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Estrada do Colono, no Parque Nacional do Iguaçu
Imagem de 2013 mostra como a vegetação já havia tomado a Estrada do Colono, que voltou a ser alvo de discussão em Brasília.| Foto: Christian Rizzi/Arquivo/Gazeta do Povo

Parlamentares da bancada paranaense na Câmara dos Deputados e no Senado Federal encamparam duas propostas que, se aprovadas, poderão causar a redução de áreas naturais em dois parques nacionais localizados no estado: o do Iguaçu, na Região Oeste, e o dos Campos Gerais, entre os municípios de Castro, Carambeí e Ponta Grossa.

No Parque Nacional do Iguaçu, onde estão as Cataratas, a ideia, mais uma vez, é reabrir a Estrada do Colono, fechada por decisão judicial em 2003. A via de 17,6 km que rasgava uma área de mata dentro do parque ligava os municípios de Serranópolis do Iguaçu a Capanema. Sem a via, os moradores da região precisam contornar o parque, em um trajeto de aproximadamente 180 km.

Como o caminho foi fechado há 16 anos, a floresta já tomou conta de boa parte do antigo trajeto e a reabertura da estrada exigiria derrubada de mata ao longo de 17,6 km dentro do Parque Nacional do Iguaçu.

O responsável pela nova tentativa de reabertura da estrada é o deputado federal Vermelho (PSD), de Foz do Iguaçu. A proposta ecoa o que defendem agricultores, políticos locais, lideranças empresarias e associações civis das regiões Oeste e Sudoeste.

Na justificativa do projeto – que já foi aprovado na Comissão de Viação e Transportes e aguarda análise no colegiado de Meio Ambiente – o deputado afirma que a reabertura da via corrige uma injustiça histórica “e atende ao clamor social de décadas do povo paranaense, resgatando a história e as relações socioeconômicas, ambientais e turísticas da região.”

Em sua defesa do projeto, Vermelho diz ainda que a medida poderia ajudar na preservação da fauna e da flora na região porque "haverá uma compreensão positiva da população acerca do Parque Nacional do Iguaçu, uma vez que um meio ambiente equilibrado serve a todos, mas uma unidade de conservação isolada não cria benefícios à população, tão pouco aumenta a compreensão de sua importância.”

Outras tentativas

A estratégia de Vermelho para fazer prosperar sua ideia é semelhante à do ex-deputado federal Assis do Couto, que também tentou reabrir a estrada via Congresso Nacional. A ideia é alterar a lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza para prever a criação de estradas-parque, uma nova categoria de unidade de conservação que permitiria a construção de uma via, respeitadas as limitações da região.

A proposta legislativa tem o apoio do senador Alvaro Dias (Podemos). Ele chegou a resgatar um projeto com o mesmo objetivo que tramitava no Senado Federal, mas poucos dias depois do requerimento pediu o arquivamento da proposta para apoiar a tramitação do projeto de Vermelho. Em um texto divulgado à imprensa, Alvaro afirmou que o “caminho histórico tem papel importante na integração do homem à natureza por meio do turismo ecológico, na proteção de aspectos histórico-culturais, na promoção da educação ambiental e no desenvolvimento sustentável na região.”

Apesar de Vermelho afirmar que o “povo pugna pela reabertura da estrada”, a medida sofre oposição de ambientalistas e do Ministério Público desde meados da década de 1980. A esse grupo, o senador Alvaro Dias chamou de “fundamentalistas da ecologia”.


A ideia de estrada-parque não entrou na legislação. Isso não pode ser mudado dessa forma. Essa estrada é uma abertura de precedentes perniciosa para a conservação da natureza

Clóvis Borges, diretor executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS)

Clóvis Borges, diretor executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS), é um dos que defende que a medida traria grandes prejuízos ao Parque Nacional do Iguaçu e a outras Unidades de Conservação do país.

“O Sistema Nacional de Unidades de Conservação levou cinco anos sendo discutido e foi um debate amplo. A ideia de estrada-parque não entrou na legislação. Isso não pode ser mudado dessa forma. Essa estrada é uma abertura de precedentes perniciosa para a conservação da natureza”, avalia.

Como a estrada divide o parque em dois, Borges sustenta que, entre outras coisas, ela é uma grave ameaça às onças que vivem na região e são um dos principais ativos do parque. Isso porque esses animais precisam de grandes áreas contíguas de mata.

Outro argumento utilizado pela SPVS para criticar a proposta de Vermelho é o fato de a estrada colocar em risco o reconhecimento do Parque Nacional do Iguaçu como Patrimônio Natural da Humanidade, outorgado pela Unesco. Em 1999, a organização chegou a colocar o Parque em uma lista de patrimônio ameaçado em decorrência de haver constatado potenciais danos pela abertura da estrada.

