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Jozélia Nogueira assumiu a Secretaria de Estado da Fazenda, em outubro do ano passado, com uma batata quente nas mãos. A então procuradora-geral do estado recebeu a chave de um cofre que passava por inúmeras dificuldades e passou a se esforçar para não deixar as contas do estado chegarem ao caos completo. Mas, na segunda-feira passada, Jozélia pediu demissão do cargo. A trajetória da ex-secretária da Fazenda dá a ideia da dificuldade e dos dilemas pelas quais passa um governo com os problemas de caixa que afligem o Executivo paranaense.

A situação atual dos cofres paranaenses foi construída ao longo de vários anos e governos; uma caça às bruxas neste momento é inútil – não só porque não existe apenas um responsável, mas também porque pouco ajudaria a resolver a questão. O que pode ajudar a compreender as dificuldades atuais é analisar alguns acontecimentos e tendências que envolvem a gestão dos recursos do estado.

No centro dos problemas estão dois grandes fatores: o primeiro se refere às dificuldades no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. O estado jamais ultrapassou o limite de gastos com a folha de pagamento, que corresponde a 49% da receita corrente líquida – entes federativos que ultrapassam esse patamar ficam, por exemplo, impedidos de contrair empréstimos. No entanto, em novembro de 2013, a Gazeta do Povo já havia publicado reportagem mostrando que, dos oito primeiros quadrimestres da gestão de Beto Richa, em cinco deles o governo havia superado o limite prudencial de gastos com funcionalismo, que é de 46,55%. Jozélia conseguiu baixar o porcentual de gastos com a folha de 48,81% para 47,23%.

Além disso, o governo paranaense sofreu com grandes obstáculos para a aprovação de empréstimos. O caso mais emblemático é o do Programa de Apoio ao Investimento dos Estados e do Distrito Federal (Proinveste), do Banco do Brasil. O Paraná tinha direito a uma linha de crédito de R$ 817 milhões e, em fevereiro de 2014, era o único estado a ainda não ter recebido os recursos do programa. A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) vinha relutando em permitir o depósito desse dinheiro nas contas do Paraná, e foi preciso que o Supremo Tribunal Federal interviesse, por meio de liminar do ministro Marco Aurélio Mello, para que o Paraná recebesse os recursos. Depois disso, outros empréstimos de menor valor foram liberados, embora ainda haja crédito para ser destravado, como o R$ 1,35 bilhão do Credit Suisse (que ainda está esperando aval do STN). A demora na liberação dos empréstimos levou a acusações de que o estado sofria retaliação política por parte do governo federal, pois créditos semelhantes solicitados por outros estados eram aprovados com relativa facilidade.

Numa situação dessas, em que há diversos compromissos financeiros a cumprir, alguns dos quais inadiáveis, e o gestor conta com recursos que acabam não vindo, torna-se absurdamente difícil decidir o que fazer. O cenário acaba agravado pela aproximação da disputa eleitoral, pois há o grande risco de que o pleito contamine as relações entre União e estado para gerar dividendos eleitorais. Impõem-se diversos dilemas. A austeridade é a opção mais adequada nessa situação? E que grau de austeridade? Por quem decidir, em um cenário de várias demandas e recursos escassos? Qual o risco de o futuro concorrente explorar eleitoralmente uma escolha mal feita? Não existem respostas simples para essas questões, especialmente quando se considera que por trás das cifras estão cidadãos que podem ficar sem pagamento ou sem os serviços de que tanto necessitam.

São tempos difíceis para as finanças do Paraná, causados por uma série de decisões erradas, tomadas ao longo de vários e vários mandatos por todo tipo de razão: cálculo político-eleitoral, imprudência fiscal, prioridade no imediato sem atenção ao futuro, falta de planejamento. Isso aumenta ainda mais a responsabilidade do sucessor de Jozélia, Luiz Eduardo Sebastiani, e do governador Beto Richa. Que eles tenham a prudência e a sabedoria necessárias para lidar com as pressões e levar as contas do estado de volta a patamares que permitam ao gestor administrá-las sem a sensação de estar diariamente com uma espada pendendo sobre sua cabeça.

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