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| Foto: Mauro Pimentel/AFP

A crise política causada pela revelação de um esquema de candidaturas laranjas do PSL levou à queda de um ministro do governo de Jair Bolsonaro. A exoneração de Gustavo Bebianno da Secretaria-Geral da Presidência foi confirmada na tarde desta segunda-feira (18), após cinco dias de ‘fritura’ e negociações. Longe de apaziguar a crise, o desfecho do caso deixou algumas pontas soltas. Confira:

Por que raios o presidente demorou tanto para exonerá-lo?

Jair Bolsonaro levou cinco dias para anunciar oficialmente a exoneração do ministro da Secretaria Geral da Presidência desde o polêmico tuíte de Carlos Bolsonaro. A pergunta que todos se fazem é: por quê? Afinal, o presidente da República pode demitir ou contratar quem bem entender, a qualquer momento de seu governo. Não era necessário estender tanto uma crise agravada pelas declarações de que o ministro teria mentido em entrevista ao jornal O Globo.

Bolsonaro quis dar uma demonstração de poder e evitar o desgaste de afastar alguém que até outro dia era seu homem de confiança. Queria que Bebianno saísse por conta própria. Ele só não contava com a resistência do ministro e aqui vem a principal causa para a demora. Como ex-coordenador da vitoriosa campanha do Bolsonaro, Bebianno provavelmente sabe demais. E ‘vendeu’ caro a sua demissão. Isso fica claro nas entrelinhas do vídeo gravado pelo presidente e divulgado após a exoneração, que veio apenas no fim do dia e após um longo fim de semana de negociações.

O que porta-voz quis dizer sobre motivo da demissão ser de foro íntimo?

Indagado sobre a razão da saída de Bebianno do governo, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, limitou-se a dizer que “o motivo é de foro íntimo do presidente” Jair Bolsonaro. Fala sério! As razões para o ocaso do ministro já tinham se tornado públicas. O presidente disse que se sentiu traído pelo ex-braço-direito, que tinha marcado reunião com um executivo da TV Globo. Bolsonaro costuma se referir à emissora como um “inimigo do governo”.

O presidente ainda acusou Bebianno de vazar conversas privadas entre eles para a revista Veja e o site O Antagonista, o que o ministro nega. No fim, a suposta mentira do ministro ao O Globo parece ter sido a gota d’água em uma relação em que se perdeu a confiança. Por tudo isso, o “foro íntimo” alegado por Rêgo Barros virou motivo de piadas após a coletiva.

Filho de Bolsonaro vai se calar após vencer queda de braço?

A situação de Gustavo Bebianno no governo se agravou após a invertida pública que ele tomou do filho do presidente – com aval de Jair Bolsonaro, é bom que se frise. Acuado pelas denúncias de que o PSL lançou candidaturas laranja em 2018, com a suposta finalidade de desviar dinheiro público do Fundo Partidário, o ministro da Secretaria Geral negou qualquer irregularidade – ele foi presidente nacional do PSL durante as eleições. E negou ser motivo de instabilidade no governo após a repercussão do caso. Disse ter conversado “três vezes com o presidente” na véspera de Bolsonaro receber alta do hospital.

Uma declaração banal, que ganhou proporções de crise quando o vereador Carlos Bolsonaro foi ao Twitter para dizer que o ministro estava mentindo sobre ter dialogado com o presidente. Carlos ainda divulgou um áudio, igualmente privado, em que Jair Bolsonaro diz a Bebianno em tom firme que não podia falar porque ainda estava em processo de recuperação da cirurgia ao qual se submeteu. Horas depois, o próprio Jair Bolsonaro endossou a acusação do filho ao compartilhar os tuítes em sua conta na rede social.

A interferência de Carlos Bolsonaro em um assunto do governo foi alvo de críticas na Esplanada, principalmente da ala militar, e de aliados no Congresso, preocupados com a influência dos filhos do presidente nas decisões do pai. Com a vitória na queda de braço com o ministro, Carlos sai fortalecido dessa crise. Mas conseguirá se segurar daqui para frente?

Por que governo adota dois pesos e duas medidas?

Oficialmente, Gustavo Bebianno foi ‘fritado’ do governo porque respondia pela presidência do PSL na época das candidaturas laranja. É uma boa razão para demitir alguém de um projeto político que chegou ao poder empunhando a bandeira da ética na política e do combate à corrupção. Mas se é assim, por que a mesma doutrina não é aplicada o outro ministro do governo Jair Bolsonaro, igualmente arrolado no escândalo das candidaturas de fachada do partido do presidente.

O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, também é acusado de patrocinar um esquema de laranjas nas eleições de 2018 em Minas Gerais. Candidatas do estado também receberam recursos volumosos do fundo eleitoral do PSL nacional e tiveram votações pouco expressivas. Parte do gasto que elas declararam foram para empresas com ligação com o gabinete de Álvaro Antônio na Câmara, que concorria à reeleição como deputado federal.

Um agravante no caso do ministro do Turismo é o fato de que, segundo Bebianno, a distribuição de recursos aos candidatos do partido era uma incumbência dos diretórios estaduais e Álvaro Antônio era o presidente do diretório mineiro do PSL no ano passado.

Passadas duas semanas da primeira denúncia contra Álvaro Antônio, Bolsonaro não fez nenhuma manifestação pública sobre o caso do ministro do Turismo. A falta de isonomia do presidente deixa claro que a demissão de Bebianno nada teve a ver com o laranjal do PSL.

Por que Bolsonaro aceitou se humilhar no vídeo?

O agora ex-ministro da Secretaria Geral falou a aliados que sentia traído em meio ao processo de ‘fritura’ pública a que estava sendo submetido. Disse que não havia feito nada que justificasse os ataques que vinha sofrendo. E que a pessoa a quem ele havia se dedicado integralmente nos últimos dois anos – o presidente Jair Bolsonaro – estava simplesmente lhe dando as costas. Era um “tiro na nuca”, teria dito ele a interlocutores.

A entrevista ao Jornal da Record em que Bolsonaro disse que Bebianno mentiu sobre ter conversado com ele no hospital e que o ministro “teria que voltar às origens”, ou seja demitido, caso alguma irregularidade no caso dos laranjas ficasse comprovado deixou o ex-braço-direito perplexo. Tentou conversar com Bolsonaro, sem sucesso, por dois dias. Quando finalmente conseguiu, ouviu o que não queria ouvir.

Logo, o amor que sentia pelo presidente virou mágoa e, pela imprensa, o ministro mandou indiretas ao Planalto. Como sua saída era dada como certa, Bebianno queria uma saída honrosa do governo. E ela veio com o vídeo gravado por Jair Bolsonaro em que ele aparece mais dócil, fazendo elogios e afagos ao desafeto de até outro dia. O presidente agradeceu a dedicação e o compromentimento do ex-presidente do PSL durante a campanha eleitoral, deixando claro que a vitória nas urnas veio também graças ao empenho de Bebianno. Resta saber se o gesto de Bolsonaro foi suficiente para cicatrizar a ferida aberta na relação com o ex-ministro, que deixa o governo magoado e pela porta dos fundos.

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