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"Foi dos piores dias da minha vida, pessoal e profissionalmente", resume a secretária municipal de Saúde, Márcia Huçulak, como foi a última sexta-feira (12), dia em que a prefeitura de Curitiba decretou lockdown de nove dias para frear o avanço acelerado da pandemia e, assim, desafogar os hospitais que já estão em colapso, alcançando 97% de ocupação dos leitos nesta segunda-feira (15).

A secretária narra que recebeu ligações de dirigentes das mais variadas entidades da área da saúde pressionando por uma medida mais severa. Entre eles, o presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), Roberto Yosida, preocupado com a maior de todas as sobrecargas dos hospitais desde o início da pandemia. No mesmo dia, foi informada pelo presidente da Sociedade de Terapia Intensiva do Paraná (Sotipa), Rafael Deucher, de que não havia mais médicos capacitados a atuar em UTIs para se contratar no Paraná. No seu gabinete, Márcia Huçulak também ouvia clamores dos próprios colegas de trabalho. "A minha equipe me dizia 'vai explodir, vai explodir'", admite a secretária de Saúde.

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Diante disso, Márcia cancelou uma entrevista com a Gazeta do Povo agendada dois dias antes para participar da reunião de emergência do Comitê Gestor da Pandemia da prefeitura. E na presença do prefeito Rafael Greca (DEM) na reunião, foi enfática: não havia mais nada a se fazer para tentar sair do colapso a não ser decretar o lockdown. Márcia Huçulak citou na reunião a abertura de leitos dias antes, na vigência do decreto restritivo do governo do estado acatado pela capital. Eram quase 300 leitos abertos até quarta-feira, todos ocupados em apenas dois dias.

"Em dezembro, isso duraria 15, 20 dias. Para, nossa surpresa, já na sexta-feira de manhã isso tudo estava ocupado", recorda a secretária municipal.

O momento é tão crítico, que mesmo pacientes de outras enfermidades que não seja a Covid-19 podem não ser atendidos pela sobrecarga nos hospitais. "Se, por exemplo, alguém andando de bicicleta cair e quebrar a perna ou bater a cabeça hoje corre dois riscos. Primeiro, o de ir ao hospital e pegar Covid-19. O segundo, de não ser atendido", enfatiza a secretária em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo. Confira:

Chegamos ao pior dos piores momentos da pandemia em Curitiba neste fim de semana, com 99% dos leitos ocupados. Por que chegamos a uma situação tão crítica?

Pessoalmente, nunca imaginei que chegaríamos a este momento em Curitiba, bastante crítico e de muita preocupação. No censo de hoje [segunda-feira], estamos com 97% de ocupação. Estamos no limiar e tudo é possível. A gente não consegue acompanhar o volume de pacientes que chegam. No Comitê da Pandemia discutimos o fato de que estamos lidando com uma nova Covid-19, com um novo comportamento da doença. O vírus que conhecíamos até dezembro/janeiro era um, o de fevereiro, da nova variante, é completamente diferente. Estamos aprendendo a lidar de novo com esse vírus, porque ele age de maneira muito rápida.

No perfil da Covid anterior, na onda de julho/agosto e depois de dezembro/janeiro, os casos positivos da doença aumentavam em uma semana. Na semana seguinte, subiam os números de internações. Só depois os leitos de UTI começavam a ser demandados. Agora, essas curvas se juntaram todas, é tudo ao mesmo tempo. E é uma população mais jovem atingida agora, que antes não internava. Temos agora uma avalanche de pacientes que já no terceiro dia chega muito mal na UPA, chega direto para ser intubado. A demanda por leito de UTI, oxigênio, medicamentos, droga de intubação cresceu exponencialmente.

