O Paraná demorou quase uma década para elaborar um estatuto próprio que determinasse as diretrizes de políticas públicas para combater a discriminação racial. Somente nove anos depois de o Estatuto da Igualdade Étnico Racial entrar em vigor em todo o Brasil, o estado começa a ganhar um documento que atende as demandas regionais. Mesmo com o atraso, o Paraná será o terceiro estado a ter um documento que garante direitos fundamentais a essas populações. Antes, Rio Grande do Sul, em 2011, e Bahia, em 2014, instituíram as suas leis estaduais.
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As discussões em torno de um estatuto próprio iniciaram-se com maior intensidade em 2012 e ganharam corpo nos últimos dois anos. No entanto, a demanda é mais antiga. “É uma demanda histórica, muito anterior à existência do Estatuto Federal, implantado em 2010”, afirma a coordenadora da Divisão de Promoção da Igualdade Racial, Ana Raggio.
A existência do estatuto nacional traça as diretrizes para a política de promoção da igualdade racial em todo o país. “Já o Estatuto do Paraná trata das especificidades regionais e prevê políticas públicas e ações afirmativas para a realidade estadual”, explica Ana.
Neste ano, a elaboração do documento entrou na reta final. Ao longo dos últimos dois anos foi elaborado um documento prévio para embasar o projeto e que chegou a passar por consulta das comunidades quilombolas do estado. A partir de então foram consultadas as secretarias estaduais que apontaram novas sugestões.
No último dia 7 de outubro foi realizada uma audiência pública no Palácio das Araucárias, em Curitiba, que reuniu membros do governo estadual, dos movimentos sociais e do Ministério Público para debater a redação final do Estatuto. Após essa etapa, o projeto será encaminhado ao governo estadual que deverá remeter à Assembleia Legislativa para ser apreciado pelos deputados estaduais. A expectativa é de que em 60 dias o estatuto entre em vigor.
“Houve ao longo dos anos uma morosidade para dar formato a um estatuto próprio. É importante que o governo esteja atento para as políticas de igualdade, dando maior atenção para uma população que historicamente ficou de fora das políticas públicas”, afirma um dos coordenadores da Superintendência de Diálogo e Interação Social do governo estadual, Denilton Laurindo.
O objetivo é de que estatuto seja um instrumento legal que defina as diretrizes de políticas públicas dentro do estado com o intuito de superar as desigualdades socioeconômicas que atingem a população negra, comunidades indígenas e outros segmentos étnicos minoritários da população paranaense. “Significa que o documento fornecerá mecanismos para a elaboração e ampliação de programas, como a regularização fundiária, educação, saúde e cultura voltada para essa população”, ressalta Laurindo. Além disso, o documento deverá prever políticas voltadas ao acesso ao mercado de trabalho e a elaboração de sistema de cotas.
O estatuto deverá assegurar, ainda, os direitos dos remanescentes de quilombos, povos e comunidades indígenas, faxinalenses do centro-sul do estado, ilhéus e pescadores artesanais, entre outros. O Paraná possui 39 comunidades quilombolas.
Ampliação
O presidente do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Consepir), Saul Dorval, também acredita que a criação de um estatuto específico para o Paraná irá consolidar e ampliar políticas públicas para uma população que historicamente foi excluída e discriminada. “Demoramos para ter um Estatuto próprio que atenda as demandas dessa parcela da sociedade”, afirma.
Segundo ele, o estatuto estadual será capaz de dar um direcionamento para implantação de políticas públicas a fim de resgatar a cidadania dos negros e índios. “Será um novo ordenamento jurídico que permitirá a ampliação e a realização de políticas públicas afirmativas e específicas para essa parcela da sociedade paranaense”, afirma.
Demanda
A demanda por políticas públicas voltadas às minorias sociais no Paraná pode ser expressa pelos últimos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) 2018, cerca de 33% da população do Paraná é formada por negros ou pardos. “O Estatuto reforça esse reconhecimento da contribuição social e cultural dos povos negros para a formação do estado”, salienta a coordenadora da Divisão de Promoção da Igualdade Racial, Ana Raggio.
Os números, como ela explica, denotam a existência de uma demanda pela inserção social e econômica dos negros e demais minorias. A expectativa, explica Ana, é que o documento sirva para garantir “que as políticas afirmativas sejam aplicadas”.
Fundo Estadual
Em paralelo aos debates em torno da criação do Estatuto Estadual de Igualdade Racial, será implantado o Fundo Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Fundepir). Esse fundo cria um crédito especial no valor de R$ 2 milhões para investimentos em ações que promovam a igualdade racial e combatam a discriminação.
O que deverá prever o Estatuto
Apesar de a redação final do Estatuto da Igualdade Racial ainda não ter sido encaminhada para ser apreciada pelos deputados estaduais, já é possível elencar algumas das políticas públicas que deverão ser implantadas no Paraná. No anteprojeto do documento está prevista a criação de programas específicos para o direito à saúde em comunidades quilombolas e comunidades tradicionais negras do estado.
Também está prevista a criação de delegacias da Polícia Civil especializadas em “Crimes de Ódio”, que incluirão combate ao racismo e à intolerância religiosa. Outro ponto que o estatuto orienta é em relação às cotas para o ingresso em universidades públicas do Paraná. Hoje cada instituição possui um sistema próprio.
Educação
Com o Estatuto, a previsão é de que 20% das vagas ofertadas nas universidades sejam destinadas à população negra. A autodeclaração dos candidatos será aferida por meio de uma banca de verificação.
Nos colégios, segundo estipula o estatuto, o poder público deverá implementar programa específico de fortalecimento da identidade e da autoestima de crianças e jovens negras e indígenas. Será ainda assegurado aos estudantes praticantes de religiões de matrizes africanas o direito de realizar atividades compensatórias quando faltar às aulas em função de atividade religiosa desde que devidamente comprovada.
Será reforçada, também, a necessidade do ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira. Caberá ainda à Secretaria de Educação do Paraná apurar administrativamente as ocorrências de racismo e intolerância religiosa dentro dos colégios.
Acesso a terras
O Estatuto da Igualdade Racial também prevê políticas públicas em relação ao acesso à terra dos povos quilombolas. De acordo com a proposta, nas comunidades quilombolas que estejam em terras pertencentes ao Estado será adotado um procedimento para a imediata destinação de terras às comunidades, que serão regulamentadas pelo Instituto de Terras, Cartografia e Geologia do Paraná (ITCG).
Nas situações em que as comunidades quilombolas estejam localizadas em terras pertencentes a particulares serão realizados todos os trâmites para a desapropriação para que os imóveis sejam regularizados e titulados em prol das comunidades.
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