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Felipe Francischini
O deputado Felipe Francischini, presidente da CCJ da Câmara. Foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados| Foto:

Após conduzir a sabatina com o ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a reforma da Previdência, o deputado Felipe Francischini (PSL) encara nesta terça-feira (2) seu segundo grande desafio na presidência da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal. Na sessão em que é ouvido o ministro Sergio Moro, o presidente da Comissão tem a tarefa de equilibrar as pressões da oposição às tentativas de blindagem dos aliados, mantendo a função institucional exigida pelo cargo.

Sumarizadas numa apresentação rápida, as informações sobre o jovem deputado Francischini dão a clara impressão de estarmos olhando para mais um dos parlamentares eleitos pela onda bolsonarista que veem na política tradicional a mãe de todos os males: jovem; filiado ao PSL e estridente nas redes sociais, onde se apresenta um antipetista fervoroso e defensor da cesta de pautas que compõem o ideário “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.

Essa definição breve não é inverídica, mas é insuficiente. O deputado, por exemplo, declara admirar a construção política feita por Ulysses Guimarães durante a Constituinte e o domínio do processo legislativo de Eduardo Cunha, ambos monumentos da política tradicional em suas variadas facetas.

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Uma boa maneira de entender o deputado que aos 27 anos chegou à presidência da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara é olhando para o Francischini das redes sociais como um personagem. A dica foi dada por ex-colegas de parlamento, que conviveram com o deputado por quatro anos na Assembleia Legislativa do Paraná, onde teve assento entre 2015 e o fim de 2018. Só fazendo essa separação é possível entender como o polemista virtual é lembrado por deputados como um sujeito cordato, discreto e respeitoso no trato pessoal.

“No cafezinho, um gentleman; na rede social, um monstro”, sintetiza, um adversário político. Francishini contemporiza, mas não nega a dicotomia.

“Na relação interpessoal eu tenho muito respeito por todos. Consigo conversar com quem é de extrema esquerda e de extrema direta. Quero entender de verdade os pontos de vista de todo mundo. Já a rede social é um espaço de colocar a opinião de maneira menos formal, aí acabo sendo mais polêmico, usando um linguajar menos técnico”, explica.

O começo

Felipe Francishini chegou à Assembleia Legislativa do Paraná aos 23 anos de idade ao receber quase 36 mil votos na eleição de 2014, quando estava filiado ao Solidariedade. Sem nenhuma atividade política prévia, ele pegou carona na carreira política do pai, o delegado Fernando Francischini (PSL), que em 2010 foi eleito deputado federal na esteira do sucesso da prisão do traficante Juan Carlos Abadía. No primeiro ano de mandato, avaliam colegas, o jovem parlamentar patinou.

“Ele chegou à assembleia carregado pelo pai. Não tinha nenhum tipo de expressão em nenhuma atividade política, nem sindical, nem grupo de direita, nada. Era um menino que tinha acabado de sair da faculdade”, avalia um deputado de quinto mandato.

O pai, Fernando Francischini, diz que o filho sempre demonstrou interesse pela vida pública e o acompanhava em eventos desde que tinha 16 anos. Com essa “escola de política”, como disse o pai, Felipe pediu uma chance para ser candidato deputado estadual.

No Legislativo paranaense, ainda em seu primeiro ano de mandato, passou pelo momento que tisnou a carreira política de boa parte dos deputados estaduais daquela legislatura. Ao votar um pacote de austeridade fiscal, os parlamentares enfrentaram forte resistência dos servidores e, determinados a aprovar as medidas do Executivo, aceitaram furar o bloqueio de manifestantes usando um blindado da Polícia Militar. Daí o indelével apodo de “bancada do camburão”, um dos marcos do fatídico 29 de abril.

Nesse caso, Felipe ainda tem um agravante: tanto a reação das forças de segurança como a estratégia para que os deputados entrassem na Assembleia foram coordenadas por seu pai, então secretário de Segurança do Paraná.

Com o tempo, Felipe foi sedimentando sua identidade parlamentar sobre duas bases: o discurso antipetista alicerçado em movimentos da nova direita que surgiram durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff – algo muito próximo do que o pai fazia; e um olhar minucioso e técnico sobre o processo legislativo. Nesse segundo ponto começou a ficar evidente uma característica do deputado que é destacada por boa parte dos colegas: “o Francischini é um CDF”, resumiu um parlamentar.

Na Assembleia, relembra um assessor de outro deputado, Francischini era conhecido como “vade mecum ambulante”, em referência ao manual indispensável das ciências jurídicas.

Colegas de faculdade contam que essa característica vem desde o curso de Direito, feito na Universidade Curitiba. Guilherme Minozzo, que se formou com o deputado e chegou a assessorá-lo por um mês no início da carreira, conta que em uma prova de Direito Constitucional em que a turma estava insegura sobre o conteúdo, Francischini reuniu os colegas uma hora antes do exame e, com tom professoral, fez uma revisão da matéria.

Com essa inclinação, Francischini sempre se ateve às tecnicidades do processo legislativo, mesmo para dialogar com a oposição.

“Nas poucas vezes que nós conversamos ele sempre tinha atitude de ouvir e de dizer que ia estudar a situação. Ele tinha uma caracterização muito legalista. Mas isso não se refletiu nas atitudes dele. Em todo momento ele foi favorável ao governo, mesmo que a gente apontasse o que os servidores estavam reivindicando”, relata Marlei Fernandes, ex-presidente da APP sindicato, que representa os professores da rede estadual, e foi a principal força de oposição à gestão do ex-governador Beto Richa (PSDB) e de sua base de apoio na Assembleia Legislativa, da qual Felipe Francischini fazia parte.