Para se ter ideia, a gente consumia nas UPAs 420 metros cúbicos de oxigênio por dia. Saltamos agora para para 3,5 mil metros cúbicos por dia. Ainda bem que as UPAs de Curitiba tem rede de gases. Quem depende de torpedo de oxigênio hoje não dá conta porque dura só de duas a três horas. E esses pacientes, pela gravidade, demandam alto fluxo de oxigênio, o que os torpedos não dão conta. O cilindro de oxigênio fornece 5 litros ou 6 litros por minuto. Temos pacientes que estão usando 15 litros, 20 litros por minuto. A demanda agora é muito grande.

O prazo de nove dias de lockdown vai ser suficiente para aliviar a transmissão do vírus e, consequentemente, a sobrecarga nos hospitais? Há alguma projeção?

A gente fez o lockdown justamente porque tanto a transmissão quanto o número de casos ativos estão muito altos. O que nos chamou muito a atenção foi o quantitativo de óbitos. Sábado, por exemplo, foram 34 óbitos e isso não é normal. Todo nosso objetivo do lockdown é de que a sociedade precisa dar uma parada. Mas só vamos conseguir avaliar daqui uma semana. Não é possível fazer essa avaliação agora. E infelizmente estou muito triste com o que estou vendo hoje com Curitiba.

O que está deixando a senhora preocupada?

Estou vendo que a movimentação permanece, que as pessoas não estão aderindo ao lockdown. A gente sabe que é muito difícil, que as pessoas estão cansadas de medidas restritivas. E é muito chato para nós fazermos isso. Mas eu e todos os outros profissionais de saúde escolhemos salvar vidas e faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para isso. Sei que tem a crítica do comércio. Mas não há comércio sem vida. Sei que tem muita gente perdendo emprego e renda, mas nossa opção é sempre pela vida. Sexta-feira, a gente ponderou muito no comitê que era o momento de dar esse alerta para a população. O lockdown é um pedido de socorro do serviço de saúde.

Havia possibilidade de o lockdown ter sido adotado antes?

A gente tinha adotado o decreto restritivo do governador que terminou na última quarta-feira. Na terça-feira a gente se reuniu e já tinha percebido na semana anterior a necessidade de fazer reestruturação do sistema, o que já estava no nosso Plano de Contingência de Enfrentamento da Pandemia. Na terça, inclusive, fiz entrevista coletiva anunciado a virada das UPAs.

Tenho sido muito criticada por não ter feito hospitais de campanha, mas nossos hospitais de campanha estão aí: são os quase 300 leitos que temos nas UPAs hoje. As UPAs têm estrutura já pronta: laboratório, raio-X, rede de gases, medicação e protocolos já instituídos. É muito mais fácil [do que montar hospitais de campanha]. Então ganhamos praticamente 240 leitos assim [estalando os dedos], em poucas horas. Digo que abri dois hospitais de campanha em menos de 12 horas. A gente recebeu quarta-feira 50 respiradores e monitores que já tínhamos comprado emergencialmente, achando que a gente conseguiria levar dessa forma por mais uma semana, com 240 leitos de enfermaria, mais 50 de UTI.

Lá em dezembro, isso duraria 15, 20 dias. Para, nossa surpresa, já na sexta-feira de manhã isso tudo estava ocupado. Foi como jogar água numa terra que chupa tudo imediatamente. Não sobrou nada. Não tinha um leito desses sequer sexta-feira.

A senhora pode contar um pouco como foram os bastidores dessa decisão do lockdown?

Estávamos de novo num pré-colapso do sistema e as pessoas todas dizendo que tínhamos que fazer alguma coisa.  No mesmo dia recebi ligação do doutor Roberto Yosida, presidente do Conselho Regional de Medicina, preocupado. Conversei também com o presidente da Sociedade de Terapia Intensiva do Paraná, o doutor Rafael Deucher, que disse que não tinha mais médico intensivistas. Conversei com o Conselho Regional de Enfermagem, com vários diretores de hospitais da rede privada, todos também apelando que precisávamos fazer alguma coisa porque o sistema estava colapsando. Conversei com outros dirigentes e, enfim, minha equipe me disse que não ia mais dar conta. Me diziam “vai explodir, vai explodir”.

