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Reservatório Piraquara I está com 33% da capacidade devido à estiagem.
Reservatório Piraquara I está com 33% da capacidade devido à estiagem.| Foto:

Nos últimos meses, o Paraná enfrenta aquela que já é considerada uma das piores secas da história. Com chuvas abaixo da média desde o fim de 2019, as barragens que compõem o Sistema de Abastecimento Integrado de Curitiba e Região Metropolitana apresentam os menores níveis desde 2009. E, segundo as previsões meteorológicas, as chuvas dos próximos meses serão insuficientes para normalizar a situação, que tende a seguir crítica até o fim do ano. Para enfrentar esse tipo de situação, dois fatores são fundamentais: uso racional da água pela população e planejamento do poder público.

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É nesse último aspecto que o governo do Paraná deu um passo importante há algumas semanas, quando se tornou o primeiro estado brasileiro a elaborar um Relatório de Conjuntura de Recursos Hídricos. Realizado pelo Instituto Água e Terra, com apoio da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), o relatório apresenta um retrato atualizado de usos e gestão das bacias hidrográficas em todo o território paranaense. São informações sobre quantidade e qualidade da água, como ela vem sendo utilizada, mecanismos de gestão e os desafios para garantir a segurança hídrica, ou seja, “quando há disponibilidade de água em quantidade e qualidade suficientes para o atendimento às necessidades humanas, à prática das atividades econômicas e à conservação dos ecossistemas aquáticos, acompanhada de um nível aceitável de risco relacionado a secas e cheias”, conforme definição da Organização das Nações Unidas (ONU).

Com uma disponibilidade hídrica superficial de 1,2 milhão de litros por segundo, sem considerar a contribuição dos rios Paraná e Paranapanema, o estado apresenta algumas deficiências, como demonstra o relatório. Segundo a ONU, o consumo per capita deve ser próximo de 1.500 m³ por habitante/ano, suficiente para atender às necessidades básicas da população sem que haja desperdício. Mas em duas regiões – a Bacia do Paranapanema I, no Norte, e a Unidade Hidrográfica do Alto Iguaçu e Afluentes do Ribeira, no Leste e Sul –, o déficit é de 215 e 431 m³/hab/ano, respectivamente.

A situação se mostra ainda mais crítica quando é desconsiderada a contribuição da Bacia do Ribeira. Nesse caso, o Alto Iguaçu, que compreende Curitiba e parte da Região Metropolitana, concentrando 30% da população estadual, contabiliza um déficit de quase 1.000 m³/hab/ano. De acordo com o relatório, 37% das sedes urbanas paranaenses apresentam algum déficit quanto à oferta de água à população, considerando a disponibilidade hídrica dos mananciais ou a capacidade dos sistemas de produção de água para atendimento das demandas futuras.

Investimentos são necessários

Como suprir esse déficit na oferta de água? Com investimentos da ordem de pelo menos R$ 644,5 milhões, como indica o Relatório de Conjuntura de Recursos Hídricos do Paraná. Desse montante, 7% seriam destinados ao Sistema Integrado da Região Metropolitana de Curitiba. A maioria das soluções propostas se refere a ampliações ou adequações dos atuais sistemas de produção de água, contemplando 126 municípios e investimento de R$ 469,9 milhões. Outros R$ 174,5 milhões se referem à adoção de novos mananciais em 20 sedes urbanas, entre elas Curitiba, Londrina e Cascavel.

O investimento necessário para resolver esse déficit, no entanto, é ainda maior. O relatório observa que “nesse montante não estão considerados os investimentos em futuros aproveitamentos hídricos para o sistema integrado de Curitiba que extrapolam o horizonte de 2025 e que deverão ocorrer nas áreas de interesse de mananciais delimitadas por meio do Decreto nº 3.411 do Governo do Estado do Paraná”.

De acordo com o relatório, seis grandes projetos fazem parte do planejamento do governo estadual para os próximos anos, visando contribuir com o aumento da vazão para abastecimento público: ampliação dos sistemas adutores de Foz do Iguaçu e Cascavel, a Barragem do Miringuava, em São José dos Pinhais, plano de aproveitamento de recursos hídricos para a RMC e estudos para aproveitamento de recursos em algumas bacias e de refinamento do Índice de Segurança Hídrica (veja os detalhes mais abaixo).

Incentivo ao consumo consciente

Para atender à atual demanda de recursos hídricos no Paraná são necessários cerca de 51 mil litros de água por segundo. Desse total, 42% se destinam ao abastecimento público, ou seja, para o consumo da população em geral. A indústria e a agropecuária aparecem a seguir como os principais consumidores. Em 2018, segundo o relatório, foi retirada uma média de 60,52 m³/s no estado, da qual 27,14 m³/s foi consumida. Para entender: a água retirada é o produto bruto total captado para uso, enquanto a consumida é aquela que não retorna aos corpos hídricos, em geral na forma de esgoto.

“Sendo o abastecimento público um grande uso de recursos hídricos no Estado, cabe a nós, consumidores desse recurso, iniciativas para diminuir a quantidade de água consumida por dia, sem comprometer o conforto e o atendimento às necessidades diárias”, diz trecho do relatório, citando que nos 346 municípios atendidos pela Sanepar cada pessoa consome, em média, 150 litros de água por dia. “Com bom senso e sem desperdício, esse número pode cair para 120 litros por dia, uma redução de 20%”, acrescenta o estudo.

