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Rompimento de barragem em Brumadinho está na mira dos novos parlamentares e pode virar CPI | Ricardo Stuckert/Fotos Públicas
Rompimento de barragem em Brumadinho está na mira dos novos parlamentares e pode virar CPI| Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas

Em meio ao excesso de projetos apresentados pelos parlamentares do Congresso Nacional no início da legislatura, os requerimentos para criação de Comissões Parlamentares de Inquérito – as famosas CPIs – têm ganhado destaque. Já são três formalizados na Câmara e, no Senado, uma solicitação alcançou o número mínimo necessário de assinaturas para tramitar. Além dessas já em estágio avançado, há outras aventadas pelos parlamentares, abordando diversos temas.

As que tiveram o pedido formalizado na Câmara querem abordar a tragédia de Brumadinho, os empréstimos internacionais feitos pelo BNDES e os gastos do governo federal com publicidade estatal. A do Senado, apelidada de “Lava Toga”, visa “abrir a caixa-preta do Judiciário”, nas palavras de seu propositor, Alessandro Vieira (PPS-SE).

A quantidade expressiva de requerimentos para CPIs apresentadas em tão pouco tempo de mandato – o ano legislativo começou na última segunda-feira (4) – não é exclusividade dos atuais deputados federais e senadores. No quadriênio anterior (2015-2019), das 44 CPIs solicitadas, 11 foram requisitadas em fevereiro de 2015, o primeiro mês de trabalho.

São basicamente duas as principais linhas de trabalho históricas das CPIs propostas pelos parlamentares. Uma é a de atender a demandas surgidas por eventos que despertam comoção nacional – e aí se incluem desde tragédias como Brumadinho até casos de corrupção que ganham as manchetes dos jornais, como os envolvendo Petrobras e BNDES. A outra é do atendimento de pautas alinhadas ideologicamente com seus propositores. Na legislatura passada, duas solicitações foram nessa linha: a para a instalação de uma CPI de investigação sobre os homicídios da juventude negra, de Reginaldo Lopes (PT-MG), e da qualidade das armas da marca Taurus, de Major Olímpio (PSL-SP).

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Há também os pedidos de CPI que buscam o alcance de objetivos de cunho político. A deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) admitiu que uma das finalidades da série de comissões pedidas por membros de seu partido é a de “deixar o PT de fora. Não deixar eles ficarem enchendo a nossa paciência e a paciência do governo nos próximos anos”, como disse em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.

O grande número de pedidos de CPIs sugeridos pelo PSL contraria até mesmo o perfil do principal líder do partido, o presidente Jair Bolsonaro. Como deputado federal, cargo que exerceu por 28 anos, Bolsonaro não pediu a instalação de CPIs e nem era figura frequente nas comissões – recentemente, participou apenas de uma destinada a apurar as atividades da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que funcionou entre 2016 e 2017. A respeito da pouca apresentação de projetos, Bolsonaro costumava dizer que “tão importante quanto você fazer um gol, é não tomar um gol. Eu trabalho muitas vezes para que certos projetos não sejam aprovados”.

Conheça as CPIs que já foram propostas

As propostas formalizadas e ainda em fase de consolidação pretendem abordar temas históricos e problemas recentes.

Brumadinho

A tragédia que devastou a cidade de Minas Gerais e causou a morte de mais de 150 pessoas foi alvo de um dos primeiros pedidos de CPI apresentados em 2019. A deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) foi a autora da requisição. Apesar de o episódio ter despertado solidariedade e indignação da direita à esquerda, a discussão sobre a comissão não ficou imune à briga política. A notícia de que o senador Jean Paul Prates (PT-RN) teria tirado seu nome da lista de apoiadores da comissão serviu de pretexto para que opositores do PT divulgassem que o partido não queria investigar o caso. Em resposta, o PT se apressou a alardear o apoio de membros do partido – inclusive medalhões, como a presidente da legenda, Gleisi Hoffmann (PR) e o líder petista na Câmara, Paulo Pimenta (RS) – à criação de CPIs sobre o acontecido.

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Publicidade governamental

A proposta é da deputada federal Caroline de Toni (PSL-SC). Segundo a parlamentar, ao longo das últimas gestões o governo federal fez investimentos em publicidade em veículos de comunicação sem que houvesse “transparência” nos procedimentos. Durante a campanha, a transição e mesmo nas primeiras semanas de governo, Jair Bolsonaro criticou os investimentos em propaganda de empresas públicas, como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e BNDES.

BNDES

O banco pode ser tema de uma nova CPI, pela indicação do deputado federal Vanderlei Macris (PSDB-SP). O tucano busca a apuração de empréstimos feitos pelo banco a empreendimentos no exterior entre 2003 e 2015 – anos em que o Brasil foi presidido pelo PT, com Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. O BNDES foi tema de CPIs na Câmara e no Senado na última legislatura. A do Senado se encerrou em 2018, sem indiciamentos. Macris alega que uma nova CPI seria necessária porque as anteriores não apresentaram resultados.