Aí pedi reunião emergencial do comitê para à tarde e disse “vamos ter que tomar uma medida”. E todo o comitê concordou que precisávamos sinalizar para a sociedade que o momento é gravíssimo. Nunca imaginei passar por isso na minha vida. Demos conta dos picos da pandemia em julho/agosto, demos conta de novembro/dezembro, mas estamos muito preocupados agora de que o sistema não vá conseguir.

As pessoas chegam aos borbotões. Fizemos a virada na quarta, quando acabou o decreto estadual com medidas restritivas anteriores, e na sexta era como se não tivesse acontecido nada na cidade por essa velocidade que a gente está vendo, de paciente chegando na assistência já muito mal, demandando oxigênio, inclusive jovens. É um perfil diferente do que víamos e por isso tomamos a medida do lockdown.

Mas não poderia ter sido tomada antes a decisão do lockdown

O cenário não apontava para isso. Inclusive, a nossa bandeira apontava laranja, não vermerlho. Não apareceu nada que a gente pudesse identificar essa velocidade que a doença está vindo. Ela vem com uma velocidade completamente diferente.

Pegou vocês de surpresa? 

A doença agora é diferente. É um tsunami. Os números não subiram devagarzinho, como das outras vezes. Basta ver os óbitos: 34 na sexta, 31 no sábado. É uma avalanche de pessoas muito mal.  E o perfil é diferente na gravidade. Esse paciente mais jovem permanece mais tempo em UTI, tanto pela melhora quanto pela piora, porque ele tem maior resistência. A nossa média de ocupação de UTI aumenta e isso demanda muito. Estava conversando com todos os prestadores no sentido de a gente não conseguir correr atrás e abrir leitos. Acabei de falar com o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto, pedindo apoio e equipamentos, porque a gente não dá conta mais. As equipes estão exauridas, muito cansadas.

A senhora acabou de falar que nunca imaginou que precisaríamos ativar a parte mais extrema do Plano de Contingência, que foi transformar as UPAs em prontos-socorros para pacientes graves de Covid-19 por não ter mais leitos de UTI nos hospitais. O sistema de saúde curitibano ainda consegue se organizar para além disso caso o quadro piore ainda mais ou ele já está completamente exaurido e não há mais o que fazer?

A dificuldade atual são recursos humanos. Abrimos 10 leitos de UTI sexta-feira, no Hospital do Idoso. Mas essa abertura requer recursos humanos, não adianta ter respirador, o monitor, a bomba de infusão, a droga e o oxigênio para monitorar e aplicar no paciente se não houver quem faça isso. As pessoas viram as cenas de pronação, técnica que a pessoa é posta de bruços para ajudar pacientes com insuficiência respiratória. Essa técnica requer cerca de oito profissionais por paciente e é feita várias vezes ao dia em vários pacientes. Imagina fazer isso em 60 pacientes em um hospital e ainda ter que cuidar deles de outras maneiras. Agora a gente tinha contratado uma nova equipe de UTI. Dois médicos avisaram que não iriam assumir o cargo antes mesmo de começar e dois pediram demissão. Isso porque os profissionais de saúde estão esgotados física e emocionalmente. É muita gente doente chegando ao mesmo tempo. Estamos sem equipe.

A Casa Irmã Dulce, que é de atendimento psiquiátrico e foi reaberta em julho de 2020, está sendo usada para tratar pacientes com Covid-19. Os pacientes psiquiátricos foram transferidos de local sábado à noite e agora a Casa se encontra lotada de pacientes Covid. Estamos tentando abrir mais espaços para o tratamento do coronavírus, mas nossa dificuldade no momento é de recursos humanos.

A senhora chegou a requisitar profissionais de psiquiatria para atender casos de Covid?

