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Arcar com despesas de candidatos homens não foi a única dificuldade enfrentada pelas candidatas paranaenses em 2018, conforme mostrou a Gazeta do Povo. Na chapa Inova Paraná, composta pelo PSC, ex-partido de Ratinho Junior, e pelo PSD, atual sigla do governador, o modo como os recursos da cota feminina foram distribuídos deixou as candidatas com pouco dinheiro para as campanhas.

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Os recursos até foram distribuídos do modo como exige a legislação: dos R$ 10,1 milhões repassados pelo partido aos candidatos a deputado estadual e federal, 30% foi para mulheres. Entretanto, dos R$ 3 milhões, apenas R$ 680 mil foram em dinheiro, o restante foi registrado como doação estimada. Nessa modalidade, o doador doa bens e serviços, e não dinheiro – o que não permite que as mulheres definam como aplicar os recursos.

Em média, cada candidata da coligação recebeu R$ 70 mil em doações estimadas. Segundo o partido, a contrapartida dessa doação foi a contratação de advogados, contadores, cessão de mão de obra de funcionários do partido e despesas com marketing, publicidade e aluguel de estúdio para gravação dos programas eleitorais.

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A situação dos homens foi diferente. 90% do que receberam do partido foi em dinheiro e apenas 10% em doações estimáveis. Com isso eles tiveram mais liberdade de gastos e gastaram muito menos contratando os mesmos serviços que as mulheres.

Valores bem diferentes entre homens e mulheres

Nas despesas cotizadas, cada candidata pagou, em média, R$ 20 mil por consultoria jurídica; R$ 14,4 mil por assessoria contábil; R$ 12,8 mil por gravação em estúdio; R$ 24 mil por marketing e publicidade; R$ 8,7 mil por cessão de mão de obra e R$ 800 por materiais de campanha.

Já os homens ratearam, em média, R$ 35,7 mil por serviços de publicidade. Advogados e contadores foram contratados individualmente, por valores muito inferiores.

O candidato Guto Silva (PSD), por exemplo, atual chefe da Casa Civil, contratou a empresa Sabrina Castro Torbes Assessoria Empresarial e Contábil para cuidar da prestação de contas de sua campanha. Ao longo de toda disputa eleitoral, Guto Silva gastou R$ 701 mil em 307 despesas distintas. Pela prestação de contas dessas movimentações, pagou R$ 6 mil ao escritório de contabilidade.

Laira Gomes (PSC), candidata a estadual pela mesma coligação, gastou R$ 95 mil em sua campanha – sendo R$ 81 mil em despesas contratadas pelo PSD. A prestação de contas de sua campanha tem apenas dez notas fiscais. Ainda assim, sua parte do rateio com outras mulheres para pagar assessoria contábil foi de R$ 14,7 mil. O escritório foi o mesmo contratado por Guto Silva, que havia pago R$ 6 mil pelo serviço.

Os casos citados a título de exemplo não são pontos fora da curva. De modo geral, esse foi o comportamento das receitas e despesas das candidaturas masculinas e femininas na chapa PSC-PSD.

Durante as eleições, algumas candidatas se queixaram da dificuldade em acessar os recursos do partido. Katiane Fátima de Gouvêa (PSD), que disputou uma vaga na Câmara dos Deputados chegou a entrar na Justiça para garantir verba para sua campanha. Na ação, ela afirma que antes de se candidatar, o partido havia se mostrado disposto a colaborar financeiramente com a campanha. Após o início do pleito, entretanto, o PSD Mulher informou que repassaria apenas R$ 5 mil às candidatas. Segundo ela, após muita insistência a legenda concordou em liberar R$ 50 mil. A partir desse momento, entretanto, ela não conseguiu mais contato com nenhum representante do partido.

“Para a impetrante, o que ficou claro foi que o partido não estava preocupado em eleger mulheres, mas sim em cumprir a cota obrigatória feminina na chapa”, escreveu a advogada de Katiane na ação.

O que diz o partido

Procurada, a direção estadual do PSD indicou o advogado Gustavo Bonini Guedes para falar sobre o assunto. Ele foi responsável pelo jurídico da campanha de Ratinho Junior e do partido. Segundo ele, a executiva do partido entendeu que fomentar as candidaturas femininas não significava necessariamente repassar dinheiro as candidatas. Por isso, o PSD optou por dar estrutura às campanhas.

“Não adianta simplesmente registrar a mulher e depois não acompanhar as candidaturas. O PSD na parte jurídica e contábil tomou muito cuidado. Nenhuma mulher do partido teve conta não prestada e espero que nenhuma terá contas indeferidas.”

Ao justificar o motivo de o mesmo critério não ter sido adotado para os homens, Guedes afirmou que eles estão na vida pública há mais tempo, portanto, têm mais condições de proceder com essas contratações individualmente.

O advogado ainda criticou o pouco tempo que os partidos tiveram para se adaptar às regras de distribuição de recursos – foram cerca de quatro meses entre as decisões do TSE e a realização das eleições. Segundo ele, isso impossibilitou um trabalho mais sólido por parte das legendas em relação às campanhas femininas.

O modo como a legenda distribuiu os recursos foi criticado pelas candidatas. Para Rita Tanara da Silva, que recebeu R$ 11,8 mil em doações financeiras do partido e R$ 81,8 mil em doações estimáveis, essa forma de distribuição atrapalhou sua campanha.

“Eu poderia ter trabalhado bem mais. Sendo assim, eu pude viajar pouco, os materiais vieram no fim da campanha e não tive como fazer a campanha normal”, avalia a candidata que fez apenas 74 votos.

Ela criticou ainda os altos valores pagos a advogados e contadores no rateio das despesas do partido entre as candidatas. “Quando eu fui ver os recibos, eu me apavorei. A verba que veio para cada candidato seria 90 e poucos mil, então dessa verba, para minha conta, só veio 11 mil. O restante foi tudo para o partido. Eles deram advogado, contador, mas eu achei um absurdo o valor que foi cobrado”, afirmou.

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Entenda as regras que exigiam 30% dos recursos para mulheres

Nas eleições de 2018, dois fundos compostos por dinheiro público colocaram cerca de R$ 2,6 bilhões nas eleições. Ao tradicional Fundo Partidário, que em 2018 destinou quase R$ 900 milhões às legendas, foi acrescentado o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), o chamado Fundo Eleitoral, que abasteceu as campanhas com R$ 1,7 bilhão. Esse mecanismo foi instituído pelo Congresso Nacional como forma de garantir dinheiro para as campanhas após a proibição de doação de pessoas jurídicas.

Em 2018, por decisões do Tribunal Superior Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal ficou definido que 30% desses fundos compostos por dinheiro público deveria ser usado em campanhas de mulheres.

Ao votar sobre o tema no STF, o Ministro Edson Fachin argumentou que a distribuição de recursos deve ser feita na exata proporção das candidaturas de ambos os sexos, respeitado o patamar mínimo de 30% de candidaturas femininas.

A expectativa era de que, com a obrigação de um patamar mínimo de recursos, as mulheres não seriam inscritas como laranjas nas chapas, apenas para cumprir a exigência de 30% de mulheres entre os candidatos.

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