Comissão da Verdade

A deputada Carla Zambelli (PSL-SP) é autora de um pedido para instalação de uma CPI que investigue a atuação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que funcionou entre 2011 e 2014 e teve como prioridade a apuração de violações de direitos humanos durante o regime militar (1964-1985). A deputada alega que a CNV envolveu altos gastos e não investigou o “outro lado” da história, que seriam os crimes cometidos por militantes de esquerda.

“Lava Toga”

A iniciativa do senador Alessandro Vieira (PPS-SE), formado pelo RenovaBR, é “abrir a caixa-preta do Judiciário”, o que significa investigar a atuação de juízes, promotores e ministros das cortes superiores. Além da investigação de possíveis casos de corrupção, Vieira quer abordar tópicos polêmicos como os pedidos de vista apresentados por parlamentares que fazem com que julgamentos demorem mais do que o razoável. Magistrados já estão reagindo a essa proposta.

UNE

A União Nacional dos Estudantes (UNE) é rotineiramente criticada por membros da direita por sua vinculação com legendas de esquerda, principalmente o PT e o PCdoB, e pelo apoio que deu aos governos Lula e Dilma – e também por ser beneficiária de dinheiro público. Uma investigação sobre os recursos da UNE já havia sido sugerida na legislatura anterior mas acabou abortada após acordo entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o líder do PCdoB na Câmara, Orlando Silva (SP). Agora, a ideia de CPI volta à carga – com a proposição de Filipe Barros (PSL-SC).

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Mais Médicos

Outro integrante do PSL, Coronel Chrisóstomo (RO), quer apurar o programa Mais Médicos, uma das principais bandeiras de Dilma Rousseff, que ficou marcado pela controversa contratação de profissionais cubanos. O deputado quer apurar os investimentos e a eficácia do programa. Na legislatura passada, Jerônimo Goergen (PP-RS) havia demandado uma CPI para investigar o projeto, sem sucesso.

Milícias

À esteira da morte da vereadora Marielle Franco e de acusações de envolvimento do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) com as milícias no Rio de Janeiro, o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) apresentou um requerimento para instalação de uma CPI sobre os grupos paramilitares no estado, e a relação deles com políticos locais.

Afinal, qual o poder de uma CPI?

As CPIs são o maior instrumento de investigação de que a Câmara e o Senado dispõem. Podem ser conduzidas individualmente por cada uma das casas ou em conjunto – nesse caso, são chamadas de Comissões Parlamentares Mistas de Inquérito, as CPMIs ou CPIs mistas.

Quando instaladas, as CPIs têm poder de investigação similar ao de autoridades judiciais. Podem convocar autoridades, pedir o depoimento de testemunhas, fazer diligências externas e até mesmo quebrar os sigilos bancário, fiscal e telefônico.

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Em 1826, um grupo de senadores e deputados federais se dispôs a investigar os trabalhos do Banco do Brasil. Embora o nome CPI ainda não existisse, pode se dizer que ali foi implantada a primeira CPI da história do país. As comissões tiveram sua atuação limitada durante os períodos autoritários (ditadura de Getúlio Vargas e regime de 1964 a 1985) e foram reforçadas com a Constituição de 1988. Ganharam notoriedade após apurarem escândalos de grande repercussão, como o caso PC Farias, na década de 1990, e o mensalão, durante o primeiro mandato do ex-presidente Lula.

Para que uma CPI seja instalada, é necessário o apoio de um terço dos parlamentares envolvidos. Ou seja, na Câmara são necessárias 171 assinaturas, dentre os 513 deputados. No Senado, 27, do total de 81 senadores. Já uma mista precisa de 198 assinaturas, considerando o universo formado pela somatória entre senadores e deputados federais.

Além da quantidade de assinaturas, para que um pedido de CPI prospere, é necessário que especifique que a comissão busca investigar “um fato determinado e por prazo certo”. A falta de especificação tem sido um dos fatores que derrubou algumas solicitações recentes de CPI. Como exemplo, uma apresentada pelo deputado Mário Negromonte Junior (PP-BA) em 2017, que buscava “investigar o sistema aéreo brasileiro, em especial os altos preços praticados pelas empresas aéreas no Brasil”. Na negativa à proposta, a Câmara esclareceu que o “requerimento trata o tema de forma genérica, sem a indicação de acontecimentos objetivos situados no tempo e no espaço, ou a individuação de condutas ilícitas passíveis de apuração”. Há também uma questão de espaço: na Câmara, apenas cinco CPIs podem ocorrer de forma simultânea.

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