A Estrada do Colono ensejou debates informais durante o último encontro do Congresso Brasileiro do Ministério Público do Meio Ambiente, realizado no fim de abril, em Curitiba. A ideia do grupo que se opõe ao projeto é pressionar via MP para que a decisão judicial de 2003 seja cumprida. Uma das estratégias é trazer o governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) para o debate para tentar que o governador, atendendo a pedido do MP, demova Vermelho da proposta.


Não se trata de reabrir uma antiga estrada, mas sim, de ser conivente com a derrubada de mais de 170 mil metros quadrados de Mata Atlântica para implantar uma rodovia no interior de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral. [...]
É impressionante a quantidade de vestígios da fauna selvagem no antigo leito da estrada. Muitas das espécies que hoje passam por ali estão ameaçadas de extinção

Ivan Baptiston, engenheiro florestal, analista do ICMBio e responsável pelo Parque Nacional do Iguaçu

A reportagem tentou contato com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Natureza (ICMBio) – responsável pela gestão do parque – e com a direção do Parque Nacional do Iguaçu, entretanto os pedidos de entrevista não foram respondidos.

Quem chefia o Parque hoje é Ivan Baptiston, engenheiro florestal e analista do ICMBio, que está no posto desde 2015. Antes de assumir o cargo ele já trabalhava na região e criticava a reabertura da estrada.

“Não se trata de reabrir uma antiga estrada, mas sim, de ser conivente com a derrubada de mais de 170 mil metros quadrados de Mata Atlântica para implantar uma rodovia no interior de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral. A marca já está cicatrizando. O leito da antiga estrada hoje está coberto por uma formação florestal em regeneração e já conta com espécies raras como palmito, cedro e caneleira, todas nativas, com porte avantajado, pelo rápido crescimento. Também é impressionante a quantidade de vestígios da fauna selvagem no antigo leito da estrada. Muitas das espécies que hoje passam por ali estão ameaçadas de extinção”, afirmou em 2013, conforme registro de uma cartilha produzida pela SPVS.

Parque dos Campos Gerais

Um ofício enviado pela deputada federal Aline Sleutjes (PSL) para o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, poucos dias antes de ele viajar ao Paraná na terça-feira (30) acendeu a discussão sobre a revisão do decreto de 2006 que instituiu o Parque Nacional dos Campos Gerais. Sleutjes, que já foi vereadora de Castro, cidade na região do parque, está em seu primeiro mandato como deputada federal e tem atuado em defesa dos interesses dos produtores rurais da região.

A deputada sustenta que, desde a criação do parque, cerca de 150 famílias foram penalizadas pelas restrições de uso das propriedades e não receberem indenizações por isso. O que ela defende é uma reavaliação desses pagamentos e dos limites do Parque Nacional.


Ninguém quer acabar com o Parque, afinal ele só existe porque foi preservado pelos proprietários destas áreas, apenas solicitamos nova avaliação criteriosa e técnica para harmonizarmos produtores, meio ambiente e sociedade

Aline Sleutjes (PSL-PR), deputada federal

No ofício, a deputada afirmou que a revisão do decreto não traz prejuízos à região porque ela "está totalmente protegida por legislação atual como o Novo Código Florestal e a Lei de Proteção da Mata Atlântica e é fiscalizada pelo aparato do Estado como Ibama, o próprio ICMBio, IAP, Força verde, etc".

“Ninguém quer acabar com o Parque, afinal ele só existe porque foi preservado pelos proprietários destas áreas, apenas solicitamos nova avaliação criteriosa e técnica para harmonizarmos produtores, meio ambiente e sociedade”, disse.

A tese de Sleutjes, que é do mesmo partido do presidente Bolsonaro, foi prontamente acolhida pelo ministro do Meio Ambiente. Em visita a Ponta Grossa para discutir o tema com o setor produtivo local, ele se mostrou disposto a rever do decreto de 2006 e disse que já determinou ao ICMBio que avalie a questão.

“É preciso haver uma responsabilidade muito grande dos entes federativos na constituição de restrições ao direito de propriedade. Quando você cria uma Unidade de Conservação ela imediatamente impacta não só aqueles proprietários que estão circunscritos àquela área onde foi delimitada a Unidade de Conservação, mas também a própria dinâmica da economia nas cidades do entorno de onde foi instituída a Unidade de Conservação”, afirmou Ricardo Salles.

Com 21.298 hectares, o Parque Nacional dos Campos Gerais é a maior área de proteção de floresta de araucária do mundo.

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