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Reportagem da Gazeta na semana passada versou sobre o aumento do número de presos com curso universitário e um dos professores entrevistados diz que a "relação entre escolaridade e criminalidade é um paradoxo (...) dado que se deposita tanta fé no poder da educação". A crença no potencial da educação é de para-choque de caminhão (atualmente Facebook): giz é mais barato que bala; escola custa menos que cadeia. A fé nesse poder é tão intensa que se assimila religião à educação. Aquela conduz a pessoa do pecado original à pureza celestial; essa, da ignorância à sapiência. O sentido de progresso moral em ambas leva a imaginar que o paraíso será aqui – quando todos estudarem.

Da pessoa estudada se espera que as luzes da racionalidade a façam entender que o crime gera sofrimento para as vítimas e impede o desenvolvimento social. No senso comum, o "doutor" atua para melhorar a vida de todos. A frustração da expectativa de que alguém instruído fique longe do crime gera desalento porque rompe a confiança na racionalidade e deixa nua a cruel natureza humana. A educação não transforma o Canis lupus em Canis familiaris, o lobo em labrador. Por isso, as escolas não bastam para alcançar vida pacífica. As cadeias também são necessárias.

Pessoas de bem que agem de modo imoral causam mais indignação que as notoriamente maldosas. Isso ocorre nas situações de corrupção, que têm a mesma força entristecedora porque o corruptor não precisa da vantagem que almeja ao romper a integridade moral do corrompido. O motorista que propõe dinheiro ao policial para se livrar da multa não está passando fome; idem quando o guarda pede a propina. O político que faz falcatruas nas compras públicas ou distribui cargos para parentes não carece desses ganhos para sobreviver. O móbil da atitude é ganância, vontade de ter mais, muito mais.

O faminto que furtivamente subtrai alimentos para saciar a fome; o náufrago que puxa para si a boia; o subordinado que cumpre ordens legais; o agredido que se defende. Em todas essas situações a violência não rompe a integridade moral. A conduta é justa na escolha entre o valor que deve prevalecer naquele momento. Na dinâmica da vida, raramente uma dessas justificativas se apresenta pura, limpa. As situações reais são cheias de nuances, de pontos de luz e sombra. Contudo, o julgamento que fazemos ao deparar com tais condutas é por aproximação e os universitários criminosos e políticos corruptos estão muito longe da fome, do desespero. As circunstâncias de conforto material e espiritual em que se encontram tornam absolutamente repugnantes os seus atos imorais.

O ceticismo ante o que é humano não obsta otimismo na ação contra a cultura que atribui a responsabilidade pela prática do crime à sociedade, ao capitalismo, ao Ocidente, à formação judaico-cristã. A qualquer coisa, menos à fraqueza de caráter do criminoso. É imperioso dizer não! Porém, a reprovação não deve ser exclusivamente jurídica, vinda do aparelho público. A rejeição social ao crime, à corrupção, tem mais efeito que a sentença judicial. Se os parentes, amigos, vizinhos, o círculo de relações afetivas repudia condutas desviantes, o indivíduo pensa mil vezes.

Não permitir que os lobos mordam impunemente nos distingue das alcateias.

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