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Foto divulgada por Tony Garcia no Facebook. | Reprodução/
Foto divulgada por Tony Garcia no Facebook.| Foto: Reprodução/

A Operação Rádio Patrulha, que levou para a prisão o ex-governador Beto Richa (PSDB) e seus principais aliados, na terça-feira (11), começou a ser construída no momento em que o ex-deputado estadual Tony Garcia procurou o Ministério Público para contar o que sabia sobre licitações e pagamentos para o programa Patrulha do Campo, do governo estadual. O ponto de partida foi a delação – a partir daí foram reunidas outras provas, algumas trazidas pelo próprio Tony Garcia, como trocas de mensagens e áudios de conversas, e outras coletadas pelos investigadores, como documentos, movimentações bancárias e outros arquivos.

O acordo foi assinado em 10 de julho de 2018. Pelos termos, o MP concordou em se abster de oferecer denúncia contra Tony Garcia. Em outras palavras, não irá usar o que ele disse para ajuizar ação penal contra o ex-deputado. A situação é semelhante ao que foi prometido aos empresários Joesley e Wesley Batista, da JBS, no caso Lava Jato, que posteriormente foi rompido por descumprimento do acordo.

Para conseguir o benefício, Tony Garcia precisava indicar os autores dos supostos ilícitos, revelar a estrutura hierárquica e a divisão de tarefas e auxiliar tanto na prevenção de infrações relacionados e na recuperação do produto das irregularidades. Ele também se comprometeu a esclarecer tudo o que sabia sobre os fatos, falar a verdade, entregar provas e a não se envolver em atividades ilícitas – e ainda garantiu que comunicaria os investigadores caso fosse procurado por algum dos integrantes da suposta organização criminosa e a manter sigilo até que o caso se tornasse público. O acordo foi homologado pela Justiça em agosto de 2018.

Momento

Em entrevista concedida ao Estadão, Tony Garcia disse que não cometeu nenhum crime e que decidiu procurar o Ministério Público depois que soube que Nelson Leal Junior, ex-diretor do DER, preso em fevereiro de 2018 pela Lava Jato, teria falado, em depoimento de delação premiada, sobre irregularidades no Patrulha do Campo. O ex-deputado estadual afirma que havia alertado que, caso houvesse qualquer indício de ser envolvido no escândalo, abriria a boca antes.

Foi o que aconteceu. Tony Garcia procurou o Ministério Público Federal e foi orientado a buscar o Ministério Público Estadual, porque o programa Patrulha do Campo não tinha verbas federais – ou indicativo de práticas de crimes de esfera federal. Foi aí que entrou o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Segundo Tony Garcia, na mesma entrevista ao Estadão, ele pretendia apenas prestar depoimento como testemunha, colaborando com as investigações, mas foi recomendada a delação premiada porque, eventualmente, ele poderia se autoincriminar, confessando algo que o prejudicasse. Embora negue que tenha praticado crimes, Tony Garcia aparece nas gravações negociado os termos da licitação feita pelo governo do estado e auxiliado o processo para garantir os participantes – atitudes vedadas pela lei.

O acordo menciona os processos anteriores de Tony. O ex-deputado inclusive já fez delação premiada no passado, no caso da fraude do consórcio Garibaldi, se comprometendo a nunca maias praticar crimes. A situação foi citada pelo juiz Sérgio Moro, em despacho da Lava Jato, dizendo que Tony Garcia não é “pessoa digna de crédito”, mas que era o caso de considerar as informações repassadas por ele, porque havia indícios suficientes de que eram verdadeiras.

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Retrospecto

A relação do ex-deputado estava rompida com a cúpula do governo Beto Richa muito antes de ele fechar acordo de delação premiada, em 2018. Por muito tempo teve amplo acesso à cúpula do governo estadual até meados de 2015, quando começou a ruir, publicamente, a relação amistosa que mantinha com o então governador. Na época, o ex-deputado publicou no Facebook uma carta aberta a Beto Richa, fazendo críticas ao governo. De lá para cá, foram vários os momentos em que buscou atingir o antigo amigo. Foi quando se acentuaram os boatos de que Tony tinha gravado conversas entre 2010 e 2014 – quando rompeu relações, por discordância, com os principais aliados de Richa.

O rumor de que conversas gravadas pelo ex-deputado Tony Garcia poderiam ser incorporadas a uma investigação se acentuou depois que apareceu, em maio, um áudio entre Pedro Rache, executivo da construtora Contern, e o então chefe de gabinete de Beto Richa, Deonilson Roldo. O empreiteiro reconheceu que foi orientado pelo ex-deputado a gravar a conversa, em 2014, com o intuito de provar o direcionamento da licitação do pedágio da PR-323, que sagrou um consórcio encabeçado pela Odebrecht como único participante.

Figura controversa

Antonio Celso Garcia, conhecido como Tony Garcia, foi amigo de Beto Richa por muito tempo, participando de corridas de kart e também dividindo o mesmo carro em competições. A relação próxima inclusive aparece em um diálogo gravado em que o ex-governador menciona ter recebido um “tico-tico”, expressão associada ao pagamento ilegal por parte dos empresários beneficiados pelo esquema da Patrulha do Campo. Tony foi candidato a prefeito de Curitiba, em 1992, e também candidato ao Senado, com expressivas votações. Foi eleito deputado estadual em 1998.

Em 2004, chegou a ser preso pela Polícia Federal, acusado da prática de crimes financeiros no Consórcio Garibaldi, que lesou milhares de clientes – ele sempre negou que fosse o verdadeiro dono da empresa. Quando os policiais chegaram ao apartamento dele, Tony teria pulado uma sacada e se escondido em uma casinha de boneca no quintal. Contudo, ao desconfiar que podia ser encontrado, teria tentado subir em uma árvore, momento em que foi apanhado.

Ele ficou 81 dias preso e conseguiu sair da cadeia depois de um habeas corpus e concordou em pagar R$ 5 milhões em fiança. Por ter colaborado com as investigações, em processo que tinha Sergio Moro como juiz, foi condenado em 2008 a seis anos de prestação de serviços comunitários.

DESEJOS PARA O PARANÁ: Diálogo e governabilidade

Pode gravar conversa?

Por decisão pacificada do Supremo Tribunal Federal (STF), qualquer pessoa pode gravar uma conversa em que esteja presente, como interlocutor. Foi o recurso que usou Joesley Batista, especialmente contra Michel Temer (há uma discussão jurídica sobre as orientações que teria recebido do Ministério Público e da Polícia Federal, mas não sobre o direito de gravar em si) e também o filho de Cerveró, com relação ao ex-senador petista Delcidio Amaral.

Outro lado

A defesa do ex-governador Beto Richa informa que não há razão para o procedimento de terça-feira (11), especialmente em período eleitoral, segundo a advogada Antônia Lélia Neves Sanches. Ela completa que Richa está sereno e sempre esteve à disposição para esclarecimentos. De acordo com a advogada, não há vedação de prisão por conta do período eleitoral, “mas há oportunismo”. A defesa, que também representa Fernanda Richa, ingressou com pedido de habeas corpus na Justiça, que foi negado.

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