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Reginaldo Cordeiro, ex-secretário de Urbanismo de Curitiba na gestão Gustavo Fruet. | Arquivo/Gazeta do Povo
Reginaldo Cordeiro, ex-secretário de Urbanismo de Curitiba na gestão Gustavo Fruet.| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

Ex-secretário de Urbanismo de Curitiba na gestão Gustavo Fruet (PDT), Reginaldo Cordeiro disse que 80% das emissões de alvarás e autorizações para construções aprovadas pelo conselho deliberativo da pasta ocorriam à revelia da lei. A conversa em que ele faz essa afirmação foi interceptada com autorização da Justiça e a gravação faz parte de uma investigação do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), que encontrou indícios de que um grupo ligado à secretaria recebia vantagens indevidas, em troca de autorizações da prefeitura.

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O diálogo interceptado ocorreu em 21 de dezembro do ano passado. Na ligação, Cordeiro disse que brigou com “as meninas do Ippuc [Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba], porque elas são umas xiitas”. O ex-secretário relata que estava tentando “ajudar” uma pessoa, que queria liberar a construção de um “ático” irregular. A aprovação, no entanto, enfrentava a oposição de uma advogada do departamento jurídico do Ippuc, identificada como “Dra. Camila”.

“Aí a Dra. Camila falou assim: ‘Secretário, só entenda uma coisa: nem tudo que nós temos vontade de liberar aqui, nós podemos, porque o conselho [deliberativo] foi feito para casos permissíveis, não para casos proibidos’. Eu falei, então: ‘Dra. Camila, então vamos provocar o fechamento definitivo, o funeral do conselho, porque 80% do que passa aqui é contra a lei. Então, que a Câmara de vereadores faça a parte dela na legislação, que o Ippuc faça a parte dele, se atualizando, porque a legislação está desatualizada’”, contou Reginaldo Cordeiro.

Mencionado na conversa, o conselho deliberativo da Secretaria Municipal de Urbanismo foi criado na gestão Fruet para analisar a emissão de licenças urbanísticas em Curitiba. Há duas semanas, a prefeitura determinou uma auditoria nos mais de 300 alvarás expedidos por intermédio deste conselho, entre 2013 e 2016. Há indícios de que as liberações efetivadas pelo conselho tenham ocorrido de maneira irregular.

“Interferência”

No dia 1º de junho, Cordeiro foi alvo de um mandado de condução coercitiva – quando foi levado ao Gaeco para prestar depoimento – e teve apreendidos seu celular, um iPad e outros objetos pessoais. Na ocasião, oito pessoas foram presas temporariamente. No pedido das medidas cautelares, o Gaeco argumentou que havia indícios de que Cordeiro “incorre em irregularidades, interferindo em procedimentos administrativos vinculados à sua pasta, para atender interesses particulares de pessoas que a ele recorrerem”. Apesar disso, naquele momento, o Gaeco não tinha provas do envolvimento direto dele com o núcleo investigado, formado por funcionários da Secretaria de Urbanismo.

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Várias ligações interceptadas sugerem essa atuação de Cordeiro. Em uma delas, o então secretário recebe uma ligação de um homem que fala em nome de um grupo que quer “abrir um ‘pubzinho’”, mas que não conseguiu liberação da secretaria. “Esquisito. Eu já pedi para liberarem...”, responde Cordeiro, orientando o interlocutor a procurar uma diretora da Secretaria de Urbanismo.

Em outra conversa, Cordeiro fala com um empresário que entrou com um pedido de liberação para um “bulevard”, na praça “em frente ao estádio”. Segundo o dono do empreendimento, o Ippuc “deu ok”, mas a Secretaria de Urbanismo teria pedido vistas e, com isso, o processo estava havia 35 dias nas mãos de uma diretora. Cordeiro se espanta: “Nossa! Eu vou dar uma olhada nisso”, disse. Em seguida, o então secretário pede para ele enviar as informações por WhatsApp.

“Doações”

Em pelo menos duas ligações – ambas ocorridas em setembro do ano passado –, ficam sugeridas contrapartidas pelas liberações irregulares. Um empresário diz a Cordeiro que “travaram tudo lá no solar, os alvarazinhos e os troços”. O então secretário diz que não estão travados, mas faz uma ressalva: “Não se esqueça que nós temos que resolver as doações pra poder liberar as vistorias lá, hein?”, responde.

