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Hospital de campanha do Maracanã, no Rio de Janeiro: suspeita de desvio de recursos
Hospital de campanha do Maracanã, no Rio de Janeiro: suspeita de desvio de recursos| Foto: Divulgação/Governo do Estado do Rio de Janeiro

Três empresas com sede em Curitiba são mencionadas em investigações sobre desvio de recursos públicos destinados ao combate à pandemia do novo coronavírus no Rio de Janeiro. Os inquéritos são conduzidos pelo Ministério Público Federal (MPF), pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ), pela Polícia Federal (PF) e pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

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De acordo com investigações conduzidas pelo braço fluminense da força-tarefa Lava Jato, um dos esquemas envolveria a organização social (OS) Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas), contratada por R$ 835 milhões pelo estado do Rio para implantação e administração de sete hospitais de campanha, além de servidores públicos, incluindo conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) e deputados estaduais.

A organização subcontratou duas empresas de Curitiba e, de acordo com o inquérito, estaria sendo usada para desviar recursos.

A fraude, ainda conforme as investigações, seria liderada pelo empresário Mário Peixoto, que teria grande influência no Iabas embora seu nome não conste no quadro social da OS. Outro nome importante no suposto esquema é o de Alessandro Duarte, que, segundo o MPF, seria um dos principais operadores financeiros de Peixoto.

Com a quebra dos sigilos bancário, fiscal, telemático e telefônico de ambos, os investigadores localizaram um e-mail na caixa de entrada de Duarte, com uma planilha intitulada “Análise para o Alessandro final.xlsx”. O documento traz em detalhes valores de compras de equipamentos, além de um cronograma físico dos sete hospitais de campanha previstos para serem instalados no Rio.

“Documentos esses que normalmente são manuseados por administradores ou diretores da empresa”, afirma o juiz federal Marcelo Bretas no despacho que autorizou buscas e apreensões em endereços relacionados aos empresários na chamada Operação Favorito, deflagrada no último dia 14. Da continuidade da investigação derivou uma nova operação, a Placebo, que respingou no governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), na última terça-feira (26).

A planilha menciona a empresa curitibana Hera Serviços Médicos e, ao lado do nome da empresa, um valor de R$ 133.463.904,00, que seria referente à contratação e pagamento da folha de médicos. No mesmo documento é mencionado um montante de R$ 236.743.264,40 para “colaboradores não médicos contratados” e R$ 31.325,400,00 para a empresa GD9 Assessoria em Recursos Humanos – também sediada na capital paranaense –, sendo R$ 16.200.000,00 para o serviço de assessoria e R$ 15.125.400,00 para gestão de pessoal.

Não há indícios da participação das empresas no esquema.

Planilha encontrada em e-mail interceptado pelo MPF-RJ
Planilha encontrada em e-mail interceptado pelo MPF-RJ| Reprodução

Procuradas pela reportagem, a Hera e a GD9 encaminharam notas nas quais confirmam terem sido contratadas pelo Iabas, porém a valores inferiores. Ambas ressaltam ainda a inexistência de investigação contra elas e negam qualquer relação com o empresário Mário Peixoto. Leia abaixo as notas na íntegra.

A Hera tem escritório no bairro Água Verde e faz parte do Grupo Hygea. O grupo já prestou serviços para a prefeitura Curitiba, subcontratado pelo Instituto Nacional de Ciências da Saúde (INCS), que é responsável pela gestão da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Cidade Industrial de Curitiba (CIC). Até a manhã desta quinta-feira (27), a Hygea destacava em seu site um recrutamento de profissionais médicos interessados em participar “da estruturação de hospitais de campanha para atendimento à população brasileira” no Rio de Janeiro.

Já a GD9, que tem sede no bairro Alto da XV, divulgava em seu site dois processos seletivos para contratação de mais de 7,5 mil profissionais, entre enfermeiros, técnicos de enfermagem, farmacêuticos, fisioterapeutas, auxiliares de farmácia, assistentes sociais, psicólogos, auxiliares administrativos, auxiliares de serviços gerais, nutricionistas, odontólogos, fonoaudiólogos, biólogos, maqueiros, técnicos de segurança do trabalho, auxiliares de patologia, auxiliares de rouparia, encarregados líderes, técnicos de laboratório e coletores de rouparia.

A empresa informava que as posições seriam para sete hospitais de campanha no estado do Rio de janeiro: Maracanã, Nova Iguaçu, São Gonçalo, Duque de Caxias, Campos dos Goytacazes, Nova Friburgo e Casimiro de Abreu.

Dos sete, até agora apenas o hospital de campanha do Maracanã foi inaugurado. De acordo com o último boletim epidemiológico, divulgado pelo Ministério da Saúde nesta quarta-feira (27), o Rio de Janeiro tinha 42.398 casos confirmados de Covid-19 e 4.605 óbitos contabilizados em razão da doença. O estado é o segundo do país em número de infectados, atrás apenas de São Paulo.

Procurado pela Gazeta do Povo, o Iabas informou, por meio de nota, que tem como objetivo “promover o melhor atendimento às vítimas do Covid-19 e salvar vidas”.

“A direção do Iabas esclarece que forneceu às autoridades todas as informações e documentos solicitados e está à disposição para quaisquer novos esclarecimentos”, afirma a OS.

Ambulâncias do Samu

Outra investigação relacionada a desvio de recursos da saúde no Rio de Janeiro, esta conduzida pelo MP-RJ, aponta que a contratação da empresa paranaense OZZ Saúde para administração do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) na capital fluminense teria ocorrido com sobrepreço, superfaturamento e antecipação ilegal de pagamento.

O MP ajuizou uma ação civil pública contra a empresa, o estado do Rio, o ex-secretário da saúde Edmar Santos, e o ex-subsecretário da saúde, Gabriell Neves, responsáveis pela contratação, feita com dispensa de licitação e em caráter emergencial.

