• Carregando...

Um magistrado digno do nome poderia muito bem absolver um acusado, desde que estivesse baseado em motivos sólidos para tal. Mas, na quinta-feira, Ricardo Lewandowski mais parecia o advogado de defesa de José Dirceu

O esperado julgamento do ex-ministro José Dirceu, apontado como o mandante do esquema do mensalão, e do ex-presidente do PT José Genoíno foi interrompido na última quinta-feira. Por ora, o placar aponta três votos pela condenação dos dois réus e um pela absolvição. Na sessão de quinta, não deixou de chamar atenção a postura do ministro Ricardo Lewandowski ao decidir pela inocência de Dirceu.

Em outra ocasião, neste mesmo espaço, afirmamos que o julgamento do mensalão revelaria se o ministro Dias Toffoli – que ainda não deu seu veredicto sobre Dirceu e Genoíno – era um magistrado de verdade ou um militante partidário infiltrado no STF. O mesmo raciocínio vale para Lewandowski e qualquer um dos outros oito ministros que participam do julgamento. O critério não seria a mera decisão de punir ou absolver, mas a argumentação usada. Um magistrado digno do nome poderia muito bem absolver um acusado, desde que estivesse baseado em motivos sólidos para tal. Mas, na quinta-feira, Lewandowski mais parecia o advogado de defesa de Dirceu, fazendo uso de uma rebuscada retórica argumentativa para justificar sua posição pró-absolvição.

Para tanto, qualificou a denúncia do procurador-geral da República como um punhado de ilações sem suporte probatório, sustentada no depoimento do ex-deputado Roberto Jefferson, um "inimigo figadal" do petista. Em contrapartida, referiu-se a "torrenciais" provas testemunhais em defesa de Dirceu, imputando toda a responsabilidade sobre a distribuição de dinheiro aos partidos aliados ao tesoureiro do PT, Delúbio Soares. O problema na torrente de testemunhos favoráveis a Dirceu é que, na maioria, foram prestados por petistas de carteirinha, o que para Lewandowski não foi suficiente para invalidá-los, como se fosse possível imaginar que algum "companheiro" complicasse a vida do outrora todo-poderoso ministro-chefe da Casa Civil.

A enfática posição do ministro revisor do processo do mensalão, entretanto, até agora não encontrou eco nos pares que já declinaram seus votos. Tanto Rosa Weber como Luiz Fux acompanharam integralmente o parecer do relator, Joaquim Barbosa, pela condenação de Dirceu e Genoíno. Para ambos, as provas existentes nos autos são mais que suficientes para atestar o envolvimento direto do ex-ministro da Casa Civil em toda a trama para comprar apoio parlamentar no primeiro governo Lula. Foram ainda mais longe os dois ministros, considerando como inverossímeis os argumentos expostos pelas defesas dos acusados.

Na próxima terça-feira irão se pronunciar os seis ministros que ainda não votaram; o destino de José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e outros acusados de corrupção ativa será inexoravelmente decidido. Pelo andar da carruagem, a expectativa é de que ocorra a condenação dos réus do mensalão por maioria de votos. Desde já fica a dúvida quanto à posição a ser tomada justamente pelo ministro Dias Toffoli, um dos únicos que podem acompanhar Lewandowski na absolvição de José Dirceu. Como se recorda, antes de ser guindado à posição de ministro do Supremo, Toffoli foi advogado de Lula, trabalhou com Dirceu na Casa Civil e ocupou a chefia da Advocacia-Geral da União no governo do PT. Apesar das suas estreitas ligações no passado com a cúpula petista, o ministro não se considerou impedido de participar do julgamento dos envolvidos no mensalão.

Questionamentos à parte a respeito da posição de Lewandowski em benefício de Dirceu e de como votará Toffoli na terça-feira, o STF vem cumprindo à altura seu papel. A começar pela negativa da maioria em aceitar a tese repetida reiteradas vezes pelos mensaleiros de que nunca houve dinheiro para comprar parlamentares e sim recursos de campanha não contabilizados. Como se dessa forma tudo se resolvesse e a prática de caixa dois fosse um expediente tolerado por supostamente ser praticado por todos os partidos. Esperamos que a punição exemplar dos réus do mensalão, com base na materialidade das provas dos autos, seja o ponto de partida para um novo patamar ético na política brasileira, onde conchavos e acordos espúrios virem coisa do passado.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]