Na outra ocasião, Cordeiro fala a um homem não identificado que tirou uma semana de férias para visitar “amigos empresários”. O interlocutor responde: “Eu, você não precisa visitar”, ao que o secretário diz: “Você não quer me dar café, né? Tudo bem”. E o empresário, então, desabafa: “Café caro, cara. Puta que pariu. Pelo menos isso aí eu ‘tô ajudando o Hélio Wirbiski e o verso do santinho, do cartãozinho, tá o Fruet também”.

“A proatividade do secretário não pode ser confundida com interferência”, diz advogado

O advogado Mario Lobo Filho, que representa o ex-secretário Reginaldo Cordeiro, negou qualquer irregularidade envolvendo seu cliente. Ele disse que, enquanto secretário, Cordeiro tinha um perfil acessível e que por isso recebia ligações “desde grandes loteadores até pessoas bem simples” e que atuava no sentido de orientá-los, sem receber nenhum tipo de vantagem por isso.

“Ele realmente orientava. Explicava que pra resolver, tem que fazer tal coisa”, disse o advogado. “Pode se questionar a maneira de como ele levava o dia, essas ligações, mas isso era decorrente da atuação como secretário e essa proatividade não pode ser confundida com interferência”, completou.

Lobo Filho relativizou a gravação em que Cordeiro afirma que 80% do que era aprovado pelo conselho era irregular. O advogado diz que a fala precisa ser entendida no contexto de uma conversa privada, “mais coloquial”. “Ele quis dizer que, se as análises fossem levadas a ferro e fogo, de uma forma tão ortodoxa, não haveria necessidade de haver o conselho. O conselho era [para analisar] situações limites”, argumentou.

O advogado também afirmou que Cordeiro não pediu doações em troca da liberações de alvarás. Lobo Filho menciona que empresários chegaram a sugerir a contribuição com campanhas eleitorais, mas foram orientados por Cordeiro a fazê-lo de forma oficial e que nunca houve pedido de contrapartidas. “Algumas pessoas ligaram falando que iam apoiar seu candidato. Ele não dizia que não, porque era uma pessoa da equipe do prefeito [Fruet]. Mas não houve nenhum ‘toma lá, dá cá’”, destacou.

Lobo Filho disse que, mesmo na condição de investigado, Cordeiro está respondendo às acusações com tranquilidade e que não há elementos que o vinculem ao núcleo de pessoas acusadas de cobrar propina dentro da ecretaria. “Tanto que não há nenhuma ligação desses funcionários para ele [Cordeiro]”, aponta o advogado.

O que diz a gestão de Gustavo Fruet

“Ao longo da gestão, demos transparência aos processos e abrimos os conselhos do urbanismo para participação da sociedade organizada, justamente para evitar que as decisões estivessem centralizadas em poucas mãos. Importante lembrar que a investigação do Gaeco foi provocada por auditoria aberta em nossa gestão.”

O que diz o vereador Helio Wirbiski

Mencionado em uma das gravações, o vereador Helio Wirbiski (PPS) disse que não sabe quem foi o empresário que mencionou seu nome em conversa com Reginaldo Cordeiro, mas ressaltou que não viu possíveis irregularidades no diálogo. “Ele disse aquilo para se livrar do Reginaldo [Cordeiro]. O que ele quis dizer foi: ‘Olha, não quero te receber. Eu já estou ajudando um candidato a vereador, que tem o nome do Gustavo [Fruet] atrás [do santinho]”, avaliou.

Wirbiski disse que a menção a seu nome é um “negócio tão ridículo” e ressaltou que é “cidadão de bem, tranquilo” e que teve mais de sete mil votos. “Eu fui ajudado de diversas formas na campanha, todas legais. Eu não sei quem é esse cidadão, mas eu agradeço esse apoio”, destacou. O parlamentar afirmou ainda que tinha um “relacionamento institucional” com Cordeiro, assim como ocorria com toda a Câmara. “Todos os vereadores conversavam [com Cordeiro], mas por interesses republicanos, legítimos”, afirmou.

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