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Foto aérea de Curitiba.
Foto aérea de Curitiba.| Foto: Gabriel Rosa/Gazeta do Povo

O que você vai ser quando você crescer? A pergunta corriqueira feita às crianças é mais adequada para os municípios, que têm a obrigação de planejar e regular o uso e ocupação de seus territórios para ter um crescimento ordenado. Curitiba, que está com uma nova Lei de Zoneamento pronta para sair do forno, aguardando a sanção do prefeito Rafael Greca (DEM), pretende ser uma cidade mais diversificada, com lojas e serviços nos miolos residenciais e com mais moradores na região central, justamente onde hoje imperam os estabelecimentos comerciais.

O desenho para a “Curitiba do futuro” foi construído ao longo do último ano em debates, audiências públicas e votações na Câmara Municipal. O texto-base, aprovado em 17 de setembro, foi celebrado pelo setor produtivo, o qual, porém, questionou alguns pontos específicos. No geral, a lei favorece os empreendimentos privados e é considerada um bom complemento para o Plano Diretor vigente desde 2015 – a principal legislação de desenvolvimento urbano local. A Lei de Zoneamento entrará em vigor 180 dias após a assinatura do prefeito.

Na prática, entretanto, o crescimento da cidade depende ainda de outras legislações em trâmite na Câmara de Vereadores. O projeto de lei sobre a concessão de potencial construtivo adicional ao estabelecimento na Lei de Zoneamento é o que mais gera apreensão. Segundo representantes do chamado G10 – grupo de dez entidades do setor privado –, as mudanças propostas pela prefeitura podem onerar muito o custo dos terrenos. Isso porque a Lei de Zoneamento fala em quantidades de coeficiente a serem adquiridas para determinadas construções – isto é, qual o número a ser multiplicado pela área do terreno, para definir qual será a área máxima admitida nesse local. O preço delas só será definido nesse outro projeto.

O texto elenca três possibilidades para aquisição de potencial construtivo adicional (outorga onerosa do direito de construir, transferência do direito de construir e cotas de potencial construtivo), substituindo vários mecanismos vigentes e que, segundo a prefeitura, concorrem entre si. As prioridades, já desenhadas na Lei de Zoneamento, são: incentivar moradias no centro, nas laterais de trechos dos eixos estruturais; promover a implantação de comércio e serviços nas pontas dos eixos estruturantes Norte e Sul e outras vias estruturantes, como a Conectora Leste 3 (na Regional do Portão, envolvendo as ruas Itatiaia, Felinto Bento Vianna e Wenceslau Braz).

Ponto de divergência

O ponto de divergência é que a prefeitura quer usar os mecanismos de potencial construtivo para aumentar a arrecadação municipal. Na mensagem do projeto, o prefeito Rafael Greca afirma que as projeções populacionais indicam estabilização da população de Curitiba em torno de 2 milhões de habitantes, mas com envelhecimento progressivo da média de idade: “Esse novo horizonte vai exigir um cuidado diferenciado para o qual será necessário assegurar recursos financeiros que terão a concorrência de investimentos obrigatórios com educação, saúde, previdência e segurança, dificilmente reduzíveis.”

A mensagem destaca ainda o pioneirismo de Curitiba com a concessão de solo no final da década de 1980 e como os recursos arrecadados ajudaram a financiar investimentos da Cohab e a implantar uma rede de creches municipais a partir de 2009.

Custo imobiliário

“Esta lei que está tramitando, ainda em fase inicial, tem um risco bem mais direto de impactar no custo final das habitações, para o bem ou para o mal”, afirma o diretor de Planejamento e Gestão da Federação do Comércio do Paraná (Fecomércio-PR), Rodrigo Rosalem. Assim como outros integrantes do G10, ele elogia a iniciativa de a prefeitura incentivar moradias no Centro. Mas discorda de outros pontos. “Precisa incentivar uma coisa punindo outra? Do jeito que está, construir no Centro ficará barato. Ótimo, mas para outras regiões, o mercado já está dimensionado a um custo, e se ele aumentar, pode inviabilizar projetos”, acrescenta.

João Carlos Perussolo, vice-presidente de Indústria Imobiliária do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Paraná (Sinduscon-PR), destaca que o aumento no custo de terrenos causa impacto na economia toda: “Isso impacta na venda de todos os produtos, seja imóvel, seja sapato”.

Perussolo diz que, se o encarecimento se confirmar com a proposta das outorgas, a construção civil pode ficar inviável na cidade. “É preciso ter em vista a mudança no setor. De uns 15 anos para cá, as construtoras executam as obras que as incorporadoras definem, com o investimento que querem fazer. Mas elas só fazem se houver retorno, pois são formadas por agentes financeiros. Se o custo para erguer um imóvel for muito alto, elas vão preferir investir em outros ativos do mercado”, argumenta.

O executivo do Sinduscon-PR afirma que a tentativa de aumentar a arrecadação pode afastar empreendedores. Segundo ele, a teoria de que diminuir o coeficiente de construção vai gerar redução de preço no terreno não ocorre na prática: o vendedor mantém o mesmo valor. “A nossa opinião é que é preciso gerar emprego e renda. Em muitas cidades que tentaram aumentar impostos de alguma forma, o resultado foi a diminuição da receita. O incorporador vai fazer a conta dos insumos. Se subir muito, impactando no preço final, e as pesquisas mostrarem que o público-alvo dele não vai pagar esse preço, não sai o imóvel”, acrescenta.

O que diz o Ippuc

O Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) defende a precificação da outorga de maneira a atender aos interesses da população como um todo. O coordenador da revisão da Lei de Zoneamento no Ippuc, Alberto Paranhos, reforça que quem seguir os incentivos previstos no plano não terá custo adicional.

Para o Ippuc, não foram criadas restrições para se construir nas mesmas áreas de hoje; o que houve é um escalonamento do coeficiente para o uso, de forma a manter o ordenamento previsto pelo poder público. “Não foi mudado o parâmetro da zona. A mudança está no parâmetro do uso. Só terá custo quem não fizer o que o plano quer. Quem fizer habitação no Centro, por exemplo, vai aproveitar todo o potencial disponível e não terá custo, assim como quem investir em áreas comerciais nas estruturais”, afirma.

Áreas verdes

O projeto de potencial construtivo adicional está atualmente na Comissão de Economia, Finanças, e Fiscalização da Câmara Municipal, aguardando informações da prefeitura a respeito da preservação de áreas verdes na capital.

Um documento enviado à Câmara Municipal pela Associação dos Protetores de Áreas Verdes de Curitiba e Região Metropolitana (Apave) alerta para o risco de a proposta inviabilizar a preservação ambiental e pede mudança no texto para inclusão das Reservas Particulares do Patrimônio Natural Municipal (RPPNM) para a transferência de potencial construtivo.

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