Essa unidade psiquiátrica tem médicos clínicos, técnicos de enfermagem e enfermeiros. Então para um caso ou outro eles ajudam no atendimento da Covid-19. E o médico psiquiatra está atendendo outras atividades. Estamos requisitando pessoal porque estamos no limiar das forças humanas. Neste momento não há mais médicos intensivistas e enfermeiros. Estamos fazendo chamadas por processo seletivo simplificado, a nossa fundação estatal está com todos os editais abertos. No entanto, as pessoas não vêm.

Os pacientes de Covid-19 já estão ocupando leitos de outras enfermidades. Qual o efeito disso no sistema de saúde geral?

Isso causa dificuldade no atendimento. Então se alguém cair e quebrar a perna ou ter uma apendicite, vai ter dificuldade em ser atendido. Eu estava discutindo, há pouco, com o secretário Beto Preto e com os diretores de hospitais que estão acabando algumas drogas vasoativas e medicamentos para intubação. Não é que não compramos, é a empresa que não consegue mais nos atender porque há demanda no Brasil inteiro, não somente na nossa cidade. Todos os estados - com exceção da Amazônia, que já passou por essa fase - estão com estrangulamento.

Infelizmente, o Brasil tem um problema sério, as matérias primas de algumas drogas são importadas. As pessoas nos agridem até e dizem que a secretaria não se preparou. Mas eu não tenho como dizer para empresa que não está dando conta da demanda atual que ela não se preparou. A demanda de oxigênio cresceu 10 vezes. Na Santa Casa, o que se usava antes em um mês de rocurônio [medicamento que junto com a anestesia facilita a intubação dos pacientes], hoje se gasta em dois a três dias. Hoje são usadas mil ampolas por dia, sendo que antes esse era o consumo de quase 15 dias.

Em relação a gravidade do sistema como um todo, a senhora chegaria ao ponto de alertar a população a evitar um ferimento porque pode não haver atendimento para outras enfermidades que não a Covid-19?

Já fizemos esse apelo, que é o lockdown. Se, por exemplo, alguém andando de bicicleta cair e quebrar a perna ou bater a cabeça hoje, corre dois riscos. Primeiro, o de ir ao hospital e pegar Covid-19. O segundo, de não ser atendido. Esse, aliás, é outro fator que tratei na reunião de hoje cedo. O diretor do Instituto de Biologia Molecular do Paraná - laboratório que faz os exames PCR - me mandou assustado o quadro da positividade dos exames que temos hoje. Está em quase 50% de positividade. De cada duas pessoas que fazem o teste, um dá positivo. A cada duas pessoas que chegam na UPA com sintomas respiratórios, um é Covid-19. Nunca tivemos uma positividade tão alta em Curitiba como agora, nem na onda de julho, nem na onda de dezembro, que bateu a casa de 37% de positividade. Não há sistema de saúde que consiga dar conta da demanda atual.

Semana passada, a Federação dos Hospitais do Paraná fez um alerta à Comissão do Coronavírus na Assembleia Legislativa do risco não só do colapso clínico, mas também do colapso financeiro dos hospitais, que além da alta demanda de leitos, estão vendo os preços de medicamentos, insumos e equipamentos explodirem. Ele chegou a citar que um medicamento que custava R$ 30 no início da pandemia agora está R$ 300. Também citou que não se encontra mais bomba de infusão [equipamento que leva o medicamento do soro ao braço do paciente] e quando se encontra é em um preço exorbitante, de R$ 8,5 mil. A senhora e o prefeito Rafael Greca sempre falaram, ao longo de toda a pandemia, que o caixa do sistema de saúde de Curitiba é robusto. Mas o caixa da Secretaria Municipal de Saúde consegue aguentar essa explosão dos preços de insumos e medicamentos?

Para se ter ideia, agora só se encontra bomba de infusão por R$ 10 mil e para entregar só daqui 15 a 30 dias. Mas hoje não tenho dificuldade orçamentária e financeira. Temos um fundo de emergência que nos apoia neste momento. Mas como tudo na vida, é finito. Uma máscara que a gente pagava antes da pandemia R$ 0,05, custa agora R$ 2. Tudo subiu, os custos hospitalares e das drogas. Então, todos nossos contratos tiveram que ser aditivados, tivemos que fazer novas compras de medicação, tudo que você imaginar. É mais gente trabalhando, mais insumos de proteção individual, eu preciso proteger a nossa equipe com mais máscaras. O custo é crescente.

