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Produção de suínos na região Oeste do Paraná
Produção de suínos na região Oeste do Paraná| Foto: Albari Rosa/Arquivo/Gazeta do Povo

O ano de 2020 levou os municípios do Oeste paranaense a passar uma borracha em suas estimativas econômicas. Mas, ao contrário do que se espera em boa parte do país, a revisão foi para cima. De crescimento de 5% em seu Produto Interno Bruto (PIB), um conjunto de 54 municípios da porção mais ocidental do Paraná elevou a expectativa de alta para 10% em relação ao PIB de 2019, em um total contraste com a realidade preocupante pós-pandemia. Um resultado espetacular conquistado graças à força da sociedade organizada.

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Desde 2014, o Oeste do Paraná desenvolve um trabalho de associativismo chamado Programa Oeste em Desenvolvimento (POD). Suprapartidário, ele envolve diversas entidades públicas e privadas para ações de governança. O objetivo é desenvolver a região como um todo, e não apenas um determinado município, como é o modelo mais comum de conselhos de desenvolvimento no Brasil. Para isso, o POD junta mais de 70 entidades, como a Itaipu Binacional, de Foz do Iguaçu; o Sebrae (serviço nacional que estimula o empreendedorismo e desenvolvimento de negócios); as universidades (especialmente a Unioeste); a Federação das Indústrias do Paraná (Fiep); a Associação dos Municípios do Oeste do Paraná (Amop) e, claro, as empresas e cooperativas locais.

Representantes destas instituições se reúnem periodicamente, e em câmaras técnicas, para definir prioridades na região, as demandas que vão fortalecer todo o conjunto de municípios – estão nesta região cidades grandes como Cascavel, Toledo e Foz do Iguaçu, e pequenas, como Ibema, Cafelândia e Braganey. Com isso, podem pleitear investimentos do estado ou estabelecer uma ação conjunta de marketing, para exemplificar.

Foi graças a essa junção de demandas que o programa conquistou seu primeiro grande marco, no ano passado. Em outubro, o Ministério da Agricultura assinou uma normativa que livra o Paraná da vacinação de seus rebanhos contra a febre aftosa (ela foi reconhecida oficialmente nesta semana). Em tese, isso mostra que o estado adota boas práticas sanitárias. Também abre um mercado “premium”, interno e externo, não só para a carne bovina paranaense, mas também para a suína e a de aves. “[2020] Foi o primeiro ano livre de vacinação no Paraná. Essa foi a principal entrega feita pelo POD. Temos que comemorar esse modelo de a sociedade se organizar e conseguir esse benefício”, celebra o atual presidente do consórcio, Danilo Vendruscolo. A sanidade animal foi a primeira bandeira do Oeste.

“Nos últimos dois anos, 100% das cooperativas dos 54 municípios aderiram. São em torno de 55 mil pequenos produtores rurais cooperados. Isso é importante para que todo o Oeste tenha um discurso alinhado. A grande força que esse programa oferece é o alinhamento dessas demandas. A participação das cooperativas é exemplo disso. Todas elas unidas nos dão uma força muito grande”, comenta o executivo. Em sua avaliação, o conjunto unido ajudou o Oeste a desenhar junto com o governo do Estado um plano para eliminar a vacinação dos rebanhos no Paraná.

A vitória sanitária ajuda a explicar o otimismo com o crescimento do PIB regional, descrito no início do texto e do qual se excetua apenas Foz do Iguaçu, abalada fortemente com a queda no turismo. Ainda no fim de 2019, assim que o estado recebeu autorização para suspender a vacinação, a Frimesa, uma das maiores cooperativas do Brasil, retomou o projeto de um novo frigorífico em Assis Chateaubriand, um dos municípios englobados pelo POD. A capacidade de abate é de 15 mil suínos por dia e o investimento superior a R$ 1 bilhão irá gerar cinco mil empregos na região. Mais que isso: os recordes em safra, produção de proteína e preços altos em função do dólar casaram com os novos mercados abertos para os produtores da região. A agroindústria do Oeste passou a voar.

Uma crescente que vem sendo registrada nos últimos anos. O valor nominal da produção agro da região em 2018, dado mais recente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), foi de R$ 20,3 bilhões. O estado registrou, no mesmo ano, um total de R$ 89,7 bilhões. Os principais destaques do segmento no Oeste foram a produção de suínos (a região tinha 4,2 milhões de cabeças das 6,8 milhões do estado) e de aves (115 milhões de 384 milhões cabeças no estado). Produção de soja e milho também se destacaram.

Pelos números de 2017, o PIB per capita da região superou a média do estado: R$ 40.669 no ano ante R$ 37.221. Nesse mesmo período, o PIB da região foi de R$ 53 bilhões dos R$ 421 bilhões do Paraná – ficou atrás da região metropolitana de Curitiba e do Norte central do estado (região de Maringá e Londrina). Antes da implementação do POD, o PIB do Oeste havia sido de R$ 38 bilhões dos R$ 333 bilhões do estado em 2013. A participação da região no bolo do estado foi de 11% para 12% nesses cinco anos.