Com sede no bairro Cabral, em Curitiba, a OZZ Saúde presta o mesmo serviço de administração do Samu para a prefeitura da capital paranaense. O contrato vigora desde 2018 e foi prorrogado duas vezes – no último aditivo contratual, até 26 de dezembro de 2020.

Procurada pela Gazeta do Povo, a OZZ Saúde informou que se manifestaria por meio de nota, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem. O posicionamento da empresa será incluído assim que recebido pelo jornal.

Confira a nota da Hera Serviços Médicos na íntegra:

A Hera Serviços Médicos Ltda é uma empresa de prestação de serviços especializados de saúde, notadamente de apoio à gestão de saúde e de atendimento em pronto-socorro e unidades hospitalares para atendimento a urgências, que atua em seis estados brasileiros e em dezenas de unidades de saúde. Com base em sua qualificação, experiência e notória especialização foi selecionada pela Organização Social de Saúde Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (IABAS) para prestar serviços no Estado do Rio de Janeiro, especialmente em hospitais de campanha administrados pela referida OS. A empresa não possui qualquer relação com o referido empresário.

A empresa já recebeu pouco mais de R$ 1,2 milhão referentes aos primeiros 15 dias de serviços prestados na unidade Maracanã.

NOTA DE ESCLARECIMENTO

A HERA SERVIÇOS MÉDICOS LTDA. vem a público esclarecer que é empresa de prestação de serviços especializados de saúde, notadamente de apoio à gestão de saúde e de atendimento em pronto-socorro e unidades hospitalares para atendimento a urgências, que atua em seis estados brasileiros e em dezenas de unidades de saúde.

Ao longo de sua história, desempenhou atividade compatível e qualificada e, por conta desses atributos, foi selecionada, baseado em sua experiência e notória especialização, por uma Organização Social de Saúde (Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde – IABAS) para prestar serviços no Estado do Rio de Janeiro, especialmente em hospitais de campanha que referida Organização Social comprometeu-se a implantar e gerir para tratamento de pacientes da COVID-19.

No início deste mês de maio, a imprensa nacional divulgou notícias relacionadas às investigações da Força-Tarefa da Lava Jato (Ministério Público Federal) acerca de ações de agentes públicos em contratos relacionados ao combate a pandemia da COVID-19 no Estado do Rio de Janeiro. Nessas notícias, aventou-se que o IABAS teria alguma participação em irregularidades, o que foi rechaçado pelos representantes da Organização Social.

Partindo dessas primeiras notícias, precipitadamente, alguns órgãos de imprensa noticiaram o possível envolvimento das empresas HERA, Hygea, Prohelth, Atmed e Atena na referida investigação, assim como seus sócios  Drs. Thiago Gayer Madureira, Guilherme Gayer Madureira e Larissa Gayer Madureira, sem qualquer compromisso com a verdade ou respeito à imagem, honra e reputação alheias, imputando-lhes “participação no esquema”, desprovidos de respaldo minimamente razoável que fosse, além da mera prestação de serviços médicos em prol da população fluminense.

Oportuno destacar, a bem do esclarecimento público e da necessária retomada da verdade dos fatos, que a decisão do Min. Benedito Gonçalves (STJ) no processo nº 5010476-42.2020.4.02.5101, que trata das investigações em questão, não faz absolutamente qualquer insinuação de ilícitos ou irregularidades na contratação da HERA. Há apenas uma brevíssima menção à existência desse contrato, sem suscitar qualquer conduta fraudulenta ou espúria a seu respeito que possa, em tese, ter sido praticada por agentes públicos a serviço do Estado do Rio de Janeiro.

A planilha de valores que circulou no noticiário indicava os limites de gastos previstos para a contratação de fornecedores pelo IABAS, dentre eles a HERA, que viria a prestar os serviços médicos. Mas os valores lá citados foram orçados com base em um cenário inicial de 1.400 leitos de UTI, mas cujo escopo foi modificado e reduzido por ocasião da efetiva contratação.

A capa dos referidos autos n° 5010476-42.2020.4.02.5101 já indica que nem a HERA tampouco qualquer dos outros citados nas referidas publicações sequer são investigadas pelo Ministério Público Federal e muito menos são alvo de pedido de medidas cautelares ou estão arrolados entre os acusados.

Confira a nota da GD9 na íntegra:

A GD9 RH não conhece a suposta planilha mencionada e não faz a menor ideia de onde partiu a indicação do valor de R$31.325.400,00, não reconhecendo nem tendo recebido tal valor em hipótese alguma.

Feito este esclarecimento inicial, seguem as respostas aos questionamentos:

1 – A única relação da GD9 com o IABAS refere-se à prestação de serviços de Assessoria em Recursos Humanos, Recrutamento e Seleção. Quanto a Mario Peixoto, a GD9 nunca teve, tem ou terá qualquer relação.

2 – O IABAS contratou serviços de Assessoria em Recursos Humanos, Recrutamento e Seleção a partir da segunda semana de abril de 2020 pelo período em que perdurarem as necessidades de recrutamento, seleção e assessoria na contratação de profissionais (exceto médicos), para alguns Hospitais de Campanha no Estado do Rio de Janeiro.

3 – A GD9 recebeu, por parte dos serviços já prestados, o valor estabelecido contratualmente.

Por fim, é importante esclarecer que todos os serviços prestados estão farta e robustamente documentados.

Participaram deste projeto mais de 200 colaboradores para realizar o recrutamento e seleção de mais de 8.000 profissionais em aproximadamente 30 dias, nos exatos termos solicitados pelo IABAS e fiscalizados pelos Órgãos Governamentais de controle.

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