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Sessão plenária na Câmara Municipal de Curitiba. Vereadores propõem fim da Ouvidoria do Município
Sessão plenária na Câmara Municipal de Curitiba| Foto: Rodrigo Fonseca/CMC

Uma proposta de emenda à Lei Orgânica do Município em tramitação na Câmara Municipal pode extinguir a Ouvidoria de Curitiba, criada em 2013. O modelo de funcionamento do órgão é considerado exemplar por prever autonomia em relação ao Executivo municipal, funcionando como uma entidade de controle externo.

A ideia da mesa executiva da Câmara é substituir a instituição por ouvidorias próprias para cada poder, como órgãos de controle interno. Segundo secretário da Casa e um dos 14 autores da proposta, Professor Euler (PSD) afirma que a iniciativa foi tomada após pedido do Ministério Público, baseado na Lei Federal nº 13.460/2017, que torna obrigatória a criação de órgãos de controle no âmbito de cada poder.

“Hoje a Ouvidoria do Município tem abrangência sobre os serviços do Executivo e do Legislativo, mas é mantida na estrutura da Câmara”, explica. O vereador também assina projeto de lei que prevê a criação da Ouvidoria do Legislativo. Segundo ele, a medida seria, portanto, uma adequação à legislação federal.

Nos bastidores, no entanto, sempre houve um movimento de resistência entre vereadores em relação à figura do ouvidor do município. Embora esteja previsto desde 1990 na Lei Orgânica, o projeto de lei que institui a Ouvidoria foi aprovado em dezembro de 2012, com sanção do então prefeito Gustavo Fruet (PDT) em 2013. Ações judiciais e tentativas de extinção do órgão fizeram com que a eleição do primeiro ouvidor municipal, o advogado Clóvis Veiga da Costa, ocorresse apenas em março de 2015.

Com autonomia administrativa, remuneração de secretário municipal e uma equipe de servidores cedida pela Câmara, o ouvidor tinha a missão de controlar a administração pública e defender os direitos dos cidadãos. Entre os parlamentares, no entanto, era conhecido como “o 39º vereador”, porque de certa forma concorreria no atendimento a pedidos de cidadãos.

“Havia uma insatisfação de vereadores nesse sentido, quando, na verdade, as atribuições são completamente distintas”, diz Costa. “A função do vereador é legislar e fiscalizar o município, enquanto o ouvidor tem de defender o interesse do usuário do serviço público.”

O advogado compara a ouvidoria a um órgão de defesa do consumidor. “Sempre que o cidadão tem um serviço público previsto em lei que lhe é negado, ele pode recorrer à Ouvidoria para que sejam garantidos seus interesses”, explica. “Quando você tira um órgão de controle desse da lei orgânica do município, temos um retrocesso.”

Lista tríplice

No modelo vigente, para garantir a autonomia do cargo, o ouvidor é eleito pelos vereadores, porém a partir de lista tríplice elaborada por uma comissão formada pela prefeitura, pela Câmara e por representantes da sociedade civil organizada. Qualquer pessoa com notório conhecimento de administração pública e direitos humanos, idoneidade moral e reputação ilibada pode se candidatar à função.

Mas, ao fim do mandato de Costa, no fim de 2016, após três tentativas de votação para escolha de um novo ouvidor, o processo de eleição foi suspenso pelo então presidente da Câmara, Ailton Araújo (PSC). Isso porque nenhum dos três candidatos obteve os 20 votos necessários na Casa.

“Acho que o modelo pode ter sido inovador à época, mas verificou-se não ser o mais adequado”, diz Professor Euler. Segundo a proposta de criação da Ouvidoria do Legislativo, a função de ouvidor seria exercida por um servidor de carreira de nível superior do quadro permanente da Câmara.

Para Clóvis da Costa, trata-se de um engano justificar a substituição da Ouvidoria do Município por órgãos de controle interno como uma adequação à legislação federal. “A Lei 13.460/2017 prevê a obrigatoriedade de ouvidorias para cada poder, porém nada impede que exista uma outra, autônoma, que fiscalize tanto o Executivo quanto o Legislativo”, diz. “Aliás, a própria legislação federal foi criada levando em consideração o modelo curitibano.”

Controle interno

O advogado Manoel Eduardo Alves Camargo e Gomes, professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal do Paraná, considera a extinção da Ouvidoria do Município “um absurdo”. “Perdem a prefeitura, a Câmara, a cidadania curitibana e, sobretudo, perde a democracia”, diz o jurista, estudioso dos regimes jurídicos das ouvidorias públicas e que prepara um livro sobre o tema.

Para ele, o modelo de Curitiba era exemplar para o país, onde a maior parte das mais de 2 mil ouvidorias funcionam como órgãos de controle interno. Entre as exceções, ele considera referência, além da capital paranaense, o município de Santo André (SP), onde o titular do cargo de ouvidor é eleito por colegiado composto de representantes de diversos segmentos da sociedade civil, sem qualquer vínculo funcional com instâncias do estado.

Gomes foi o redator do projeto de lei que criou a primeira ouvidoria de Curitiba, em 1986, iniciativa então inédita no Brasil – o órgão acabou sendo extinto anos depois. “Em todos os países avançados democraticamente, o ombudsman tem independência em relação ao órgão que controla”, diz. “A ideia de um controle interno empobrece o instituto da ouvidoria.” Para ele, os vereadores não deveriam entender o órgão como uma instituição concorrente, mas como um instrumento de auxílio à vereança.

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