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Leitos vazios em Curitiba em 22 de março de 2022, primeiro dia em que a cidade não teve nenhuma internação por Covid-19.
Leitos vazios em Curitiba em 22 de março de 2022, primeiro dia em que a cidade não teve nenhuma internação por Covid-19.| Foto: Reprodução Facebook

Em linha com outras nações, como França e Reino Unido, o Brasil está formalmente deixando para trás o estado excepcional motivado pela pandemia de Covid-19. Em cadeia nacional de rádio e televisão, na noite de domingo, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que encerrará a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional. A medida, que ainda depende de publicação em Diário Oficial, forçará uma revisão massiva de normas de toda natureza – principalmente regras sanitárias, econômicas e trabalhistas – publicadas durante a pandemia, muitas das quais só puderam ser editadas por se tratar de uma situação extraordinária, como dispensas de licitação. Especialmente no campo sanitário, o fundamental é que a transição para o pós-pandemia ocorra de forma gradual para que não seja necessário regredir mais adiante.

Globalmente, é claro, a pandemia continua; muitos países ainda têm cobertura vacinal deficiente ou convivem com surtos intensos da Covid-19 – caso da China, que agora vai descobrindo as falhas de sua política de “Covid zero”. Mas, no caso brasileiro, os indicadores de população vacinada, mortes e ocupação de leitos dão margem para o fim da emergência sanitária. Diversas regras já vinham sendo revistas ao longo das últimas semanas, caso do uso de máscaras, da ocupação máxima em locais fechados e de exigências para entrada no Brasil. Estados como o Paraná aprovaram leis proibindo a imposição de passaportes vacinais. A flexibilização feita até o momento não trouxe novos surtos, mostrando que a estratégia de mudar aos poucos enquanto se mantém atenção aos números de contágio tem sido bem-sucedida, e não pode ser trocada por um “liberou geral” súbito apenas porque o “status formal” da Covid-19 no Brasil foi alterado.

O respeito por tantas vidas e famílias destruídas pede que o fim da emergência sanitária seja recebido mais com serenidade que com festa

“A Covid não acabou e nem vai acabar, pelo menos nos próximos tempos”, afirmou o ministro Queiroga, e ter isso em mente é essencial. A doença seguirá circulando; ainda que novas variantes sejam menos agressivas para a população em geral, continuará a haver grupos mais vulneráveis à doença e que justificam precaução no mínimo semelhante àquela que os brasileiros já adotam em relação a outros males como a gripe ou a dengue. Comportamentos que se tornaram obrigatórios durante a pandemia, especialmente em relação à higiene, continuarão fazendo sentido mesmo quando tornados facultativos, e não deixarão de ser recomendáveis.

Especialmente importante para manter a Covid sob controle é o esforço de vacinação; espera-se que, com o passar dos anos, a indústria farmacêutica aperfeiçoe seus imunizantes, que haja mais transparência quanto a eventuais efeitos colaterais, e que a população não abandone a prática; surtos recentes de doenças como sarampo mostram o que ocorre em uma comunidade quando há uma redução da cobertura vacinal. A vacinação permitiu ao Brasil deixar para trás o pior da Covid e passar pela onda da variante ômicron sem repetir os dias de hospitais sobrecarregados e os vários milhares de mortes notificadas diariamente, apesar dos números recordes de novos casos.

E, enquanto o Brasil retorna gradualmente ao cotidiano pré-Covid, é preciso também aprender com todos os erros cometidos neste período. Alguns deles já são evidentes: a insensibilidade com o drama de tantos brasileiros, o desprezo inicial pelas vacinas, restrições econômicas exageradas e arbitrárias, violações a liberdades democráticas, o descaso com tantas crianças e adolescentes privados de educação. Em outros casos, só a passagem do tempo e o surgimento de dados consolidados permitirá avaliar o acerto ou erro de determinadas decisões. E talvez nunca saibamos ao certo quem agiu – seja errando, seja acertando – movido por um profundo desejo de fazer a coisa certa e quem submeteu suas escolhas mais à agenda política ou moral preferida que à consideração pela saúde coletiva.

Dois anos de um “novo normal” que de normal não tem nada e 660 mil mortes não serão jamais esquecidos pelo país. O respeito por tantas vidas e famílias destruídas pede que o fim da emergência sanitária seja recebido mais com serenidade que com festa. Cuidado e reflexão são as palavras de ordem para o momento.

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