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Depois de cada sessão, é feita uma higienização da sala.
| Foto: Divulgação/IMAX

Na chegada ao Cine Passeio, um dos poucos espaços de cinema que resolveram reabrir para sessões neste momento da pandemia, somos recebidos por três funcionários, todos usando máscara e face shield. Um deles mede a temperatura com um dos conhecidos termômetros laser (“no punho, por favor”), pergunta se o ingresso já está comprado e relembra que a máscara deverá ser usada o tempo todo nas dependências do edifício. Um totem de álcool em gel fica no meio do caminho, impossível de ser ignorado.

Na fila da bilheteria marcações no chão indicam o distanciamento que as pessoas devem ter umas das outras. Um metro e meio em média. Com o mínimo de contato possível, compramos o ingresso. Ao selecionar a cadeira, o sistema bloqueia imediatamente todas as cadeiras do entorno – pense no movimento do Rei no tabuleiro de xadrez –, para que, dentro da sala, o distanciamento seja mantido.

Até aí, a experiência não é diferente do que se convencionou chamar de “novo normal”, as novas regras de convivência que se impuseram sobre o mundo. É da porta do cinema para dentro que a coisa muda de figura. Afinal, trata-se de ambiente fechado onde, pela lógica interna de uso, não dá para ficar pouco tempo, como em um supermercado ou (teoricamente) em um shopping.

Com exceção de uma mesa de bar, em que o consumo de alimentos e bebidas exige a retirada da máscara e os gritos e gargalhadas potencializam o espalhamento das perigosas gotículas de saliva, a sala de cinema talvez seja um dos mais perigosos lugares em relação ao coronavírus. Ambiente fechado e que um grupo de pessoas ficará confinado por pelo menos uma hora. As medidas de segurança sancionadas pela Anvisa e devidamente aplicadas às salas que abriram, porém, tornam a sessão bastante segura.

Protocolos

A maioria das salas de cinema de Curitiba está trabalhando mais ou menos com os mesmos protocolos de segurança. As variações são mínimas. O Cine Passeio, por exemplo, escolhe o bloqueio das cadeiras pelo sistema. Para evitar que pessoas troquem de assento ou retirem suas máscaras durante a sessão, dois funcionários ficam na sala o tempo todo, em uma espécie de retorno da figura do ‘lanterninha’. “Uma sessão lotada hoje tem 26 pessoas. De 88 para 26. E acho que deve ser assim mesmo”, diz Juliana Pedrozo, gerente do espaço.

Bilheteria informa os clientes sobre as medidas de distanciamento.
Ao comprar o ingresso, o espectador é informado das regras de distanciamento entre as cadeiras.| Daniel Castellano

O IMAX, que fica dentro do Shopping Palladium em Curitiba, optou por outro esquema. As cadeiras ficam bloqueadas tanto no sistema quanto fisicamente na sala, com uma faixa vermelha onde se lê “poltrona bloqueada IMAX”.

Tirando isso, as medidas são mais ou menos as mesmas. “Os protocolos foram estabelecidos para a Europa e depois exportados para os Estados Unidos e então para a América Latina. Então são muito próximos”, diz Pedrozo. Depois de cada sessão a sala é aberta por 30 minutos e ventilada. Um funcionário paramentado entra sozinho com um nebulizador e todas as superfícies são sanitizadas, com especial atenção para as superfícies que tiveram contato humano. O processo fez com que quantidade de sessões tivesse que ser reduzida. Duas por sala, por dia, no Passeio e três por dia no IMAX.

Alimentos devem ser consumidos do lado de fora das salas de cinema.
Entre as novas regras está a proibição de consumir alimentos dentro das salas, para evitar que as pessoas tirem as máscaras.| Daniel Castellano

“É quase uma coreografia que tivemos que ensaiar para poder seguir todos os protocolos”. Depois, as salas ficam fechadas, com o produto agindo. O ar-condicionado é religado para que haja climatização e então, 15 minutos antes da sessão, é aberta novamente para a entrada do público. Uma das principais mudanças está no sistema de ventilação, que não pode mais contar com reciclagem do ar e sim com renovação constante. “Alguns clientes chegam a reclamar do calor, mas é necessário”, complementa Pedrozo.

Apesar de ser o mesmo sistema de ar-condicionado, aprovado pela Anvisa desde antes da pandemia, a necessidade de ar fresco faz com que seja mais difícil e caro o processo de refrigeração. Ele passou por uma grande manutenção, com limpeza dos dutos e a instalação de uma pastilha bactericida que dura 90 dias. Ficar em uma sala de cinema, com os novos parâmetros de segurança, é quase tão seguro quando ficar ao ar livre.

Iniciada a sessão com todos acomodados, um longo vídeo repassa todas as medidas de segurança sanitária, com reforço para, por exemplo, que cada pessoa vá sozinha ao banheiro. Por fim, um aviso: a saída será dada por filas para evitar aglomeração nas portas, em que pode haver um afunilamento. Ir ao cinema em 2020 ficou bem parecido com fazer uma viagem de avião.

Depois de cada sessão, é feita uma higienização da sala.
Depois de cada sessão, a sala é aberta por 30 minutos e ventilada. Um funcionário paramentado entra sozinho com um nebulizador para sanitizar todas as superfícies.| Divulgação/IMAX

Amor ao cinema

“A gente está voltando pelos clientes, pelo público”, diz Edson Garcia, gerente do IMAX. Eles são a outra sala de cinema que resolveu abrir na última semana de outubro, quando o decreto municipal permitiu que as sessões ocorressem. Até o fechamento desta edição, a maioria das salas segue fechada – redes Cinemark (Mueller e Barigui), Cinesystem (Curitiba e Ventura), UCI (Palladium) e Cinépolis (Pátio Batel e Jockey Plaza), além do Itaú (Crystal) e Cineplex Batel (Novo Batel). Ao menos por enquanto, por uma questão simples de solvência.

Não é exatamente um segredo que o faturamento das salas de cinema é dado mais pelo consumo de pipoca e refrigerante do que pelo ingresso. Como o decreto impede que alimentos sejam consumidos durante as sessões, pois implica a retirada das máscaras, reabrir agora é um mau negócio. Tanto que além do Cine Passeio e do IMAX, apenas o CinePlus, dos Shoppings Água Verde e Jardim das Américas, está aberto e com programação inédita já na primeira semana – o Cine Passeio resgatou os filmes de Christopher Nolan para aquecer para o lançamento na semana seguinte de Tenet, que seria a grande estreia da temporada, não fosse a pandemia.

Por isso, a bomboniere do IMAX Palladium, mesmo que já conte com barreiras de proteção de acrílico transparente, seguirá fechada. A capacidade foi reduzida para 50 pessoas, o que fará com que cada sessão seja deficitária, já que o valor seguirá, ao menos por enquanto, o mesmo de antes do fechamento dos cinemas. Garcia pensa que um eventual aumento, como aconteceu em algumas salas do Rio de Janeiro e São Paulo, “é compreensível, mas pode ser visto como oportunismo”.

O café do Cine Passeio está aberto, mas o consumo de alimentos deve ser feito exclusivamente fora das salas de cinema – e, mesmo assim, o Cine Passeio conta com apoio da Prefeitura de Curitiba, o que não necessariamente garante o funcionamento, mas ajuda. Pedrozo pensa que reabrir agora é uma questão de humanidade, acima de tudo. “Aqui é um lugar de encontro. De troca. De viver a experiência da sala cinema. Para além dos protocolos da Covid, eu não queria que isso fosse deixado de lado. A gente quer que o público reative essa memória do que é estar na sala de cinema”.

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