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Cobertura fotográfica das festas é divulgada em rede social do ITTI | Reprodução/Flickr
Cobertura fotográfica das festas é divulgada em rede social do ITTI| Foto:

Festas de confraternização, “arraiás” juninos e até comemoração de aniversário de um professor foram pagas com recursos públicos de convênios executados por um instituto da Universidade Federal do Paraná (UFPR) - o Instituto Tecnológico de Transportes e Infraestrutura (ITTI). Para justificar os gastos, os gestores simulavam que as festas se tratavam de eventos acadêmicos relacionados aos projetos, que eram bancados com recursos do Departamento Nacional de Infraestrutura em Transportes (Dnit) e da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

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Uma das celebrações pagas com dinheiro público ocorreu em 16 de dezembro de 2017, na confraternização de fim de ano do ITTI. Fotos publicadas no Flickr do instituto mostram um grupo seleto de convidados na Forneria Copacabana, um renomado ponto gastronômico de Curitiba. Na prestação de contas dos convênios do ITTI, há três notas fiscais de pagamentos à Forneria, para eventos realizados justamente naquela noite. Na justificativa oficial das despesas, o ITTI afirmava que se tratavam de seminários, com apresentações e mesas de discussões, com a participação de 100 pessoas.

O coordenador do ITTI discursa, durante a festa de confraternizaçãoFlickr/ITTI

Só os gastos com a Forneria Copacabana custaram R$ 23.670 - dividido em três notas de R$ 7.890 , cada uma vinculada a um convênio diferente. Essa divisão em notas inferiores a R$ 8 mil permitiu que o buffet fosse contratado sem licitação. Mas não foi só: a festa contou com “performances artísticas”, realizadas por uma empresa de comunicação contratada a R$ 2.970. Em entrevista à Gazeta do Povo, o empresário atesta: “era uma festa de confraternização”, que teve direito a apresentação de grupo de cantores.

“A gente tem um grupo de cantores. Pediram a organização dessa intervenção e também procuramos parceiros para entregar picolés”, disse.

No ano anterior – 2016 –, o buffet da confraternização de fim de ano custou R$ 14 mil – divididos em duas notas de R$ 7 mil, cada uma custeada por um projeto diferente. A festa contou com apresentação de dança flamenca e conjunto musical. O convite distribuído pelo instituto é claro: “festa de confraternização de fim de ano”, no Restaurante Olivença.

Apresentação de dança flamenca em 2016Karina Carvalho/Flickr/ITTI

Muitas festas

Funcionários e ex-funcionários do ITTI afirmam que o instituto dá três festas anuais, todas bancadas com dinheiro dos projetos: o aniversário do fundador e coordenador do instituto, o professor Eduardo Ratton; a festa junina do ITTI; e a confraternização de fim de ano. No Flickr da entidade, todos esses eventos estão registrados em foto.

Nos últimos dois anos, Ratton comemorou seus aniversários na Associação dos Professores da UFPR, mas notas da prestação de contas indicam que o cardápio também foi pago com dinheiro dos projetos. Neste ano, o fornecedor foi a Adega Paranaense (R$ 8 mil). Em 2017, o buffet foi preparado pela RHI Alimentos (que cobrou R$ 2.487,10). Ambas as notas foram pagas por projetos do ITTI com o Dnit.

Os “Arraiás do ITTI” também ocorrerem na Associação dos Professores. No ano passado, a festa foi realizada em 28 de julho, com quitutes que custaram R$ 5.425, pagos com recursos do Dnit. O instituto justificou os gastos, dizendo que se tratava de um evento de apresentação de resultados do projeto.

Reprodução/Flickr/ITTI

“Mera especulação”, diz ITTI

O ITTI afirma que realiza, ao final de etapas semestrais ou anuais, um seminário interno dentro de cada projeto para avaliação dos resultados das atividades executadas e planejamento de novas metas. Segundo o professor Eduardo Ratton, esses gastos são razoáveis e estão previstos nos planos de trabalho de cada convênio e que há rubrica para este fim. O coordenador do instituto destaca que qualquer informação ou documento que não conste do Siconv “não tem validade de comprovação” e considerada “coincidência e mera especulação”.

Sobre o fato de os custos da contratação da Forneria Copacabana terem sido divididos em três notas, o ITTI disse que foi uma opção disponibilizada pela empresa contratada e “nos foi conveniente a utilização de recursos dos três projetos, conforme nos é permitido”.

O que diz a UFPR

Por meio de nota, a UFPR lembrou que o ITTI “tem direção própria, à qual cabe prestar contas da utilização de recursos recebidos por meio de convênios”. A prestação de contas só passa pela administração direta da universidade ao final da execução de cada convênio, o que, segundo a UFPR, ainda não ocorreu em relação aos casos mencionados.

“A Reitoria da UFPR reafirma o compromisso de zelar pelo rigoroso cumprimento das normas que regem os convênios e dar o encaminhamento necessário nos casos em que eventualmente isso não ocorra”, consta da nota oficial.

A UFPR disse ainda que vem desenvolvendo recursos de controle interno, para reforçar o acompanhamento de convênios. Como exemplo, a universidade menciona a resolução 41/17 do Conselho de Planejamento e Administração, que padroniza os valores por hora de trabalho de professores e alunos bolsistas e que estabelece limites para o ressarcimento de despesas com viagens e alimentação.

Convênios estão na mira do TCU

Eduardo Ratton é professor da UFPR há 37 anos. Contratado no regime de dedicação exclusiva, ele é pós-doutor em engenharia civil e uma autoridade nacional no que se refere a transportes. Criou o ITTI em 2009, não para promover as atividades fins da UFPR – como ensino, pesquisa e extensão –, mas para atender a demandas do Dnit – como chegou a explicitar no site do instituto.

É ele quem coordenou todos os mais de 20 convênios tocados pelo ITTI, desde então, com total ingerência sobre os projetos. Além do salário, Ratton chega a ganhar bolsa em alguns dos projetos. Só entre 2010 e 2015, o professor acumulou bolsas que, juntas, passaram dos R$ 400 mil.

Em 2015, a Gazeta do Povo publicou uma série de reportagens chamada “Universidades S/A”, em que mostrou que o Dnit usava o ITTI para driblar licitações. Pelos convênios, o instituto era contratado para fazer estudos técnicos e avaliações para obras do departamento, mas a maior parte dos recursos ia parar nos cofres de empresas privadas – que eram terceirizadas e que, de fato, executavam o objeto no contrato. Na ocasião, 13 convênios conduzidos pelo ITTI movimentavam R$ 58,9 milhões.

Após a publicação da série, o Tribunal de Contas da União (TCU) instaurou uma investigação, que até agora já determinou a devolução de mais de R$ 16 milhões, vinculados a sete convênios com o ITTI. Entre as irregularidades, o TCU apontou as subcontratações de empresas e pagamentos indevidos. Além disso, o órgão destacou que os serviços custaram, em média 15% a mais do que se tivessem sido licitados no mercado. As apurações continuam, mas sob sigilo.

Viagens internacionais

A Gazeta do Povo também mostrou que os recursos dos convênios executados pelo ITTI bancaram uma série de privilégios a um núcleo ligado ao professor Eduardo Ratton. Em menos de dois anos e meio, houve pelo menos seis viagens internacionais do instituto, em um roteiro que incluiu hotéis de luxo e restaurantes renomados. Nas viagens de que participa, Ratton costuma se fazer acompanhar de sua namorada, que nem sequer tem vínculo com o ITTI ou com a UFPR.

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