Arte Urbana

A presença de Poty: as obras do artista espalhadas por Curitiba

Yuri Casari, especial para a Pinó
19/03/2022 10:05
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Poty representou em suas obras o passado e o presente da Curitiba do século XX. | Leo Flores

A velocidade da vida metropolitana poderia fazer com que os murais e painéis passassem despercebidos, mas o “efeito Poty” tem o poder de fazer justamente o contrário: parar olhares de transeuntes e congelar, mesmo que por alguns segundos, o tempo. Integradas ao cotidiano da metrópole, quase um quinto das obras do mais representativo artista curitibano estão espalhadas por toda a cidade. São pontos de referência para localização e também inspiração. Por isso, no mês de aniversário de Curitiba, que comemora 329 anos no próximo dia 29, a escolha pela obra de Poty para ilustrar a capa da Revista Pinó se tornou inevitável.
Desenhista, Poty inicialmente ganhou notoriedade ilustrando livros. É dele, por exemplo, as ilustrações da primeira edição de “Grandes sertões: veredas”, de Guimarães Rosa, um dos maiores clássicos da literatura nacional. Posteriormente, passou a esculpir o concreto e a formar imagens a partir de azulejos pintados. Se tornou um muralista de renome que transformou a arte urbana de Curitiba.
17% da produção artística de Poty estão nas ruas, compondo a paisagem urbana de Curitiba, segundo pesquisa de Walmir José Braga de Faria Junior (UFPR).
A primeira empreitada pública nas artes plásticas foi logo um dos murais mais importantes de sua carreira: “Desenvolvimento histórico do Paraná”, um painel de 3mx30m, com desenhos em azulejos nas cores azul e branco, que fica localizado na Praça 19 de Dezembro, no Centro. A criação foi encomendada pelo então governador Bento Munhoz da Rocha, em comemoração ao primeiro centenário de emancipação política do Paraná, em 1953.
Esculpindo pedras ou pintando azulejos detalhadamente, Poty deixou sua marca em diversos pontos da capital.
Esculpindo pedras ou pintando azulejos detalhadamente, Poty deixou sua marca em diversos pontos da capital.
Igualmente marcante foram os anos finais da vida artística de Poty, na década de 90. Os murais em azulejo localizados na Travessa Nestor de Castro, no Largo da Ordem, e produzidos nos anos de 1993 e 1996, estão gravados na memória das gerações mais novas. Enquanto “Largo da Ordem - cenário da imigração” traz à tona o imigrante como parte indissociável do nascimento da Capital, a obra “Curitiba e sua gente” apresenta a contemporaneidade curitibana naquele que é tido como o maior mural cerâmico do Brasil, com 490m².

Destinos cruzados

A sinergia de Poty com Curitiba parece até mesmo ser uma questão de destino. Não pode ser só uma coincidência que ele tenha nascido justamente em um dia 29 de março, o de 1924. “Não sei se é bom ou ruim comemorar aniversário com a cidade. De qualquer forma, não é culpa minha”, afirmou ao jornal Folha de São Paulo, em 1998, na entrevista que é considerada como a última antes de falecer, no dia 7 de maio daquele ano.
Outra obra icônica do muralista pode ser apreciada na Praça 29 de Março, que tem o nome em óbvia referência à data de fundação da cidade. O mural “História de Curitiba” é um paredão de 300m² que apresenta elementos do folclore ao registro de símbolos históricos como a erva mate, a Catedral Basílica de Curitiba e o prédio da UFPR. A praça tem uma curiosidade pertinente: antes de sua criação, na década de 60, o local no bairro do Mercês era um campo de futebol. Ali, mandava seus jogos uma equipe fundada em 1925, de nome Poty.
O painel da Praça 19 de Dezembro foi o primeiro grande mural do artista<br>curitibano.
O painel da Praça 19 de Dezembro foi o primeiro grande mural do artista<br>curitibano.
Passear por Curitiba é como visitar uma exposição de Poty Lazzarotto, como ficou conhecido Napoleon Potyguara Lazzarotto. É possível apreciar as obras do artista no Largo - nascedouro da cidade -, no Teatro Guaíra, na Rua XV de Novembro, no Centro Cívico e em vários outros CEPs. Mesmo ao chegar ou partir da capital pelos ares, lá está Poty, com os painéis “A viagem” e “O eterno sonho”, no Aeroporto Afonso Pena.
Além da presença constante, outro aspecto que chama a atenção na arte de Poty é a atemporalidade. Mais do que contar a longínqua história, seus murais refletem o desenvolvimento da Capital durante todo o século XX. Símbolos modernos e urbanos como as estações-tubo e a Rua 24 Horas dividem espaço com o trabalho rural, base econômica e social do que viria a ser uma metrópole. As obras de Poty são um elo da Curitiba de ontem com a Curitiba que vivemos hoje.

Olhar do fotógrafo

490 m² é o tamanho do mural “Curitiba e sua gente”, no Largo da Ordem.
490 m² é o tamanho do mural “Curitiba e sua gente”, no Largo da Ordem.
Na terceira da série de doze capas da Revista Pinó dedicadas às obras de arte curitibana espalhadas pela cidade, o fotógrafo Leo Flores mirou suas lentes para o trabalho de Poty Lazzarotto. Mesmo já tendo fotografado os murais em outras ocasiões como parte de suas composições, Leo teve uma nova percepção. “Eu me impressionei muito com a quantidade de detalhes, a quantidade de histórias. Nunca tinha parado para ver como tem muita informação em cada um dos murais.”
Justamente pela complexidade e tamanho das obras, houve um desafio em conseguir expressar a representatividade através de fragmentos. “A intenção é mostrar as obras em detalhes, a beleza delas e como estão inseridas na cidade. No caso do Poty foi isso. Parei, vi todo o painel para entender o que tinha ali de histórias e de mensagem, para aí sim, clicar.”
Segundo Leo, a arte de Poty Lazzarotto faz parte, inclusive, de sua identidade como fotógrafo. “Eu enxergo que o Poty é muito responsável pela formação imagética de todos os curitibanos. Quando a gente sai pela cidade é impossível não tropeçar pelos murais espalhados pela cidade. Ele usa muitos símbolos, que reforçam nossa própria história e cultura. Tudo isso que ele usa dentro dos desenhos e murais, tento traduzir na minha fotografia quando busco mostrar o que é Curitiba.”

Por aí

Conheça oito murais imperdíveis de Poty Lazzarotto:
As obras de Poty são o símbolo máximo da arte urbana de Curitiba.
As obras de Poty são o símbolo máximo da arte urbana de Curitiba.
  • “Largo da Ordem - cenário da imigração” (1993) e “Curitiba e sua gente” (1996, na foto ao lado), ambos localizados na Travessa Nestor de Castro, no Largo da Ordem.
  • “Desenvolvimento histórico do Paraná” (1953), na Praça 19 de Dezembro, centro.
  • “História de Curitiba” (1966), localizado na Praça 29 de Março, no bairro Mercês.
  • “Evolução do Saneamento Básico” (1996), de 23mx6m, localizado na Praça das Nações, no Alto da XV.
  • “A viagem” (1996) e “O eterno sonho” (1980), ambos no Aeroporto Afonso Pena, em São José dos Pinhais.
  • “Monumento ao guarda-freios” (1983), de 2,36mx4m, localizado na Praça Isaac Lazzarotto (homenagem ao pai de Poty), no bairro Cristo Rei.