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Pouco ou nada se pode esperar da CPMI, além de uma troca de acusações e de denúncias vazias

O escândalo que envolveu o senador por Goiás Demóstenes Torres, hoje sem partido, vem respingando em muita gente graúda. As conversas gravadas que vazaram para a imprensa entre Carlinhos Cachoeira, um dos chefes do jogo ilegal no país, e o senador permitiram descortinar uma teia de influência montada pelo contraventor com ramificações no Congresso e em governos estaduais. Além dele, que deixou o DEM para evitar a expulsão, as investigações da Polícia Federal e o trabalho da imprensa mostraram que políticos de todos os matizes mantinham estreitas e suspeitas relações com Cachoeira.

O imbróglio está caminhando para a constituição de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), formada por integrantes da Câmara e do Senado, supostamente com a finalidade de apurar as falcatruas de Cachoeira. O que pode parecer à primeira vista uma iniciativa a ser enaltecida – desvendar a rede de tráfico de influência montada pelo contraventor – na verdade esconde por trás objetivos bem menos meritórios.

A preocupação que ficou palpável pelas manifestações até agora, tanto da situação como da oposição, é utilizar a CPMI a ser instalada na próxima semana como mero instrumento de disputa política. A oposição quer vasculhar velhas maracutaias do contraventor com petistas de alto coturno, entre eles José Dirceu e Delúbio Soares, dois dos mentores do mensalão; já os governistas, por seu lado, prometem centrar suas baterias em Demóstenes. O senador sempre foi identificado como um crítico ferrenho do PT, que agora promete dar o troco, de preferência reduzindo a pó a carreira do já combalido político goiano.

Diante do quadro que se apresenta lamentavelmente pouco ou nada se pode esperar da CPMI, além de uma troca de acusações e de denúncias vazias. Apurar efetivamente as relações espúrias de Cachoeira com políticos do PT, PSDB, DEM, PCdoB, PT, PP e PPS, e junto aos governos de Goiás e Brasília, dificilmente contabilizará um resultado prático. Com tanta gente envolvida até o pescoço, fica difícil esperar que os trabalhos de apuração ganhem a profundidade desejada. Salvo alguma reviravolta inesperada, à Comissão Mista de Inquérito parece estar reservado o destino de outras tantas, isso é, de provocar muito barulho e apresentar pouco resultado prático.

A sombra de Carlinhos Cachoeira junto a várias esferas do poder público vem de muito tempo. Em 2004, Waldomiro Diniz, então assessor do ministro da Casa Civil, José Dirceu, foi flagrado pedindo propina para facilitar a renovação de contrato com a Caixa Econômica de interesse do contraventor. O episódio acabou se tornando no primeiro grande escândalo do governo Lula, desencadeando posteriormente as investigações sobre o mensalão.

Cachoeira é mais um entre tantos personagens nocivos da vida nacional que orbitam em torno do poder público, fruto das deformações da política brasileira. Por um paradeiro na ação desses elementos passa necessariamente por profundas mudanças nas práticas públicas, nas quais os conchavos de bastidores acabam se sobrepondo ao interesse público. A CPMI para investigar Cachoeira, suas atividades clandestinas e relacionamentos seria uma boa oportunidade para o Congresso caminhar no sentido do resgate da ética na política, algo difícil que ocorra diante dos envolvimentos e comprometimentos em jogo.

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