Evitar o desperdício se tornou ainda mais importante em meio à estiagem que o Paraná enfrenta. Para o presidente do Instituto Água e Terra, Everton Luiz de Souza, além de orientar as ações a serem tomadas pelo governo para enfrentar o problema, o relatório também deve ajudar a promover o uso consciente da água. “Uma das diretrizes para a gestão das águas é a participação social, repassando dados para a sociedade. Quando a população entende melhor o uso da água e as demandas existentes, fica mais fácil ela se conscientizar para o uso racional”, defende.

Visando fornecer um retrato eficaz da gestão hídrica no Paraná, o relatório será atualizado anualmente. Segundo Everton, o objetivo é garantir um panorama constante dos recursos hídricos do estado, as demandas, sua utilização e a atuação dos comitês gestores das bacias hidrográficas. “Além de usarmos essas informações nas tomadas de decisão do instituto, o relatório é um instrumento valioso para a indústria e o agronegócio, por exemplo, que sabem da disponibilidade e da qualidade desses recursos”, conclui.

Seis projetos estão no planejamento do Paraná para aumentar a vazão de água para abastecimento público:

Ampliação do sistema adutor de Cascavel

Compreende a construção de uma barragem e estruturas de captação e adução do rio São José. A adutora de água bruta é projetada com 14,3 km de extensão e vazão de 0,7 m³/s, conduzindo as águas até a ETA existente (em fase de ampliação e modernização). As obras devem ser concluídas até o final do ano. Valor: R$ 76,4 milhões*

Barragem Miringuava

Construída em São José dos Pinhais, foi projetada para acumular um volume de 38 hm³, regularizar uma vazão de até 1,1 m³/s e atender demandas de abastecimento humano e irrigação na região. A previsão para término das obras é 2022. Valor: R$ 157,8 milhões*

Plano de aproveitamento dos recursos hídricos para a Região Metropolitana de Curitiba

O estudo a ser desenvolvido tem o objetivo principal de planejar as ações a serem executadas nos próximos anos na RMC e seu entorno, com foco no atendimento às demandas de abastecimento humano para a população da região. Valor: R$ 4,8 milhões*

Estudo de alternativas para o aproveitamento de recursos hídricos em áreas de baixo grau de segurança hídrica: bacias hidrográficas dos rios Paranaíba, Grande e Paranapanema

Visa definir alternativas de intervenções para o aproveitamento de recursos hídricos com o objetivo de suprir os déficits identificados nessas áreas. No Paraná, compreende as bacias Baixo Ivaí e Baixo Paranapanema. Valor: R$ 1,8 milhão*

Estudo de refinamento do Índice de Segurança Hídrica em unidades territoriais de análise

Objetiva confirmar os déficits hídricos identificados no Plano Nacional de Segurança Hídrica e atualizar informações de demandas, oferta e balanço hídrico. No Paraná, o projeto contempla a bacia do Alto Ivaí. Valor: R$ 800 mil*

* Custo estimado pelo Plano Nacional de Segurança Hídrica

Estiagem deve se manter pelos próximos meses

A estiagem que vem castigando o Paraná há meses já é considerada uma das piores da história do estado. Se o mês de junho trouxe um pouco de alento, com um volume de chuvas acima da média histórica, a primeira quinzena de julho manteve o sinal de alerta. Segundo dados do Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná (Simepar), o índice de precipitação ficou 60% abaixo da média. Um cenário que se torna ainda mais preocupante diante da previsão de que essa tendência será mantida ao longo dos próximos meses.

Segundo a Sanepar, a seca faz com que os níveis dos quatro reservatórios de água para abastecimento público na Região Metropolitana de Curitiba registrem uma média de 34%. Na Barragem do Iraí, a primeira a ser utilizada pela Sanepar, os níveis foram baixando mês a mês e, na primeira quinzena de julho, chegaram a 15%. No Passaúna, o nível é de 36,5%; Piraquara I, 33%; e Piraquara II, que é a última a ser utilizada e geralmente mantém-se elevada por mais tempo, está com 88%.

“Nos últimos 10 anos, nunca as barragens chegaram a níveis tão baixos. O mais preocupante é que os prognósticos de chuvas para os próximos meses não são promissores, mantendo-se a previsão de que teremos um volume muito abaixo da média histórica”, afirma o diretor de Meio Ambiente da Sanepar, Julio Gonchorosky. Com isso, a empresa vem mantendo rodízios semanais no abastecimento de água em Curitiba e RMC, interrompendo o fornecimento por períodos de 36 horas.

O rodízio reduz diariamente o fornecimento de água para 20% da população, com a meta de garantir níveis mínimos de reserva até o período das chuvas, previsto somente para depois de setembro. Além disso, a Sanepar antecipou obras e implantou captações emergenciais que aumentam o volume de água para abastecimento público, como a captação de água em cavas e pedreiras em Fazenda Rio Grande, Pinhais, São José dos Pinhais e Campo Magro.

De acordo com o Simepar, a tendência é de que os meses de agosto e setembro se mantenham sem ocorrência de chuva significativa, com médias inferiores às registradas tradicionalmente. Existe ainda a possibilidade de ocorrência do La Niña, fenômeno de resfriamento das águas do Oceano Pacífico que acaba gerando mudanças nos padrões de temperatura e precipitação. Apesar de a previsão indicar que o fenômeno tende a ser fraco, ele deve contribuir para a menor incidência de chuvas na Região Sul.

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