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O assunto do momento é o fuzilamento, na Indonésia, de um cidadão brasileiro, por tráfico de drogas. As autoridades daquele país foram insensíveis aos pedidos de clemência até mesmo da presidente Dilma Rousseff.

Segundo uma delas, a intransigência serve para mandar um recado duro ao cartel internacional de drogas.

O brasileiro, desacostumado, estranha. Mas reage, em sua maioria, na linha da já tradicional guerra às drogas. "Ele sabia do risco" e, portanto, deve aceitar seu destino. Afinal, "muitas famílias seriam até mesmo destruídas pela cocaína que ele carregava!"

O tema comporta várias abordagens. Mas é forçoso concluir que nenhuma das atitudes acima vai resultar em qualquer benefício.

Um traficante e 13 kg de cocaína a mais ou a menos não fará falta alguma ao cartel das drogas. Seus chefões, para quem a vida humana (dos outros) não possui o menor valor, provavelmente estão rindo da frase.

Por outro lado, absolutamente nenhum usuário de cocaína indonésio (ou do mundo!) deixará de consumir um único miligrama a menos (de cocaína ou, a propósito, de qualquer outra droga ilegal), não importa quantos traficantes forem presos, ou executados.

Ele as encontra sempre e quando quiser.

Queira-se ou não, mate-se os traficantes ou não, hoje se sabe sem a menor dúvida que a "guerra às drogas", política iniciada nos anos 80 nos EUA, é o mais longo, caro, absoluto e retumbante fracasso de toda a história humana. O renomado financista George Soros apelidou-a de "o fiasco de um trilhão de dólares".

Um dos principais componentes desse desastre é a violência, corolário necessário da ilegalidade à qual algumas drogas, ao contrário de outras tão ou mais prejudiciais, foram relegadas.

Isso nos traz ao Brasil, e ao papel das drogas como um dos principais componentes de sua violência endêmica.

Três grandes gargalos estruturais se colocam no caminho de um equacionamento dessa aflitiva questão. A desigualdade elitista e racista, que empurra jovens pobres ao crime, um modelo policial arcaico e ineficaz, que cultua e pratica a violência, ao invés de combatê-la, e o tráfico de drogas, que está por trás de cerca de 75% de todos os crimes que por aqui se cometem.

O primeiro vem sendo enfrentado, ainda que a duras penas, e confrontando obstinada e feroz resistência dos seus seculares beneficiários. Mas não basta. Há de se cuidar dos demais.

Porém, nada se vê no horizonte, mesmo no longo prazo, que sinalize a possibilidade de mudança da posição majoritária da sociedade brasileira em favor da guerra às drogas. Tampouco se coloca na sua agenda imediata a necessária e radical reformulação de nossas polícias.

Ora, como há muito já se sabe, não se pode colher melancias quando se plantam maçãs.

Ações iguais jamais geram resultados diferentes.

Enquanto insistir em apoiar – como tem feito – uma guerra que já vai para quatro décadas sem apresentar qualquer resultado positivo, mas apenas fracassos; e, por outro lado, em ignorar o círculo vicioso de violência do qual nossa polícia não apenas participa, mas fomenta – como também tem feito –, o brasileiro, embora sinta-se feliz consigo mesmo e reclame dos outros, está pronunciando contra si próprio uma sentença que determina que tudo fique exatamente como está.

Ou piore.

Marcelo Jugend, advogado, foi chefe de gabinete e assessor especial da Sesp e secretário municipal de Segurança de São José dos Pinhais. É autor de A morte do Super-Homem – propostas para o enfrentamento democrático da violência e da criminalidade.

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