Programa Oeste uniu as pontas já existentes

Apesar dos bons dados, a equipe do Programa Oeste em Desenvolvimento admite que o trabalho foi um refinamento das potencialidades que já existiam na região, que é relativamente nova em termos de importância econômica. O Oeste começou a ser adensado há menos de cem anos. Foi na década de 1930, com a “Marcha para o Oeste” do presidente Getúlio Vargas – um programa para melhorar a ocupação do território nacional. Com isso, o setor madeireiro, que foi o primeiro a chegar, começou a dividir espaço com a agricultura. As mudanças começaram a se acentuar, de fato, somente nos anos 1970, com o asfaltamento da BR-277, ligando o Oeste a Paranaguá, e a construção da Usina de Itaipu. Em 20 anos, entre 1950 e 1970, a população da região saltou de 16 mil para 760 mil habitantes.

O movimento mais importante para a região, o das cooperativas agroindustriais, veio no fim dos anos 1990 e início dos anos 2000. Com o bom momento das commodities brasileiras na primeira década deste século, as cidades começaram a se desenvolver.

Mas, embora em excelente momento, não é só o agronegócio a puxar os números da região ocidental do Paraná. “A economia é muito diversificada”, destaca Jorge Samek, ex-diretor geral do lado brasileiro da Itaipu Binacional e um dos idealizadores do programa. “Tem o turismo de Foz do Iguaçu, a agricultura em diversas cidades, os grandes varejos em Cascavel, com as redes Destro e Muffato, a indústria de caminhões, a de ônibus, tem a Prati-Donaduzzi [indústria líder no segmento de medicamentos genéricos no Brasil], em Toledo. E isso sem contar com as universidades, que são muito fortes”, diz.

“Mas, quando eu estava nos hotéis, no café da manhã pegava o iogurte e era de Minas Gerais. Outro iogurte, Santa Catarina; a linguiça era de outro ponto. A Frimesa fica aqui, para que trazer presunto da casa do chapéu?”, comenta o comandante da Itaipu entre 2003 e 2016.

Apesar de as empresas já serem fortes, faltava algo a elas: uma união para fortalecer os produtos locais e para definir as demandas a serem levadas ao Estado. “Na verdade não fizemos nada de novo. Se for ver [já existem iniciativas assim] na Itália, na Espanha. Foram locais que fomos visitar antes de implementar o projeto. Fizemos visitas em locais que deram pulo em 10 a 15 anos justamente por juntar os cacos. [No Paraná] Eram muitas coisas localizadas, mas uma de costas para a outra. A ideia principal que nós vimos na Europa nós implantamos aqui”, indica Samek.

Gerente regional do Sebrae e também um dos responsáveis por implantar o programa, Augusto Stein considera o POD um exemplo a ser replicado. “Tínhamos ótimos projetos de associativismo municipais, mas não tínhamos um case de sucesso de uma articulação regional. A essência dele foi juntar parceiros para ter uma visão comum do território. As instituições que fazem parte do programa já são prósperas com sua atuação solo. já fazem seu trabalho, têm seus desafios e suas entregas. Mas, quando você cria um sentimento de que, além da atualização solo, pode-se ter uma atuação coordenada com diversos atores para pensar o que a gente quer para o futuro da região, é uma ideia que cativa, que engaja”, defende.

Região tem novas demandas, especialmente de logística

De seu início para cá, o grupo conseguiu avançar em competitividade. “Nós não conseguimos competir com outros estados, outras cidades, outras regiões de forma isolada. No Norte do Paraná tem Londrina, que é fortíssima. Cascavel não consegue competir com Londrina em diversos aspectos. Assim como Toledo não consegue competir com a região metropolitana de Curitiba. Agora, quando você olha como região Oeste, a gente aumenta nossa condição de competir”, afirma Stein.

Além disso, o gerente do Sebrae aponta que o consórcio teve vitórias em outras demandas, além da sanidade animal já citada. “Houve ganhos no programa. A própria discussão sobre a não renovação das concessões de pedágio, a gente pode dizer que começou aqui no Oeste. Teve um impulso muito grande na região para depois se espalhar pelo Paraná. Ganhou corpo a ponto de, de fato, não serem renovados os contratos. Virou compromisso político, das autoridades...”

A questão logística, para o presidente Danilo Vendrucolo, é hoje uma das principais bandeiras levantadas pelo grupo. “Somos extremamente competentes da porteira para dentro, com uma eficiência muito alta de produção. Competimos de igual para igual com qualquer lugar do mundo. Mas temos um problema, que é o escoamento dessa produção, o suprimento dos nossos produtores. Temos um custo logístico muito alto e estamos trabalhando muito forte para que a gente possa reduzir esse custo”, diz.

Ele indica pleitos como redução do pedágio, extensão de ferrovias e trabalho em hidrovias no Rio Paraná como alguns pontos em trabalho. Não são os únicos. “Temos que olhar para o que está vindo no pós-pandemia. Estamos inaugurando o Iguassu Valley para que a gente possa estimular o avanço e a criação de polos tecnológicos, como o Biopark [um hub de inovação implantado em Toledo], para que gente possa estimular as academias no sentido de criar soluções e integrar com o setor produtivo”, indica. “Nós temos uma clareza de que esse é um dever da sociedade. Culturalmente, os brasileiros terceirizam tudo e acham que o governo resolve todos os problemas. E isso está errado. É o que buscamos estimular e levar para os jovens, criando uma nova cultura e nova forma de construir a sociedade”, defende.

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