Mas nossa dificuldade hoje em Curitiba, felizmente, diferente de alguns municípios. Não é orçamentária e financeira ainda. Pode ser que a gente possa enfrentar essa dificuldade. A nossa dificuldade mesmo é que os fornecedores não conseguem atender a velocidade da demanda. A gente tem conversado e eles têm sinalizado a preocupação de que, se continuar nessa velocidade, vamos ter problema de assistência. Não porque a gente não comprou insumos e medicamentos, não porque a gente não previu. Por exemplo, são dois laboratórios que fornecem para o Brasil inteiro os neurobloqueadores. E eles já conversaram conosco na semana passada dizendo que se continuar nessa velocidade não vão conseguir atender todos os pedidos dos contratos que temos. Então, não é porque a gente não pediu, não comprou ou não pagou. É porque os fornecedores não dão conta. Até porque eles dependem de insumos importados para a fabricação de muitos medicamentos, ampolas, e outros produtos que são necessários para manter o paciente intubado.

A senhora falou que o caixa não tem problema hoje, mas que pode ter problema se as transmissões continuarem aceleradas. A prefeitura tem o Fundo Emergencial da Pandemia, com R$ 100 milhões, cujo foco principal é a aquisição de vacinas por parte do município para reforçar o Plano Nacional de Imunização do Ministério da Saúde. Há  risco de se chegar no nível em que o orçamento da Secretaria da Saúde vai ter que pegar dinheiro desse fundo da imunização para poder socorrer a assistência médica?

É possível. Acho que a gente já tem avançado um pouquinho nesse fundo. Porque já fizemos pedido de suplementação dos recursos para a Secretaria de Finanças, por conta de todo esse gasto.

Há risco de acabar as vacinas na próxima quinta-feira (18) se não chegar outra remessa do Ministério da Saúde nos próximos dias?

Tive notícia de que deve chegar entre amanhã (16) e quarta-feira (17) uma nova remessa. Parece que o Butantan estava entregando para o Ministério da Saúde mais 3 milhões e poucas doses da Coronavac. A gente está aguardando. O estado me confirmou que entre terça e quarta-feira a gente deve receber uma nova remessa.

Mas se não chegar, acaba e a vacinação é suspensa novamente, correto?

Sim. Aí não tem mais até chegar outra remessa.

O prefeito encaminhou semana passada e devem ser votados na Câmara de Vereadores com urgência essa semana os dois projetos de compra de vacinas. Um prevê que a prefeitura compre por conta própria os imunizantes e o outro permite que o município entre no consórcio das municípios de todo Brasil para comprar doses. Se a gente conseguir fazer a aquisição por conta própria, que salto a senhora acha que Curitiba pode dar na imunização?

O grande erro do país foi não ter apostado na vacina. Chegamos por último nesse processo, infelizmente. Um país como o nosso está vivendo com essa variante, que não aconteceria se a gente tivesse conseguido avançar nos grupos de vacinação. Por isso o nosso prefeito tem sido incansável nas tratativas diretas com os laboratórios para conseguir vacinas. A vacina é a saída que a gente tem nesse momento. Digo desde o primeiro dia que a pauta da esperança é a vacina. É o que a gente sabe. Os Estados Unidos vacinaram em um dia 4 milhões de americanos. Temos capacidade no Brasil de também vacinar 4 milhões de pessoas por dia.

Qual a capacidade de vacinação de Curitiba?

Se tivéssemos vacina, aplicaríamos até 20 mil por dia. Temos 100 unidades de saúde. A gente põe vacina em todo lugar, a gente chama voluntariado, a sociedade vai ser parceira, abre mais drive-thru. O pessoal critica que a gente não põe velocidade na vacinação, mas ninguém acelera um carro sem combustível. Hoje, essa é a nossa dificuldade. Estamos empurrando esse carro com um pouquinho de vacina.

