• Carregando...
 | Nelson Almeida/AFP
| Foto: Nelson Almeida/AFP

Diferentemente do que vem repetindo, o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL-RJ) continua usando dinheiro da Câmara dos Deputados para pagar o salário de uma funcionária de gabinete que vende açaí na praia onde o deputado tem uma casa de veraneio.

A Folha de S. Paulo visitou o local nesta segunda-feira (13) e comprou com Walderice Santos da Conceição, 49 anos, um açaí e um cupuaçu, em horário de expediente da Câmara dos Deputados. Ela afirmou que trabalha na loja, que leva seu nome, Açaí da Wal, todas as tardes, na pequena Vila Histórica de Mambucaba, a 50 km de Angra dos Reis.

Leia também: Bolsonaro tem encontro ‘secreto’ com empresários e avalia dono da Riachuelo como ministro

Minutos depois de a reportagem se identificar e deixar a cidade, ela ligou para a Sucursal da Folha em Brasília afirmando que irá pedir demissão, o que acabou oficializado por Bolsonaro duas horas após a publicação desta reportagem. O nome de Wal foi citado no debate entre os presidenciáveis realizado pela Band na última quinta-feira (9). O candidato do PSOL, Guilherme Boulos, perguntou a Bolsonaro “quem é Wal?”.

Antes de se identificar como repórteres, a Folha conversou com Walderice na pequena loja de açaí onde ela trabalha. Ela chegou a comentar o debate da TV Band. “Ele [Boulos] disse que o Jair tinha uma funcionária fantasma.” Em resposta à pergunta da Folha sobre quem era, Walderice afirmou: “Sou eu.”

Em janeiro, a Folha revelou a existência da funcionária fantasma. De acordo com pessoas da cidade, Wal, como é conhecida, também presta serviços particulares na casa de Bolsonaro, mas tem como principal atividade o comércio de açaí. Ela figura desde 2003 como um dos 14 funcionários do gabinete parlamentar de Bolsonaro, em Brasília, recebendo atualmente salário bruto de R$ 1.351,46. Segundo moradores da região, o marido dela, Edenilson, presta serviços de caseiro ao deputado.

As versões do “Mito”

Depois da reportagem, o parlamentar passou a dar diferentes versões sobre a assessora. Primeiro, disse que buscou o endereço do local e viu que a “casinha” de açaí era da irmã de Walderice. Em outra tentativa de explicar, disse que sua secretária de gabinete estava em período de férias na ocasião em que a Folha visitou o local na primeira vez. Essa foi a versão dada, por exemplo, na resposta a Boulos no debate da Band.

Leia também: Se for derrotado na urnas, PT fala em pedir impeachment de novo presidente

“A sra. Wal, sra. Walderice, é uma funcionária minha em Angra dos Reis. Quando a Folha de S.Paulo foi lá [em janeiro] e não achou, botou manchete no dia seguinte de que ela estaria lá fantasma. Só que, em boletim administrativo da Câmara dos Deputados de dezembro, ela estava de férias”, disse Bolsonaro no debate.

Na tarde desta segunda-feira (13), a reportagem esteve na loja duas vezes. Na primeira, sem se identificar como jornalista, momento em que o açaí e o cupuaçu foram comprados. Não há nenhum registro de férias de Walderice no momento.

“Sr. Jair é meu amigo”

Uma hora e meia depois, a Folha voltou e se identificou. A funcionária disse que não tinha nada a declarar sobre o assunto. Nessa ocasião, Walderice deu a entender que não queria prejudicar o presidenciável. “Eu não vejo o sr. Jair como vocês veem. O sr. Jair pra mim é uma outra pessoa. O sr. Jair é uma boa, o sr. Jair é meu amigo, o sr. Jair não é racista, a minha família é toda negra. O sr. Jair não é homofóbico.”

Questionado se Jair Bolsonaro deveria pagá-la com dinheiro próprio já que ela não exerce atividade parlamentar, de gabinete, mas trabalha na loja particular de açaí, Walderice disse apenas: “Mas aí é uma coisa que cabe a ele responder”.

Leia também: Presidenciável mais rico declara quase meio bilhão de reais em patrimônio

A Folha insistiu em outra pergunta, que foi repetida por duas vezes: “A sra. recebe realmente esse dinheiro ou é seu marido que recebe?” Após um silêncio, ela afirmou: “Já falei, só comento sobre isso quando ele [Bolsonaro] falar que eu posso comentar.”

Segundo as regras da Câmara, a pessoa que ocupe o cargo de secretário parlamentar, o caso de Walderice, precisa trabalhar exclusivamente para o gabinete no mínimo oito horas por dia. A reportagem entrevistou vários moradores nas duas ocasiões que esteve na cidade, que tem pouco mais de mil habitantes. A suposta atividade parlamentar da funcionária de Bolsonaro era desconhecida.

“Crime dela foi dar água a cachorros”, diz Bolsonaro

Duas horas após a publicação dessa reportagem, Jair Bolsonaro informou que Walderice Santos da Conceição pediu demissão e ele aceitou. O candidato afirmou que o “crime dela foi dar água para os cachorros”.

“Tem dois cachorros lá e pra não morrer de vez em quando ela dá água pros cachorros lá, só isso. O crime dela é esse aí, é dar água pro cachorro”, disse.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]