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Sistemas de energia solar representam a maior parte das unidades de Geração Distribuída no Brasil.
Sistemas de energia solar representam a maior parte das unidades de Geração Distribuída no Brasil.| Foto: Pixabay

“Ninguém mais toca no assunto. Quem conversar eu demito, cartão vermelho”, afirmou o presidente Jair Bolsonaro sobre a intenção da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de promover uma reviravolta nas regras para a geração distribuída de energias alternativas, como a de minigeradoras hidráulicas ou a energia solar – esta última deu origem, inclusive, à expressão “taxar o sol”, popularizada pelos que discordaram da proposta da agência. Arroubos presidenciais à parte, é fato que a discussão se encaminhava para um desfecho que poderia mesmo inviabilizar um setor ainda incipiente no Brasil, mas cuja importância é fundamental.

No modelo atual, estabelecido pela Resolução 482/12 da Aneel, indivíduos e empresas que geram a própria energia, por exemplo por meio de painéis solares (embora esta não seja a única modalidade contemplada), podem lançar o excedente de sua produção na rede, recebendo de volta um crédito integral para os momentos em que sua geração é inferior ao consumo da unidade. Esses produtores-consumidores (que, no jargão do setor, são chamados de “prossumidores”) também acabam dispensados de pagar certos encargos, como os relativos ao uso das redes de distribuição – um custo que acaba diluído entre todos os demais consumidores de energia.

O incentivo a um mercado ambientalmente responsável e com potencial de gerar emprego e renda é uma opção legítima do governo

A revisão deste modelo tomou dois anos, e para muitos dos envolvidos existe uma razoabilidade em remunerar as distribuidoras pelo uso da sua estrutura, desde que feita a diferenciação entre redes de baixa tensão (aquela que vemos nas ruas) e de alta tensão (caso das grandes torres de energia que, por exemplo, ligam usinas a estações de distribuição). Para isso, seria preciso levar em conta o efetivo uso feito pelos produtores-consumidores – uma residência simples, por exemplo, não usa a rede de alta tensão para lançar seus excedentes, nem para consumir energia quando produz menos que o necessário. As conversas vinham prosperando até outubro do ano passado, quando a Aneel passou a defender uma solução radical que cortava em dois terços os incentivos à geração distribuída e impunha um cronograma curto (considerando os padrões do setor) para que todos passassem a seguir as novas regras. Foi quando ganhou força o slogan sobre “taxar o sol”, que estaria fazendo Bolsonaro “pagar o pato”, em suas próprias palavras.

A discussão respingou em Bolsonaro porque a Aneel – que tem autonomia em relação ao governo – tinha o apoio do Ministério da Economia para impor o modelo que teria sérias consequências sobre o setor da geração distribuída. Este apoio se baseava em uma aplicação equivocada de um princípio liberal, o de combate aos subsídios. De fato, hoje a geração distribuída conta com um incentivo e deixa de ter certos gastos que acabam distribuídos entre o restante dos consumidores de energia. É razoável que, à medida que o setor se consolide e os custos para a implantação desses sistemas caiam, os subsídios também sejam removidos. O erro, no caso específico, estava na intensidade e na velocidade desse processo, que seria abrupto em vez de gradual. Ao contrário de outros subsídios, que introduzem distorções sérias em mercados maduros, o incentivo à geração distribuída é uma opção legítima de governo que tem o objetivo de popularizar alternativas energéticas sustentáveis.

Seja pelo impacto ambiental, seja pelo potencial de gerar emprego e renda, é preciso oferecer condições para que o mercado de energia alternativa renovável possa crescer no país. O investidor não pode ser surpreendido com mudanças radicais no marco regulatório e que reforçam a tradicional insegurança que marca o ambiente de negócios no Brasil. Não se trata, por certo, de manter incentivos de forma indefinida, congelando as regras atuais, mas de revisá-los de forma razoável, buscando o máximo possível de consenso e implantando as novidades gradualmente. Trazendo os interessados de volta à mesa de negociação, tendo em vista a próxima reunião da Aneel, no dia 21, é possível retomar o caminho que vinha sendo traçado anteriormente e chegar a uma solução razoável para todos os lados.

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