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| Foto: Andressa Anholete/AFP

Michel Temer assumiu a Presidência da República com a promessa de enxugar a inchada máquina administrativa federal. Apesar de recaídas como a extinção e posterior “ressurreição” do Ministério da Cultura, após críticas e pressões de setores que nem mesmo consideravam Temer um governante legítimo, a Esplanada vinha encolhendo. Mas, na semana passada, o presidente decidiu reverter o curso e anunciou a criação de duas pastas. O Ministério dos Direitos Humanos, que o próprio Temer tinha transformado em secretaria, será comandado pela ex-desembargadora Luislinda Valois. Até aí, há de se criticar apenas o fato de a prática desmentir o discurso de um governo mais enxuto.

Muito, mas muito pior foi a recriação da Secretaria-Geral da Presidência, que tinha sido extinta por Dilma Rousseff no fim de 2015 e teve suas atribuições assumidas pela Secretaria de Governo. Não tanto pela pasta em si, mas pelo escolhido por Temer para chefiá-la e, com isso, ganhar foro privilegiado: Moreira Franco, o “Angorá” da delação vazada de Cláudio Melo Filho, executivo da Odebrecht. Membro do “núcleo duro” mais próximo a Temer, formado também por Eliseu Padilha e Geddel Vieira Lima, Franco foi citado como arrecadador de recursos para o PMDB e interlocutor de interesses da empreiteira, embora a delação não associe valores específicos ao agora ministro. Com a homologação desta e de dezenas de outras colaborações premiadas da Odebrecht, Moreira Franco estaria no alvo da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e do juiz Sergio Moro. Agora, a investigação fica com a Procuradoria-Geral da República, que tem sido bem mais lenta.

Com esse círculo próximo de colaboradores, Temer coloca em risco sua autoridade moral

Não se trata de manobra inédita. Os paranaenses já a conhecem muito bem desde 2013, quando o governador Beto Richa transformou Ezequias Moreira, o pivô do caso da “sogra fantasma”, em secretário especial de Cerimonial e Relações Internacionais dias antes de uma audiência na qual poderia sair a sentença de Ezequias no processo penal a que respondia – e que, com a nomeação, foi remetido ao Tribunal de Justiça, onde está até hoje sem definição. E o Brasil inteiro se indignou quando, em março do ano passado, a presidente Dilma Rousseff tentou fazer do ex-presidente Lula seu ministro-chefe da Casa Civil. Houve posse e festa, mas também houve povo nas ruas. Uma liminar do ministro do STF Gilmar Mendes suspendeu o descalabro, e o impeachment de Dilma enterrou o caso definitivamente.

O paralelo não passou despercebido ao governo. Padilha, ministro-chefe da Casa Civil e o “Primo” na delação de Cláudio Melo Filho, disse que as situações são diferentes, porque Moreira Franco já estava no governo antes de ser nomeado ministro, mas Lula não. Padilha poderia até ter dito que Lula já era investigado quando Dilma o nomeou, ao contrário de Moreira Franco. Tudo isso é verdade, mas aqui estamos diante de um caso de “diferente, mas igual”. O fato é que Moreira Franco ganhou foro privilegiado quando estava prestes a se tornar alvo de investigação. Apenas isso já basta para lançar uma sombra de dúvida sobre as intenções presidenciais – não do ponto de vista legal, pois há de se respeitar a presunção de inocência, mas do ponto de vista moral.

Em ocasiões anteriores, já afirmamos que, com esse círculo próximo de colaboradores, Temer coloca em risco sua autoridade moral para conduzir as reformas de que o país precisa para vencer a recessão e o desemprego. Geddel só caiu – na verdade, pediu para sair – quando sua situação se tornou totalmente insustentável, mas bem antes disso já estavam reunidas as condições para Temer removê-lo do cargo de ministro da Secretaria de Governo. Ao promover Moreira Franco, ele mostra que não aprendeu a lição. E, por isso, pagará com mais desgaste diante de uma opinião pública cansada da falta de lisura na administração pública.

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