquiriu 360 veículos. O fato de esses produtores aceitarem arcar com os custos da compra e da manutenção de veículos só serve para ressaltar o tamanho do estrago feito pela imposição de preços mínimos.

Leia também: O frete e o ataque à liberdade (editorial de 5 de julho de 2018)

Nossas convicções: Livre iniciativa

Este movimento estava longe de ser surpreendente, já que seria muita ingenuidade acreditar que o setor produtivo, tendo contra si o governo, o Congresso e, talvez, o STF, aceitasse pacificamente um aumento exorbitante nos seus gastos sem considerar outras possibilidades, como a aquisição de uma frota própria. Mesmo assim, há quem queira pagar para ver, como Carlos Alberto Dahme, presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de Ijuí (RS), que disse ao portal G1 acreditar que as empresas estão apenas blefando.

Os caminhoneiros já tinham de lidar com excesso de oferta, decorrente das facilidades na aquisição de veículos, e redução na demanda, consequência da crise econômica. Se o Supremo contrariar a própria Carta Magna e decidir pela legalidade do tabelamento, a tendência é um novo choque de oferta no setor de transporte, fazendo com que uma das grandes demandas dos caminhoneiros se volte contra a própria categoria – resultado das distorções introduzidas na livre concorrência e na livre negociação.

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