Recebemos semana passada 19 mil ou 20 mil doses para cinco dias. Não adianta eu botar fogo na minha equipe, quase matar todo mundo de trabalhar com essa quantidade. Porque esse mesmo profissional que está no Barigui, no drive-thru, dá plantão na UPA também e me ajuda em várias frentes.  Não adianta pôr velocidade e acabar em dois dias. Essa quantidade de doses que recebemos eu aplicaria em um dia em Curitiba.

Então, tem que ser em processo gradativo para não estressar as equipes e também, nesse momento que já está estressante, para não criar alvoroço com a população. Porque vacinar tudo em um dia e no outro dia parar tudo é muito ruim também. A gente tem feito gradativo pelo número de doses que tem recebido.

Semana passada, o município convocou toda a equipe da Secretaria de Saúde para agir no combate ao coronavírus. Por que houve essa necessidade e como vai ser usado esse pessoal que não estava no enfrentamento da Covid-19?

Por exemplo, toda a equipe de odontologia, já que a gente parou as unidades, está me ajudando no drive-thru do Barigui. Pelo menos para fazer cadastro, receber o paciente, em atividades de apoio, relatórios. Também pus todo esse pessoal na minha central da Covid-19 e tirei todos os profissionais de lá para a linha de frente. Tive que reforçar as UPAs porque viraram hospitais, com isso, tive que reforçar todas as escalas não só das UPAs, mas também das outras unidades de saúde. Toda parte da coordenação de programa parou, inclusive aqui do prédio da secretaria, e foi aplicar vacina para liberar o profissional que estava fazendo vacina para atuar em plantão em UPA ou reforçar as equipes de atendimento à população.

Por isso, a gente tem colocado também pessoas que estavam cedidas para instituições, para áreas administrativas, para virem nos ajudar nesse momento. E posso requisitar mais se for necessário.

Qual é o impacto no sistema público dos pacientes que a rede particular de hospitais não está conseguindo atender?

A gente não consegue nem medir porque nunca se pergunta para o cidadão que chega na UPA ou qualquer outra das nossas unidades se ele têm plano de saúde ou não. Muitas vezes quando o paciente precisa internar é a família que informa que ele tem convênio para ajudar na busca de vaga. Só que agora todos os hospitais estão esgotados. Fiz até um decreto semana passada para que a rede privada apresente seu plano de contingência, numa grande rede de colaboração, para que ninguém morra sem assistência.

Que recado a senhora deixaria não só para quem está se tratando de Covid-19, mas para quem está sofrendo com a outra ponta da pandemia, com seus estabelecimentos fechados, ou sem poder trabalhar, se sacrificando para que possamos vencer esse momento?

Não é nada fácil fazer o lockdown. Sexta-feira, quando anunciamos o lockdown, foi dos piores dias da minha vida, pessoal e profissional. Mas precisávamos fazer isso para protegermos vidas. Infelizmente esse vírus adora circulação de pessoas. É dessa forma que ele mais se prolifera. Portanto, precisamos estancar essa transmissão a despeito das pessoas não terem onde serem atendidas. Não importa se você é rico, pobre, se tem convênio médico, se não tem: não tem mais onde internar.

Portanto, nesse momento, as pessoas também podiam ser solidárias. Se sua diarista não vai trabalhar no lockdown, pague a diária mesmo assim. Pague a sua manicure essa semana mesmo sabendo que você não pode fazer a unha ou doe uma cesta básica para ela. O garçom do restaurante que você costuma ir, mande uma cesta básica ou a gorjeta que você daria para ele após a refeição. É o jeito que a sociedade pode colaborar. E o curitibano é solidário. Precisamos nos ajudar. Ajudar os profissionais de saúde que estão exauridos e essas pessoas também.

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