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Novo Fundeb ainda tem que ser votado pelo Senado
Novo Fundeb ainda tem que ser votado pelo Senado.| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo/Arquivo

A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que torna permanente o Fundeb (Fundo de Desenvolvimento e Valorização dos Profissionais de Educação). O placar da votação aponta que a proposta teve pouca oposição: foram 499 votos a 7 no primeiro turno.

O Fundeb sucedeu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef), criado em 1997 na gestão de Fernando Henrique Cardoso, em meio a um bem-sucedido esforço pela universalização do acesso ao ensino fundamental. O Fundeb, por sua vez, era temporário e seria extinto ao fim deste ano caso não fosse renovado. O fundo é alimentado por tributos estaduais e por uma contribuição federal que hoje equivale a 10% do montante total.  
A premissa central do Fundeb é a da redistribuição dos recursos: em vez de São Paulo custear suas escolas apenas com os tributos arrecadados no próprio estado, por exemplo, contribui para o Fundeb e recebe um valor de volta - considerando, dentre outros critérios, o número de alunos em cada etapa de ensino. De forma geral, os estados mais pobres recebem mais do que contribuem. Em 2020 a previsão é de que o Fundeb movimente R$ 168 bilhões - R$ 15,3 bilhões oriundos do governo federal. Segundo o Ministério da Educação, o fundo representa 63% das verbas aplicadas na educação pública.

De acordo com o texto aprovado pela Câmara, o Fundeb passa a constar da Constituição. Ou seja: a partir do ano que vem, o temporário se transformaria em permanente. O texto, que ainda precisa do aval do Senado e da sanção presidencial para entrar em vigor, também prevê um aumento gradual na contribuição do governo federal para o Fundeb, começando com 12% em 2021 e chegando a 23% em 2026. A ideia é amenizar as desigualdades regionais.“Não tem sentido uma criança ter R$ 19 mil de custo por ano e outra que não chega a R$ 2 mil em vários municípios brasileiros. Não é esse o país que nós queremos.”, justificou a relatora do texto aprovado pela Câmara, deputada Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO).

Se avaliada por critérios pragmáticos, a medida é boa porque aumenta o grau de previsibilidade para os gestores públicos, o que é imprescindível numa área que, como a educação, exige planejamento de longo prazo. Outra boa notícia é o fato de que, diferentemente da versão atual, o “novo” Fundeb traz a obrigação de que os gestores públicos apliquem pelo menos 5% dos recursos na educação infantil, tradicionalmente negligenciada no país. O programa também passará por uma revisão a cada dez anos, o que dá algum grau de flexibilidade e ameniza o engessamento nas fianças públicas. Outra regra traz um incentivo à boa gestão: do total repassado pelo governo federal, 2,5% serão alocados conforme o desempenho dos estados no Sistema Nacional de Avaliação de Educação Básica (Saeb).

Mas, idealmente, a gestão da educação em um país como o Brasil deveria ser menos centralizada - e é por isso que a bancada do Novo, de orientação liberal, se opôs à inclusão do Fundeb na Constituição. O aumento da responsabilidade do governo federal na gestão da educação, além de aumentar as despesas do governo central em um momento de aperto financeiro, tende a aumentar também a ingerência de Brasília sobre estados e municípios, diminuindo o poder das esferas de governo mais próximas da população. A Base Nacional Comum Curricular, por exemplo, partiu de um princípio semelhante (o da necessidade de equiparação para reduzir desigualdades regionais) para, no fim, criar amarras excessivas até mesmo para escolas particulares, impedindo a existência de uma variedade de currículos que é salutar no campo da educação. As escolas públicas, com raríssimas exceções, são mantidas pelas prefeituras e pelos estados; os professores são funcionários municipais ou estaduais, e, quando há problemas, os pais se dirigem ao prefeito ou ao governo do estado. Por isso, é recomendável que o governo federal permaneça como coadjuvante.

Além disso, o texto aprovado pela Câmara ainda parece se sustentar na premissa de que o aumento do salário dos professores ou de “recursos para a educação” é o principal caminho para a melhoria do setor, o que não é necessariamente verdade em todas as circunstâncias. A proposta aumenta de 60% para 70% o percentual mínimo dos recursos, dentro dos repasses federais, que deve ser aplicado no pagamento de pessoal. Isso impede que estados porventura venham a desenvolver, no futuro, modelos mais inovadores, que exijam menos mão-de-obra (e que apostem, hipoteticamente, em soluções mais tecnológicas).

Os dados da Organização Para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que, na verdade, o Brasil não gasta pouco com educação: em uma comparação com 39 países, aparecemos em 5.º lugar quando o critério é o percentual do PIB destinado ao ensino. Segundo a OCDE, o Brasil aplica 4,1% de todas as suas riquezas produzidas anualmente na educação - mais do que Suécia, França, Suíça e Canadá. Embora a comparação mereça ressalvas (o Brasil ainda tem uma população mais jovem do que a maior parte dos países desenvolvidos), os números refutam a tese de que a falta de recursos é a principal causa dos insucessos do Brasil na área da educação. É imperativo concluir que o atraso brasileiro é, em grande medida, resultado de falhas de gestão e da adoção de um currículo inadequado.

Por isso, se por um lado a inclusão do Fundeb na Constituição é uma escolha legítima feita pelos legisladores, por outro é preciso admitir que não se pode construir uma política educacional com base na crença de que o aumento de recursos bastará para retirar o Brasil da vergonhosa situação em que se encontra. É preciso muito mais do que um aumento nos repasses orçamentários.

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