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Serra, Aécio e Alckmin: delações da Odebrecht indicam que tucanos agiam de forma fragmentada. | Igo Estrela/PSDB
Serra, Aécio e Alckmin: delações da Odebrecht indicam que tucanos agiam de forma fragmentada.| Foto: Igo Estrela/PSDB

As delações premiadas de 78 executivos da Odebrecht revelam que o PSDB se relacionou com o “departamento de propinas” da empresa de modo fiel a seu estilo: cada um dos comandantes regionais do partido tratou dos próprios interesses. Assim, a empresa teria feito pagamentos individuais e separados aos senadores Aécio Neves e José Serra, aos governadores Geraldo Alckmin e Beto Richa e ao ministro de Relações Exteriores Aloysio Nunes Ferreira.

Trata-se de um modus operandi diferente dos adotados pelo PT – que manteria uma estrutura hierarquizada para receber propinas – e o PMDB, em que a Odebrecht tratava com líderes no Senado e na Câmara, depois encarregados de distribuir os pagamentos entre a bancada.

Há um único inquérito, entre os vários abertos por ordem do ministro Edson Fachin para investigar tucanos, que trata de um caso que reúne duas figuras de alto coturno no partido: o 4.428, contra Serra e Aloysio Nunes. Ainda assim, é uma mera formalidade técnica, já que há a menção a uma mesma empresa de capital misto do governo de São Paulo nas suspeitas contra os dois políticos, mas a decisão de Fachin não sugere que os dois tratavam juntos com a Odebrecht.

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E, cabe lembrar, Serra e Aloysio são da ala do PSDB paulista ligada ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – cujas campanhas à presidência da República, em 1993 e 1997, teriam recebido doações “não contabilizadas”, segundo o patriarca Emílio Odebrecht. Há outra, esta comandada por Geraldo Alckmin–também alvo de um pedido de investigação solicitado por Fachin.

A fratura no tucanato paulista aprofundou-se em 2016, por conta do apoio ostensivo de Alckmin à candidatura de João Doria Jr. para a prefeitura da capital. O grupo de FHC preferia Andrea Matarazzo, que acabou por se desfiliar do partido – em que estava havia 25 anos – para concorrer pelo PSD.

Tucano, ministro das Cidades também é alvo da Lava Jato

O ministro das Cidades, Bruno Araújo (PSDB-PE), foi acusado por delatores da Odebrecht de receber ao todo R$ 600 mil, em caixa 2, para suas campanhas eleitorais em 2010 e 2012. O dinheiro teria sido pago pelo Setor de Operações Estruturadas, o “departamento de propinas” da empresa.

O jornal O Estado de S. Paulo informou, na terça-feira (18), que o ministro Edson Fachin, do STF, autorizou a Polícia Federal a levantar as obras da Odebrecht ‘no local de origem’ , além de mapear as emendas parlamentares propostas pelo tucano na Câmara.

Na quarta-feira (19), o ministro disse estar “constrangido com sua presença na lista”, como “qualquer pessoa com vergonha na cara”, e que as doações não foram acompanhadas de “pedidos de contrapartida” pela Odebrecht.

As declarações, feitas ao jornal Folha de S. Paulo, foram dadas em Lisboa, onde o ministro é um dos convidados do Seminário Luso-Brasileiro de Direito, organizado pelo Instituto Brasiliense de Direito Público. O IBDP tem como sócio o ministro do STF Gilmar Mendes.

Outros tucanos na mira da Lava Jato, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o senador mineiro Antonio Anastasia, são esperados no evento.

A lista de inquéritos e petições contra tucanos inclui ainda os senadores Cassio Cunha Lima (PB), Dalírio Beber (SC) e Ricardo Ferraço (ES) e os deputados federais Jutahy Júnior (BA), João Paulo Papa (SP) e Yeda Crusius (RS).

Com a ascensão de Aécio, o grupo paulista ganhou um adversário pelo comando nacional do partido – que o mineiro atualmente preside. O pano de fundo da disputa é a candidatura tucana ao Palácio do Planalto em 2018. Aécio já buscou asfixiar o grupo de Serra na cúpula do PSDB. Agora, ambos têm um pacto de não agressão para barrar Alckmin, que não esconde a ambição pela presidência da República –e já sugeriu que, para isso, pode mudar de legenda, se preciso.

Serra, Aloysio e a Dersa

Nas delações premiadas, Pedro Novis, ex-presidente da Odebrecht, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, ex-comandante do Setor de Operações Estruturadas (o “departamento de propinas” da empresa) e outros cinco ex-executivos mencionam a formação de cartel entre dez empreiteiras -- a maioria delas investigada na Lava Jato – para fraudar a licitação do Rodoanel.

