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Jardim Olinda é um dos menores municípios do Paraná: só tem 1,3 mil moradores e não tem arrecadação própria suficiente
Jardim Olinda é um dos menores municípios do Paraná: só tem 1,3 mil moradores e não tem arrecadação própria suficiente.| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Ficou para o ano que vem a segunda votação, na Câmara dos Deputados, da PEC que aumentaria o repasse da União ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), tema que estava colocando o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a equipe econômica em rota de colisão, mais uma vez. Quando percebeu que eram grandes as chances de o Planalto sair derrotado e, com isso, ter de abrir mão de mais alguns bilhões de reais, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), mudou o discurso e passou a elogiar a PEC como uma concretização do slogan “mais Brasil, menos Brasília”. Com a disputa pela presidência da Câmara permeando tudo o que vem sendo feito na casa legislativa nestes dias, ninguém quis arriscar perder apoio a seu candidato favorito, nem se indispor com os prefeitos, nem aparecer como adversário do ajuste fiscal – a solução para essa conciliação impossível foi simplesmente jogar a votação para 2021; se a PEC for aprovada, os municípios verão este dinheiro apenas em 2022.

Assim como os estados, os municípios também terão seu choque de realidade em 2021, quando já não haverá o repasse bilionário da União para repor perdas decorrentes da queda de arrecadação causada pela pandemia da Covid-19. E ainda há muita incerteza a respeito das chances de a economia voltar ao normal no curto prazo, já que a vacinação contra o coronavírus deve demorar a engrenar no país, e um repique da pandemia está levando várias cidades a retomar as restrições aos negócios (aqueles que sobreviveram, é preciso dizer) vistas no início da crise da Covid-19. Aumentar os repasses da União aos municípios surge como resposta fácil e rápida, adotada já em 2007 e 2014 – e este terceiro aumento já tinha sido proposto antes mesmo da pandemia; a primeira votação da PEC na Câmara ocorreu ainda em 2019.

O modelo atual, em que a arrecadação é concentrada na União, restando aos prefeitos contentar-se com repasses federais apenas para bancar a burocracia e o mero exercício do poder, é destrutivo

No entanto, se a proposta vai engessar ainda mais o orçamento federal, que já conta cada bilhão que terá à disposição para investir como achar melhor, pouco fará para resolver o verdadeiro problema dos municípios, especialmente os menores. Muitos deles são inviáveis no modelo atual, arrecadando menos que o suficiente para bancar sua estrutura burocrática, quanto mais oferecer os serviços públicos que são de sua competência. Relatório de 2019 da Firjan havia mostrado que um terço dos municípios mais encrencados levantava, em média, R$ 3 milhões em impostos por ano, enquanto apenas suas prefeituras e Câmaras Municipais custavam, em média, R$ 4,5 milhões. E, segundo a própria Frente Nacional dos Prefeitos, nas cidades pequenas os gastos apenas do Legislativo municipal correspondiam ao triplo da arrecadação do IPTU.

Por mais interessante que seja ter as administrações mais próximas dos cidadãos, o que justificaria uma descentralização maior do poder, com mais municípios, o modelo atual, em que a arrecadação é concentrada na União, restando aos prefeitos contentar-se com repasses federais apenas para bancar a burocracia e o mero exercício do poder, é destrutivo. Diante disso, há duas soluções mais evidentes: a primeira seria uma reforma tributária realmente abrangente, combinada com uma revisão do pacto federativo, com o objetivo de efetivamente distribuir de maneira justa os recursos tirados do cidadão e das empresas por meio dos impostos, permitindo que mesmo os municípios menores se tornassem solventes e capazes de oferecer serviços de qualidade ao cidadão. A contrapartida seria a adoção de um forte ajuste fiscal nas administrações municipais, muitas das quais já estouraram os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal.

A segunda alternativa é a fusão dos municípios inviáveis em unidades maiores e capazes de administrar melhor seus parcos recursos, resultado em menos prefeitos, secretários, vereadores e toda a multidão de assessores que gravitam em torno desses gestores. Propostas nesse sentido, estabelecendo os critérios para a fusão, já tramitam no Congresso; algumas delas até chegaram a ser aprovadas, mas, como também abriam espaço para novos desmembramentos, acabaram vetadas pela Presidência da República.

De nada adianta a população ter a administração mais próxima de si quando essa administração é incapaz de bem realizar seu trabalho por falta de recursos – especialmente se essa escassez foi criada pela própria inabilidade dos gestores municipais em controlar seus gastos. Os municípios precisam de recursos para entregar ao cidadão aquilo que a Constituição e a legislação infraconstitucional deixam a cargo das administrações locais. Independentemente da escolha pela descentralização ou por municípios maiores e mais sólidos, é preciso garantir os meios para que a população se veja devidamente contemplada – justamente o que o modelo atual não permite, e não será com um FPM reforçado que isso passará a ocorrer.

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