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Uma pesquisa realizada em Curitiba com o objetivo de medir a democracia em nível local traz resultados que podem soar desconcertantes aos que adotam a habitual postura de botar na conta do governo – assim, de modo genérico – todas as falhas do sistema democrático. Realizada pelo Instituto Atuação, a pesquisa batizada de Índice de Democracia Local (IDL) apontou que as maiores lacunas da democracia em Curitiba estão mais relacionadas a ações da sociedade que das instituições políticas. 

Essa foi a primeira vez que a pesquisa foi aplicada. O levantamento foi inspirado em uma metodologia da Economist Intelligence Unit, adaptada pelo Instituto Atuação.

De modo geral, Curitiba atingiu 49,5% de pontuação no IDL. Os melhores desempenhos foram nas dimensões de direitos e liberdades civis (64,2%), funcionamento do governo local (56,3%) e processo eleitoral e pluralismo (65,6%). Já os piores resultados foram em participação política (22,3%) e cultura democrática (38,9%). 

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Em participação política, dimensão em que a cidade teve o pior desempenho, foram avaliadas a participação eleitoral e comunitária. Nesse ponto percebe-se, por exemplo, que apenas 27,7% da população entrevistada exerceria o direito ao voto caso ele não fosse obrigatório.

“Isso dá a impressão de que o voto se reduziu a uma mera obrigação legal, em vez de significar uma oportunidade de participar da transformação política”, diz a análise do Instituto Atuação publicada no relatório da pesquisa. 

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Outro dado que chama a atenção em relação à fraca participação política é o fato de 90% dos entrevistados nunca terem participado de audiência pública ou de reuniões realizadas na Câmara de Vereadores e 77% nunca terem ido a um protesto político. 

Cultura democrática

Para medir cultura democrática – o outro ponto em que a cidade foi mal avaliada – a pesquisa examinou três pontos: normas e valores – que são as crenças que as pessoas têm sobre temas relacionados à sociedade, à política e às relações de confiança; vida comunitária; e conhecimento político. Neste ponto, o pior desempenho da cidade foi em conhecimento político (26,6%). 

Quando perguntados sobre qual ramo do Estado era majoritariamente responsável pela criação e aprovação das leis municipais, 60,8% dos entrevistados não souberam responder que se tratava do Poder Legislativo. O mesmo problema aconteceu quando se perguntou sobre o Executivo (60%). 

Uma questão preocupante revelada pela pesquisa é que apenas 0,3% dos entrevistados declararam não ter certeza sobre as atribuições primárias da prefeitura. Ou seja, os curitibanos não sabem que não sabem quais as funções das instituições políticas municipais. 

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Na avaliação do cientista político Emerson Cervi, coordenador do grupo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública da UFPR, essas fraquezas identificadas pelo estudo estão inter-relacionadas. 

“Estamos em um país onde o espaço público é muito separado da vida privada. As elites se apropriam privadamente dos espaços públicos e criam restrições para a participação mais efetiva. Como isso se dá ao longo do tempo, geração atrás de geração, há pouca proximidade, portanto pouco interesse do cidadão comum pela política já que ela está muito distante”, explicou. 

Sobre o desconhecimento político, Cervi chama a atenção para o fato de as novas gerações não terem conseguido superar problemas antigos. Ele destaca que temos hoje a primeira geração de adultos criados com universalização do ensino básico e, entre os mais jovens, pessoas criadas com amplo acesso à informação; ainda assim não se avançou em relação ao conhecimento político. 

De acordo com a análise do Instituto Atuação, esse desconhecimento leva a um descompasso entre as expectativas do cidadão e as possibilidades de ação do poder público. Com isso, em vez de tomarem iniciativas para resolver seus próprios problemas, os cidadãos clamam por uma solução vinda do governo. 

No relatório, ao analisar as consequências dessa falta de conhecimento político, o instituto traz à discussão a falta de confiança dos cidadãos nas instituições. 

“São essas grandes expectativas que, somadas à incapacidade governamental de realizá-las, geram os baixos níveis de confiança nas instituições. É como Thomas Sowell uma vez escreveu: ‘quando as pessoas querem o impossível, somente os candidatos mentirosos podem satisfazê-las’”, avaliam. 

De fato, os dados mostram que os curitibanos não têm percepções positivas da confiabilidade das instituições democráticas. A respeito da confiança nas instituições, 32% dos entrevistados deram nota zero à Câmara de Vereadores, índice que foi de 22,8% na prefeitura. Já o governo federal recebeu 29% de notas zero, o governo estadual 27,2% e o Poder Judiciário 15%.

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