Segundo o Ministério Público Federal, houve participação da Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A, empresa de economia mista cujo principal acionista é o governo de São Paulo). “Nesse cenário, a Odebrecht sagrou-se vencedora do Lote 2 do Rodoanel. Logo em seguida, Mário Rodrigues Júnior, então Diretor de Engenharia da Dersa, teria solicitado o pagamento de R$ 1,2 milhão [para o] custeio de campanhas eleitorais”, escreve Fachin.

Eleito governador, José Serra decretou, em 2007, a renegociação de contratos das empreiteiras. “Nessa ocasião, a Dersa [era] dirigida por Paulo Vieira Sousa, conhecido como “Paulo Preto”, [que] solicitou o pagamento de 0,75% do valor recebido por cada empresa”, afirma o documento assinado pelo ministro do STF.

Os delatores dizem que isso custou R$ 2,2 milhões, pagos pela Odebrecht à offshore Circle Technical Company Inc, que pertenceria a Amaro Ramos, apontado como operador financeiro do PSDB.

Pedro Novis também diz feito “diversas contribuições” a campanhas de Serra, para “almejando futuro auxílio em obras de infraestrutura, concessões na área de transporte e saneamento em São Paulo”. Fala em pagamentos de R$ 6 milhões no exterior, a Amaro Ramos. “Conforme informa o procurador-geral da República, durante o governo de Serra a Odebrecht sagrou-se vencedora em diversos processos licitatórios”, anota Fachin.

Por fim, em 2009, após Serra ter “solicitado diretamente” apoio da Odebrecht, Pedro Novis teria condicionado o dinheiro ao pagamento de “valores devidos em decorrência de obras executadas pelo grupo em São Paulo”. Sérgio Guerra (morto em 2014), então presidente nacional do PSDB, teria pedido que 15% do montante ficasse com o PSDB, com a alegada concordância de Serra. Os pagamentos teriam sido tratados com pessoas indicadas pelo senador tucano.

O mesmo inquérito que irá apurar as suspeitas contra Serra tratará também de pedido de doação eleitoral por Aloysio Nunes, então chefe da Casa Civil do governo de São Paulo. “Na oportunidade, a Odebrecht estava enfrentando dificuldades em relação à Dersa, ocasião em que o ora ministro solicitou auxílio no custeio de sua campanha ao Senado, comprometendo-se, em contrapartida, a auxiliar na negociação dessas questões”. Os delatores afirmam terem pago R$ 500 mil a Aloysio, via “departamento de propinas”.

Alckmin e Richa

A petição 6.639, enviada por Edson Fachin ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), pede que sejam investigados pagamentos de R$ 2 milhões, em 2010, e R$ 8,3 milhões, em 2014, feitos pela Odebrecht a campanhas do governador Geraldo Alckmin. Os repasses, mencionados por Benedicto Júnior e outros dois delatores, teriam sido feitos via Setor de Operações Estruturadas. Parte dos valores teria sido entregue diretamente ao cunhado de Alckmin, Adhemar César Ribeiro -- ele é irmão da primeira-dama Lu Alckmin.

Benedicto Júnior também relatou pagamentos de R$ 2,5 milhões, via caixa dois, à campanha de reeleição de Beto Richa em 2014. Em troca, a empresa abateria esse montante do projeto de duplicação da PR-323. Não há registro de doações da Odebrecht na prestação de contas oficial entregue pela campanha do governador paranaense à Justiça Eleitoral.

Richa delegou o papel de dar explicações a Juraci Barbosa Sobrinho, tesoureiro da campanha de 2014 e atualmente presidente da Agência de Fomento do Paraná. Ele classificou as denúncias de “ilações” e a afirmou que as investigações provarão que elas são “falsas”.

Aécio, o “campeão de inquéritos”

Aécio Neves, presidente nacional do PSDB e aspirante a candidato tucano à presidência em 2018, é alvo de cinco dos inquéritos abertos por ordem Edson Fachin. Isso faz dele o político com mandato campeão de investigações abertas em consequência das delações premiadas de 78 executivos da Odebrecht, posto que divide com o também senador – e ex-ministro de Michel Temer -- Romero Jucá (PMDB-RR).

As suspeitas mais graves contra Aécio estão em dois inquéritos, que tratam respectivamente de fraude em licitação de obras em Minas Gerais, à época em que o político era governador, e da possível atuação dele -- mediante pagamentos em dinheiro -- em favor de empreiteiras na construção de hidrelétricas no Rio Madeira.

Nos três restantes, o tucano e outros políticos são suspeitos de pedir, como “vantagens indevidas”, doações a campanhas eleitorais, inclusive a de Aécio para a presidência da República em 2014. Também são mencionadas as campanhas do também senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), ex-vice-governador e homem forte nos mandatos de Aécio em Minas Gerais, e do ex-ministro e ex-deputado Pimenta da Veiga (PSDB), candidato derrotado ao governo mineiro em 2014.

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