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Sede do STJ, em Brasília
Sede do STJ, em Brasília| Foto: Divulgação/STJ

O principal inquérito da Operação Quadro Negro deverá ser enviado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília, saindo do guarda-chuva do primeiro grau da Justiça Estadual. De posse do inquérito, o STJ vai analisar se o juiz de primeiro grau responsável pelos processos da Operação Quadro Negro tinha competência para fatiar a investigação – em 2019, parte ficou em Curitiba, na Justiça Estadual, e parte foi enviada ao próprio STJ, já que um dos nomes que aparece na investigação é do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) Durval Amaral, que detém foro especial por prerrogativa de função no STJ.

O envio do inquérito principal a Brasília é uma determinação do ministro Raul Araújo, do STJ, que atendeu a um pedido da defesa do ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB), no âmbito de uma Reclamação (Rcl 38602). O ministro assinou a decisão no final de junho, mas ela só foi publicada nesta segunda-feira (3).

A defesa de Richa alegou que Durval Amaral detém foro especial por prerrogativa de função no STJ, por ocupar a cadeira de conselheiro do TCE, e que caberia ao próprio STJ, e não ao juiz de primeiro grau, decidir sobre eventual desmembramento da investigação – ou seja, o fatiamento do inquérito a partir do foro privilegiado dos investigados.

"Em que pese o reclamante [Beto Richa] não ser detentor de prerrogativa de julgamento perante o Superior Tribunal de Justiça, uma vez que já não mais ocupa o cargo de governador, caberia a esta Corte decidir se há ou não razão para manter unificada a investigação", escreve Raul Araújo.

Beto Richa já se tornou réu em ações penais derivadas do inquérito principal da Operação Quadro Negro, deflagrada em 2015 e que se tornou um dos maiores escândalos de corrupção envolvendo o seu segundo mandato no Palácio Iguaçu. O tucano rejeita os crimes apontados nas denúncias do Ministério Público do Estado do Paraná (MP-PR).

Na narrativa do MP, Beto Richa seria o maior beneficiário de um esquema de desvio de dinheiro público a partir de contratos feitos entre a secretaria estadual da Educação e empresas responsáveis por obras de construção e reforma de escolas. As acusações são de corrupção passiva, prorrogação indevida de contrato de licitação, organização criminosa e obstrução de justiça.

As ações penais tramitam na 9ª Vara Criminal de Curitiba, da Justiça Estadual, e já passaram por dezenas de situações – um dos questionamentos, por exemplo, foi sobre se os processos deveriam tramitar na Justiça Comum ou na Justiça Eleitoral.

Impacto em ações penais será analisado no futuro

Na recente decisão do STJ, embora o ministro Raul Araújo concorde em analisar se o fatiamento do inquérito foi devido ou não, não houve decisão para anular as ações penais derivadas do inquérito e que já estão em andamento.

“O caso é, portanto, de procedência da Reclamação, mas apenas para reconhecer a usurpação da competência do Superior Tribunal de Justiça, quanto ao desmembramento da investigação, levado a efeito pelo Juízo reclamado, sem, no entanto, decidir acerca de eventual nulidade dos atos processuais praticados pelo Juízo reclamado”, observa ele, em 30 de junho último.

“Julga-se parcialmente procedente a Reclamação, para determinar a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, para a apreciação da questão do desmembramento ou não da investigação, sem anular os atos praticados perante e pelo o Juízo reclamado, os quais ficarão sujeitos a futura apreciação por parte desta Corte Superior”, decide o ministro.

Em entrevista à Gazeta do Povo nesta segunda-feira (3), o promotor de Justiça Denilson Soares de Almeida, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do MP, lamentou a decisão do STJ e informou que não está descartada a possibilidade de recurso. “A impressão que passa é que [Beto Richa] não quer ser julgado. Ficam apenas nesta defesa processual. A situação [que gerou a Reclamação no STJ] envolve outra pessoa [Durval Amaral], que não contestou a decisão do fatiamento”, afirma ele.

Durval Amaral

O nome do conselheiro do TCE Durval Amaral apareceu na Operação Quadro Negro através de relatos de investigados que firmaram acordo de colaboração premiada com o MP. Delatores falam que ele teria recebido parte do dinheiro desviado dos cofres públicos para abastecer a campanha eleitoral de 2014 do seu filho Tiago Amaral (PSB), eleito deputado estadual naquele ano. Durval Amaral também teria agido no TCE para tentar dar aspecto de legalidade ao fato de a empresa Valor Construtora não ter concluído obras previstas em contrato, mesmo tendo recebido verba pública para fazer o serviço contratado.

Ambos rejeitam os relatos, mas os elementos colhidos na investigação serviram de base para a abertura de um inquérito no STJ em abril de 2017. Em novembro daquele mesmo ano, contudo, o caso foi transferido para o Supremo Tribunal Federal (STF), já que a Operação Quadro Negro havia atingido outra autoridade com foro privilegiado, o então deputado federal Valdir Rossoni (PSDB).

Mas, no início de 2019, na esteira de uma decisão do STF que modificou o entendimento sobre foro privilegiado, reduzindo seu alcance, toda a investigação da Operação Quadro Negro foi "baixada": saiu do STF e migrou para o primeiro grau da Justiça Estadual.

A defesa de Durval Amaral chegou a questionar o ministro Luiz Fux, que ficou com a relatoria do caso no STF, sobre qual seria o destino do seu inquérito, se voltaria ou não ao STJ. Mas Fux deixou isso a cargo do juiz de primeiro grau, que, ao assumir todos os processos, encaminhou a parte de Durval Amaral para o STJ – decisão que, agora, gerou o despacho do ministro do STJ Raul Araújo.

Como se trata de uma investigação sigilosa no STJ, a Gazeta do Povo não tem acesso ao andamento do caso. Em nota encaminhada à Gazeta do Povo nesta segunda-feira (3), Durval Amaral escreve que “o assunto encontra-se devidamente esclarecido, já tendo sido reconhecido oficialmente o não envolvimento de nosso nome em qualquer procedimento irregular”. “Não há, portanto, mais nada a declarar a respeito deste episódio”, finaliza ele, sem dar detalhes.

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