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Movimento no Hospital de Clínicas, em Curitiba, um dos que mais recebem pacientes do interior do estado | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
Movimento no Hospital de Clínicas, em Curitiba, um dos que mais recebem pacientes do interior do estado| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Nos arredores dos hospitais públicos de Curitiba, ônibus chegam e partem com pacientes de todo o Paraná que viajam para a capital em busca de atendimento médico. Dentro dos hospitais, o que mais se ouve são histórias de espera – por uma vaga na UTI, por um leito no hospital, por uma consulta com o especialista, por um exame ou uma cirurgia. As duas cenas corriqueiras para quem vive o cotidiano da saúde pública no estado são sintomas dos desafios que esperam o próximo governador: ampliar o sistema no interior e melhorar a rede já existente.

Para os dois problemas, a falta de recursos é o obstáculo mais evidente. Em constante dificuldades para cumprir o piso constitucional de 12% da Receita Corrente Líquida (RCL) para a saúde, é pouco provável que o Paraná consiga gastar muito acima da exigência legal no atual cenário de crise. No ano passado, foram desembolsados R$ 3,7 bilhões para a rubrica, o equivalente a 12,07% da RCL – não existe consenso em relação a esse porcentual, que pode ser menor.

Veja o infográfico sobre número de leitos e gasto com saúde no estado

O valor parece alto, mas quando se considera o gasto per capita, fica abaixo de R$ 1 por dia para cada morador do estado: foram R$ 328,54 gastos com a saúde do paranaense pelo governo no ano passado. Valor próximo ao dos outros vizinhos da região Sul, mas ainda abaixo do aplicado por eles. Em Santa Catarina, a administração estadual destinou R$ 338,82 por habitante para a saúde. No Rio Grande do Sul, R$ 334,72.

Sem uma melhora da economia, essa situação deve mudar muito pouco nos próximos anos e os reflexos são sentidos em todos os níveis do atendimento. “Imagine que você está em uma cidade pequena do interior com um paciente apresentando sintomas clínicos de infarto. Primeiro, você não tem laboratório, nem equipamentos, para completar o diagnóstico. Depois, precisa encaminhar esse paciente para uma cidade maior, mas não tem leito. É isso que vivem alguns médicos no estado e é desesperadora essa situação”, diz o presidente da Associação Médica do Paraná (AMP), Nerlan Carvalho.

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Ele alerta para a redução no número de leitos hospitalares disponíveis para o atendimento no SUS. Levantamento realizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) mostra que o país perdeu cerca de 34,3 mil leitos/SUS neste ano em relação a 2010. Só no Paraná, foram 1,6 mil leitos a menos, de acordo com o estudo do CFM. “A gente constata uma redução no número de leitos de internação no SUS. Isso acontece porque as verbas estão limitadas e, se os valores não cobrem as despesas, os hospitais fecham as vagas”, resume Carvalho.

A dificuldade para cobrir as despesas também é o que torna pouco provável a construção de novos hospitais de alta complexidade, públicos ou particulares, fora dos centros já estabelecidos – Curitiba, Maringá, Londrina, Foz do Iguaçu e Cascavel. Isso porque, para construir, equipar e manter hospitais de alta complexidade custa caro. Sem a garantia de uma demanda mínima que justifique e sustente esse custo, o investimento se torna praticamente inviável.

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“Essa situação [de concentração dos hospitais nos grandes centros] não vai mudar e, com a crise, a tendência é concentrar ainda mais para apropriar escala e conseguir tornar o negócio viável”, prevê o vice-presidente da Federação dos Hospitais do Paraná (Fehospar), Luís Rodrigo Milano.

Ele dá como exemplo as UTIs. Segundo Milano, as despesas e exigências para manter e implantar uma UTI tornam impossível ofertar esse tipo de tratamento fora dos grandes centros. Do ponto de vista do atendimento, a principal dificuldade está em relação à cadeia de tratamentos multidisciplinares que uma UTI exige. Do lado econômico, a questão é a garantia de demanda constante, uma vez que esse tipo de leito vazio significa ociosidade e, por consequência, um prejuízo tremendo ao hospital ou sistema de saúde que o mantenha.

Hospitais regionais

Para tentar diminuir a necessidade de transporte de pacientes para atendimento em cidades maiores, e mais distantes, a esperança dos prefeitos das cidades do interior do estado está nos hospitais regionais. Ao todo, o Paraná possui seis hospitais estaduais fora das maiores cidades do estado e da RMC. Eles estão em municípios considerados estratégicos em suas regiões – caso de Francisco Beltrão, Paranavaí, Paranaguá e Tibagi –, mas estariam sendo subutilizados.

“É preciso estruturar melhor os hospitais regionais. Muitos dos atendimentos que hoje são encaminhados para Curitiba e Londrina, por exemplo, poderiam ser feitos nesses hospitais se houvesse a estrutura adequada. Vários hospitais regionais não estão atendendo com a capacidade que poderiam. Em alguns, a quantidade de profissionais é inferior à demanda. Em outros, há falta de equipamentos para a realização de exames mais complexos”, lamenta o presidente da Associação dos Municípios do Paraná, Frank Ariel Schiavini (MDB), prefeito de Coronel Vivida, no Sudoeste do estado.

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A Associação dos Municípios do Paraná realizou sabatinas com os candidatos ao governo do estado e entregou uma carta de reivindicações a cada um dos concorrentes ao Palácio Iguaçu. Uma das solicitações da carta, segundo Schiavini, é justamente em relação à melhoria dos hospitais regionais. “Sabemos que é difícil mudar isso de uma hora para a outra, mas vamos cobrar. É fácil para o governador concentrar atendimentos em algumas cidades, enquanto os gastos com deslocamento ficam por conta da prefeitura e a população segue se arriscando e nas estradas”, diz.

Melhora da resolutividade

O Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR) chama atenção para outra melhoria necessária no sistema de saúde estadual: o aumento da resolutividade dos casos nas unidades básicas de saúde. Para tanto, defende a instituição, é necessário que as unidades tenham profissionais especializados em ginecologia, pediatria, ortopedia e clínica geral.

“A porta de entrada do paciente no sistema de saúde é a unidade básica. Mas ela tem tido um índice de resolução muito baixo. Se houvesse nesses locais a presença de profissionais dessas quatro áreas de atendimento, muitos casos seriam resolvidos logo no começo e as doenças não iriam se agravar”, afirma o secretário-geral da instituição, o médico Luiz Ernesto Pujol.

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Dados da Avaliação do Desempenho do Sistema de Saúde – realizada pela FioCruz – mostram que no ano passado 8,2% das internações hospitalares clínicas no estado pagas pelo SUS ocorreram devido a condições sensíveis à atenção primária. Esse conjunto de condições foi estabelecida pelo Ministério da Saúde em 2008 e envolve uma série de doenças que poderiam ter complicações e internamentos evitados caso tivesse ocorrido uma ação mais efetiva na atenção primária.

A polêmica do porcentual mínimo

Existe uma polêmica em relação à forma como o governo do Paraná calcula os gastos com saúde. Na conta de 2017, entraram despesas com gestão da saúde dos servidores e seus dependentes (SAS) e do Hospital da Polícia Militar. Embora o cálculo seja admitido pelo Tribunal de Contas do Paraná, essas despesas não fazem parte de gastos com a rede pública de saúde. Por isso, a inclusão delas na rubrica saúde é contestada e considera uma manobra para o estado atingir o piso constitucional.

No fim de agosto, esse foi um dos pontos que levou o Ministério Público de Contas a se manifestar pela irregularidade das contas do Paraná em 2017.

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