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Depois que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná aprovou uma gratificação para magistrados por “acúmulo de jurisdição, funções administrativas ou acervo processual” (por exemplo, para juízes responsáveis por mais de uma vara) e que pode chegar a até um terço do salário, o texto foi enviado à Assembleia Legislativa na forma de projeto de lei, que precisa ser aprovado para que o bônus comece a aparecer nos contracheques dos magistrados. O envio do texto à Assembleia serviu para que algumas dúvidas fossem dirimidas. Agora, sabe-se que a soma do salário e da gratificação não pode ultrapassar o teto do Judiciário paranaense, que hoje é de R$ 30.471,11 – antes disso, havia dúvidas sobre a possibilidade de o teto adotado ser o constitucional, de R$ 33,7 mil, correspondente ao salário de um ministro do STF.

E, mal chegou ao Legislativo paranaense, o projeto já ganhou um bom impulso para sua aprovação, pois os deputados determinaram que o texto tramite em regime de urgência, graças a requerimento do líder do governo, Luiz Claudio Romanelli (PSB). O projeto estaria na pauta da reunião extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça de quarta-feira passada, mas ela foi cancelada e remarcada para esta segunda-feira devido ao falecimento do secretário especial e ex-deputado federal Luciano Pizzatto. Os argumentos que Romanelli usou para pedir pressa na tramitação, no entanto, seriam mais adequados para justificar que ela ocorresse no ritmo normal, com o devido debate com a sociedade.

Não é de “interesse público” ver representantes eleitos aprovando às pressas uma gratificação sem discussão com a sociedade

A matéria “é de interesse público e incide em repercussão para a coletividade”, escreveu Romanelli no requerimento. De fato: há uma “repercussão para a coletividade” na forma de um gasto adicional de R$ 1,5 milhão em 2018, R$ 2,1 milhões em 2019 e R$ 2,2 milhões em 2020, segundo esclarecimentos prestados pelo próprio presidente do TJ-PR, desembargador Renato Bettega, em documento anexo ao texto do projeto de lei. Ainda que se argumente que os recursos existem nos cofres do Judiciário (resultado de uma dotação obrigatória legal pela qual compete ao Judiciário uma porcentagem fixa da receita corrente do estado, em vez de uma verba nominal compatível com as previsões de gastos – uma outra discussão que terá de ser enfrentada mais cedo ou mais tarde), é dinheiro do contribuinte paranaense tanto quanto aquele que banca os gastos do Executivo ou do Legislativo. E que esse dinheiro seja gasto racionalmente é de sumo “interesse público”: se o Judiciário está com verba sobrando, certamente ela poderia ter usos bem mais relevantes e benéficos a toda a coletividade.

Leia também: As vias tortas da gratificação (editorial de 18 de março de 2018)

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O que não é de “interesse público” é ver seus representantes eleitos aprovando às pressas uma gratificação sem discussão com a sociedade, ainda mais quando o verdadeiro motivo para o pagamento do bônus pouco ou nada tem a ver com sua justificativa “oficial”. Os próprios desembargadores admitem que, assim como o auxílio-moradia, a gratificação é uma maneira de compensar perdas inflacionárias decorrentes da ausência de reajustes no salário da magistratura; só isso já bastaria para que o tema fosse analisado na Assembleia com toda a prudência, para que não se consagre em lei um ato juridicamente viciado.

O Legislativo não pode simplesmente se curvar sem questionamentos a setores do Judiciário interessados na manutenção ou na ampliação de benefícios duvidosos. Especialmente nesta época de aperto fiscal generalizado (mas também em épocas mais tranquilas), os representantes eleitos da população têm a missão de garantir, dentro de suas atribuições, que o dinheiro oriundo do contribuinte paranaense seja bem utilizado. A urgência na tramitação do projeto de lei que institui a gratificação não é de interesse da sociedade.

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