De estadual a federal

Cumprido o mandato de deputado estadual, em vez de disputar a reeleição, Felipe trocou de posto com o pai. O filho disputaria uma cadeira em Brasília enquanto o pai retornaria a Curitiba, com assento na Assembleia Legislativa. Dois motivos impeliram a decisão. O primeiro, político, é que Fernando Francischini quer ser prefeito de Curitiba e, para isso, Brasília não é um bom lugar para passar a semana. O segundo motivo é familiar. Fernando tem um filho com autismo, o que demanda sua presença mais próximo da família, em Curitiba. Mais uma vez, portanto, Brasília não é um bom lugar para passar a semana.

Eleito deputado federal, o conhecimento jurídico foi um passo importante para que Felipe Francischini conseguisse a presidência da CCJ, que fora prometida ao PSL na negociação para eleição do presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Segundo o deputado, o fato de ter se debruçado sobre o regimento da Câmara – não só sobre o que está escrito, mas também sobre as práticas consolidadas – ajudou a superar a resistência que sua pouca idade poderia causar.

À dedicação técnica, somou-se uma capacidade de articulação política que Francischini não havia demonstrado na Assembleia Legislativa. As circunstâncias ajudam a explicar. Na Alep, ele era um parlamentar inexperiente numa Casa Legislativa dominada por deputados de muitos mandatos, com influência ramificada em toda a estrutura pública do estado.

Na Câmara dos Deputados, o contexto é outro. Na bancada do PSL, o jovem Francischini tem mais experiência que a maior parte dos correligionários. Dos 52 deputados da legenda, 47 nunca haviam sido eleitos prefeitos, governadores ou deputados, segundo um levantamento do Estadão Dados. Com isso, o paranaense se aproximou de Eduardo Bolsonaro e ajudou o filho do presidente na organização da bancada do partido.

O pai conta que no mês de janeiro, antes mesmo de tomar posse, Felipe ficou em Brasília visitando ministros e conversando com deputados aliados.

Esse processo de arrumação da nova bancada deu uma posição de destaque para Francischini na legenda – além de aproximá-lo de Eduardo Bolsonaro, figura-chave do partido no Legislativo e dos dois principais caciques do PSL, Luciano Bivar, presidente da legenda, e Antônio de Rueda, o vice. Em outro flanco, Fernando Francischini, abria portas e avalizava o nome do filho para antigos aliados políticos.

Foram esses movimentos que levaram Felipe Francischini à presidência da CCJ em um acordo que envolve o revezamento no cargo. No ano que vem, quem assume o posto é a deputada Bia Kicis (PSL-DF), atual vice-presidente do colegiado.

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A postura institucional

Desde que assumiu o cargo, o deputado incorporou o papel institucional esperado. Suas postagens em redes sociais estão mais moderadas e o fantasma petista consome pouca atenção. Ganharam espaço relatos sobre o andamento da reforma da previdência e entrevistas sobre o tema.

“A população sabe da minha visão de mundo. Especialmente quem votou em mim sabe os temas que vou trabalhar na Câmara, mas agora é hora de olhar para a reforma e eu estou com meus esforços focados nisso”, conta.

Notívago, o deputado posta vídeos durante a madrugada mostrando sua rotina de estudos sobre a reforma da previdência e sobre o regimento da Câmara. Essa preocupação processual, de conhecer as normas e as práticas da Casa Legislativa tem sido constante. Antes mesmo de assumir a CCJ ele já vinha estudando o processo legislativo e assistindo a vídeos de sessões antigas.

Outra forma que tem encontrado para superar as desconfianças é recorrer a lideranças mais antigas e a assessores respeitados na Casa. Um colega de bancada relata que antes de tomar as principais decisões, como por exemplo a escolha do relator da reforma na CCJ – o deputado Delegado Marcelo Freitas (PSL-MG) – Francischini escuta a opinião de parlamentares mais experientes como Arthur Lira (PP), Agnaldo Ribeiro (PP) e Carlos Sampaio (PSDB), além do próprio presidente Rodrigo Maia, com quem tem conversado quase diariamente.

O primeiro grande teste na CCJ foi a condução da sessão que contou com a presença do Ministro da Economia Paulo Guedes para responder a questionamentos dos deputados sobre a reforma da previdência. Mesmo com a confusão que antecipou o fim da sessão após o deputado Zeca Dirceu (PT) dizer que Guedes agia como “tigrão” com os trabalhadores e “tchutchuca” com banqueiros, Francischini ficou satisfeito com a forma que conduziu os trabalhos.

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“Minha forma de atuação é assim: eu respeito todo mundo. Posso não concordar com nada, mas sou assim. Teve muita gente que me criticou. Disse que eu tinha que ter tirado a palavra dos oposicionistas, mas eu não posso fazer isso. Eles foram eleitos. Eu não agradei 100% nem oposição, nem governo, o que considero um bom resultado”, avalia.

Felipe Francischini se diz um sujeito “apaixonado” pelo Legislativo e diz não ter pretensões de chegar um dia ao Executivo. Questionado se sonha um dia em ser senador, o deputado não nega, mas evita ser conclusivo.

“Meu sonho político é este: transitar pelo Legislativo e passar por várias etapas desse processo”, diz.

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